Curador fala sobre o futuro do MAM, que deve reabrir em maio após reforma
“Não podemos olhar só para o que está na crista da onda”, diz Cauê Alves

Desde agosto de 2024, o Museu de Arte Moderna (MAM) está fechado, devido a uma reforma na Marquise do Ibirapuera, onde está localizado. Após atrasos, a previsão é de que ele reabra ao público em maio de 2026. Mas engana-se quem pensa que o MAM parou. “Abrimos mais mostras do que se estivéssemos em nossa sede”, garante Cauê Alves, 48.
Em julho passado, Alves, professor da PUC- SP, completou cinco anos como curador-chefe da instituição. Sob sua tutela, de 2024 para cá, a instituição abriu mostras no Museu de Arte Contemporânea (MAC), no Centro Cultural Fiesp, no Sesc Vila Mariana e na Cinemateca Brasileira. Atualmente, também ocupa o Instituto Tomie Ohtake, com a coletiva Aqui-lá (até 2 de novembro) e a instalação Limiar, de Tarik Kiswanson (até 25 de janeiro).
No próximo dia 4, na Biblioteca Mário de Andrade, abre Do Livro ao Museu, coletiva que resgata a relação fundadora entre as instituições e sua contribuição para a consolidação do modernismo no Brasil. Na entrevista a seguir, Alves, que em 2015 participou da equipe curatorial do pavilhão brasileiro na Bienal de Veneza, fala sobre o momento atual do MAM, os planos para o futuro e suas opiniões sobre a arte brasileira.
“Quando o Brasil está em um
bom momento econômico e com
a democracia consolidada, reconhecida como forte, a arte
brasileira também se beneficia”
Você ficou surpreso com o apoio que o MAM recebeu de outras instituições culturais neste período?
De fato, surpreendeu o modo como a gente foi bem recebido pelas instituições, porque pensamos que poderia haver alguma competição, mas percebemos o contrário, que o MAM é um patrimônio da cidade.
A reforma vai impactar de alguma maneira o espaço do MAM?
Vai impactar positivamente. O MAM vai voltar com uma cara nova. Estamos aproveitando este momento para fazer uma série de aperfeiçoamentos e melhorias: um novo projeto de iluminação, novos aparelhos de ar-condicionado, além de reformas no espaço educativo, na biblioteca e na recepção.
Como o fechamento afetou os planos do museu para 2024, 2025 e 2026?
Não cancelamos nenhuma mostra, mas tivemos que adiar algumas muito importantes. Acabamos de ter o nosso plano plurianual aprovado pelo Ministério da Cultura. Então, estamos fechando os últimos detalhes da programação dos próximos quatro anos. Vamos conseguir conciliar os compromissos que o museu tinha com a programação pensada para 2026. Tivemos muitos custos por causa do fechamento, alguns patrocinadores ficaram aflitos com essa demora no retorno, mas o MAM conseguiu ampliar seu campo de atuação na cidade.
Logo, logo o museu completa oitenta anos, em 2028. Você comentou que os próximos quatro anos já estão traçados. Qual caminho o MAM pretende seguir?
É um jovem de oitenta anos. Temos bastante arte contemporânea no acervo também. Então, a programação tem que ser coerente com a coleção e com a história. Os Panoramas de Arte Brasileira são parte disso. Muitos artistas que participaram hoje estão nas bienais e em grandes coleções. Temos essa missão dupla de ser um museu que projeta o futuro para o campo da arte contemporânea, lançando novos talentos, mas também fazendo com que parte do século XX seja assentada e revista, com um olhar contemporâneo. Não é mostrar de novo o que todo mundo já conhece, é buscar modos como esses trabalhos modernos ainda não haviam sido compreendidos. Acho que, ao chegar aos oitenta anos, temos que consolidar tudo aquilo que a gente já fez para poder, aí sim, fazer coisas novas.
Do que gosta na nova geração?
Tem uma série de artistas que às vezes nem está em galerias, não está participando do circuito comercial, mas tem um valor muito grande e é importante para o meio. A gente não pode ficar olhando apenas para o que está na crista da onda. Me interessa pensar naquilo que ainda não foi descoberto pela moda e também no que já foi descartado sem que sua devida contribuição tenha sido assimilada.
Há gerações de artistas injustamente esquecidas?
Sem dúvida. Não cabe todo mundo nos espaços. De quando em quando alguns artistas são lembrados e, para que isso aconteça, outros são esquecidos, nem que seja temporariamente. É próprio do nosso mundo capitalista essa ideia do descarte. O trabalho do museu não é fazer a novidade surgir de modo inconsequente e efêmero. É refletir, estudar, pesquisar, conservar e ajudar na formação das novas gerações. Isso se faz a partir do campo da história.

Estão planejando mais programações em outros locais da cidade?
Estamos. Vai acontecer logo no início do ano que vem, com duas exposições. Mesmo depois de reabrir a sede, a ideia é continuar realizando exposições em outros espaços culturais da cidade e também do interior, com parceiros novos e históricos. É importante pensar São Paulo para além da capital. Como nessa nova exposição na Mário de Andrade, vamos promover diálogos do acervo do museu com outros acervos.
Há novidades no acervo do MAM?
A coleção do MAM tinha mais ou menos quarenta vídeos. Esse número quase triplicou, com uma doação de 75 trabalhos da coleção da Vera e do Miguel Chaia. Isso mostra o modo como a nossa coleção tem conseguido se atualizar, com uma abrangência de suportes: vídeo, performance, instalação, pintura, gravura, fotografia, escultura… Temos feito uma revisão profunda da coleção não só no sentido de atualização, mas também de pesquisa, por exemplo, falando como conservar os vídeos, como pensar em suportes que os museus tradicionais nem sonham em colecionar.
Como você avalia a posição da arte brasileira internacionalmente?
Há um interesse internacional grande na arte brasileira. Isso se deve, também, ao momento que o Brasil está vivendo. Quando o Brasil está em um bom momento econômico e com a democracia consolidada, reconhecida como forte, como um lugar seguro para investir, a arte brasileira também se beneficia. A gente já viu nomes como Hélio Oiticica, Lygia Clark e Mira Schendel em lugares de grande destaque internacional e agora isso tem acontecido com uma geração de artistas mais jovens, com menos de 40 anos. É muito positivo.
Publicado em VEJA São Paulo de 26 de setembro de 2025, edição nº 2963.