Mestres longevos: os nomes da fotografia com mais de 60 anos
Na fotografia, entre os expoentes reconhecidos pela experiência estão quase centenários, caso de German Lorca, e setentões ativos como Sebastião Salgado

Paulistano de 97 anos, German Lorca é um dos grandes nomes da fotografia brasileira, com obras nos acervos do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), do Masp e da Pinacoteca. Mas o sucesso que alcançou em setenta anos de carreira não o fez parar: ele se mantém na ativa. Em seu novo estúdio, instalado próximo ao Shopping Ibirapuera, ele examina, uma vez por semana, sua produção. “Quero fazer uma exposição sobre as construções feitas com pedras em Portugal e Espanha. Estou também com outra em mente, sobre Nova York”, elenca Lorca, que tem ao seu lado no empreendimento os filhos José Henrique, de 65 anos, e Frederico, de 68 anos. “Meu pai não para, mesmo em casa, está sempre fazendo alguma coisa”, conta José Henrique, que acompanha Lorca na entrevista e o ajuda a lembrar de algumas situações (nem a mais afiada das mentes acaba escapando dos lapsos de memória).

A casa térrea onde o fotógrafo mora sozinho tem uma biblioteca com cerca de 200 títulos de arte e fotografia, e folheá-los é um de seus passatempos. Sua rotina é ainda preenchida com aberturas de mostras (no ano passado, sua produção foi tema de uma retrospectiva de peso no Itaú Cultural). Com seu bom humor característico, faz uma única reclamação sobre um episódio recente. “Me proibiram neste ano de dirigirem estrada e avenidas. É perigoso, mas também acham que estou com algum problema. Minha carteira de motorista ainda está valendo e em ruas calmas, pelo bairro, eu posso”, protesta, de bengala em mãos.

Com 75 anos, 22 a menos que Lorca, o mineiro Sebastião Salgado também mantém um ritmo acelerado. Da mesma forma que o colega de profissão, é dono de uma trajetória exitosa: participou da lendária agência de fotografia Magnum e recebeu os prêmios W. Eugene Smith de Fotografia Humanitária e World Press Photo, entre outros. E o que tem feito ultimamente? No último dia 17, lançou um livro e abriu uma exposição no Sesc Avenida Paulista com imagens que fez nos anos 80 na mina de ouro de Serra Pelada, no Estado do Pará. Um dia antes, acertava com parte da equipe da instituição o áudio da apresentação de um novo projeto: uma mostra sobre a Amazônia, com previsão para acontecer em 2021, no Sesc 24 de Maio. “Minha vida é a fotografia, é minha maneira de viver”, afirma Salgado. “Ainda mais que minha mulher (a arquiteta Lélia Wanick Salgado, de 72 anos) é quem desenha meus livros e faz a curadoria das minhas exposições. Vivemos isso 24 horas por dia”, afirma o fotógrafo, com os olhos brilhantes, tocados por um entusiasmo que impressiona.

Lorca e Salgado não estão sozinhos na turma. Algumas características dessa área favorecem a longevidade. Ainda que as máquinas e programas de tratamento de imagens tenham evoluído muito no último século, a tecnologia não fala mais alto que o viés artístico. “Para a gente, o que menos importa é o equipamento. O que vale é o que você viu, sentiu e viveu. O frescor do olhar da molecada é maravilhoso, mas, na hora do aperto, a maturidade faz diferença”, explica o curador paulistano Fernando Netto, 59, que lista ainda outros nomes longevos, como Claudia Andujar, Boris Kossoy, Ana Vitória Mussi, Miguel Rio Branco, Pedro Martinelli, Evandro Teixeira e Maureen Bisilliat. Mais um motivo para o reconhecimento deles é a persistência. “Muita gente abdica da carreira, desiste. Outros fotógrafos não, atualizam-se e vão ficando melhores. Essa geração é o ouro da fotografia brasileira.”

Publicado em VEJA SÃO PAULO de 31 de julho de 2019, edição nº 2645.