Fotógrafa Claudia Andujar expõe suas imagens de índios ianomâmis
A mostra começa neste sábado (15) no Instituto Moreira Salles (IMS)
Em 17 de dezembro de 1971, a fotógrafa Claudia Andujar, hoje com 87 anos, fez sua primeira viagem ao território onde vive a etnia ianomâmi, em Roraima. A ida inicial à área, que tem hoje cerca de 96 650 quilômetros quadrados, se transformaria em rotina. Resultado da parceria de quase cinquenta anos, a produção da artista é revisitada a partir deste sábado, 15, no Instituto Moreira Salles. São mais de 300 fotografias de diferentes grupos. “O fato de estarem afastados do mundo me atraiu. No começo, deixei a câmera um pouco de lado, senti que era preciso conhecer a personalidade deles”, relembra.
Naquela época, conheceu o missionário católico Carlo Zacquini, que fez a ponte com as aldeias. “Não imaginei que a veria de volta tantas vezes, mas ela percebeu que precisava de mais tempo, porque havia dificuldades logísticas e técnicas. As malocas tinham pouca luz interna, era preciso bolar esquemas para trabalhar lá”, detalha Zacquini. Essas artimanhas, que incluem o uso de filme infravermelho, podem ser mais bem apreciadas na primeira parte da mostra, que cobre o período de 1971 a 1977. “Aos poucos, ela fica mais próxima deles e cria novas formas para representá-los”, aponta o curador Thyago Nogueira.
Na segunda parte da exposição, o tom político se torna mais forte e ela percebe que as fotografias podem ajudar na sobrevivência da etnia frente ao contato com os brancos e a disseminação de doenças. “De repente, chegaram os operários para construir a rodovia Perimetral Norte e os indígenas ficaram doentes”, conta Zacquini. À morte de milhares de pessoas, Claudia respondeu com uma iniciativa. Junto a dois médicos, com financiamento de uma organização dinamarquesa, foi até as diversas aldeias fazer um levantamento sobre a situação da saúde dos grupos.
Nascia aí Marcados (1981-1983), série em que integrantes de diferentes comunidades, como boas novas e jarani, aparecem com placas de identificação numérica no corpo. Esse modo rudimentar de diferenciá-los levou a fotógrafa para um território ambíguo. Na infância, ela havia visto o pai e parte de sua família judia ser marcados com uma estrela. Naquele momento, porém, diante da inexistência de nomes fixos na cultura ianomâmi, ela sentiu que era preciso deixar o passado de lado e utilizar aquele recurso da marcação com a placa preta e números brancos, que ajudou a reconhecer direitos de uma mãe e seu filho, por exemplo. Mais tarde, esse também seria um instrumento importante para demarcação do território da etnia, ocorrida em 1992.
Com o avançar da idade, Claudia rareou as visitas. A última foi em dezembro de 2017. “Fui até uma aldeia a que eu nunca tinha ido, onde eles têm pouco contato com o mundo dos brancos”, diz. Essa eterna curiosidade é o que torna ainda mais especial sua produção. Na exposição do IMS, as fotos suspensas por fios de aço traduzem um pouco dessa sensação. É preciso percorrer o espaço, tal qual uma floresta, para dar conta da complexidade desse povo. É também assim que se chega mais perto da fotógrafa. “Eu entendi quem eu sou através da fotografia”, diz ela. “A partir daí, meu objetivo era compreender o pensamento deles, ver como eles enxergam a vida.”
> Instituto Moreira Salles. Avenida Paulista, 2424, ☎ 2842-9120. Terça a domingo, 10h às 20h; quinta até 22h. Grátis. Até 7 de abril. A partir deste sábado (15).