Marca registrada
Grifes investem em ligas de metal e em lapidações exclusivas para hipnotizar a clientela e garantir lugar privilegiado nas caixas de joias
Em março, a Tiffany & Co. anunciou uma estratégia inédita para celebrar seus175 anos de existência. No lugar de peças assinadas por um designer — a história é traçada por nomes como Jean Schlum-berger, Elsa Peretti, Paloma Picasso e pelo arquiteto Frank Gehry —, levou às vitrines a coleção1837, nome que faz referência ao ano de abertura da primeira loja, em Nova York. Braceletes, colares, brincos e pingentes são, por assim dizer, anônimos. Não ostentam nenhum diamante amarelo, a gema que deu fama a essa marca americana, nem esmeralda, espinélio ou outra pedra preciosa. Não há sequer sinal do selo k, de quilates, a medida do peso de uma pedra ou da pureza do ouro (24 k indica o ouro puro; 18 k caracteriza um produto que leva 75% do metal na composição com cobre e prata). Seu apelo é de outro gênero. Ele vem de uma liga de metal alardeada como inédita, com cor de ouro rosa, batizada (e patenteada) de Rubedo, que significa “vermelho”em latim. “Combinamos o brilho da prata com o calor do ouro”, diz Luciano Rodembusch, vice-presidente da marca para a América Latina.
Foram dois anos de laboratório de química e metalurgia para chegar à mistura ideal. O jornal The New York Times divulgou o resultado de um raio X fluorescente do Rubedo, conduzido pela Empiregoldbuyers.com, refinaria de Manhattan: 31% de ouro, quase 55% de cobre, um tanto de prata e um tantinho de zinco (ou ouro de 7,5 k). Na loja do Shopping Iguatemi, em São Paulo, assim como na da Quinta Avenida, as consumidoras se guiaram pelo quase irresistível apelo de metal único, empregado numa coleção de vinte itens de edição limitada, com preços variando entre 850 reais e 35 000 reais. O senso de exclusividade é reforçado pela gravação em baixo-relevo de uma sequência de palavras mágicas: NY, T&Co, 1837 e, por fim, manuscrita, Tiffany, um decalque da assinatura do fundador, Charles Lewis Tiffany. Há um século, a joalheria já havia experimentado uma estratégia semelhante com o Tiffany Setting, no qual o brilhante é incrustado nas garras de platina de forma que pareça estar num pedestal. A ideia deu tão certo que dita até hoje o padrão para o anel de noivado. Em 1999, foi a vez de patentear o Lucida, o diamante quadrado. “A marca registrada de uma joalheria pesa cada vez mais na decisão de compra”, afirma Maria Regina Machado Soares, autora do livro A Joia do Rio. É um jeito de ter algo único sem ficar na dependência, por exemplo, de que a natureza produza o tal diamante amarelo de 128,54 k que celebrizou a joalheria americana.
Na H.Stern, o chamado “ouro nobre” — liga com tom entre o ouro amarelo e o branco conquistada depois de 180 combinações — responde por 30% das peças em produção. A joalheria brasileira também tem uma lapidação própria: Stern Star, diamante cujo corte em forma de estrela consumiu três anos de pesquisa. A primeira leva tinha 35 peças, vendidas em 48 horas, nas lojas de São Paulo e do Rio de Janeiro. Grifar uma peça não é só um jeito de dar status extra a ela. Implica também encontrar uma técnica própria de tirar o melhor da pedra. Ao fazer as flores do monograma das bolsas Louis Vuitton reluzir na forma dos diamantes Flower Cut (de pétalas arredondadas) e Star Cut (pontiagudas), Lorenz Bäumer criou um corte mais brilhante, literalmente. Eles têm 65 e 77 facetas, respectivamente (o brilhante possui 56), lapidadas por quinze artesãos de Tel-Aviv. É a mesma inteligência aplicada no Clou d’H, técnica da Hermès que renova a clássica cabochon, produzindo nuances no que é arredondado, como se fosse um casco de tartaruga. O formato realça o brilho profundo da pedra.
Criar uma marca registrada pode dar tão certo a ponto de, enfim, ela virar uma espécie de monograma da joalheria. Em 1933, a Van Cleef & Arpels lançou o Mystery Setting, um jeito de incrustar as pedras sem que a estrutura de metal fique visível — as emendas simplesmente desaparecem —, dando a ilusão de que elas flutuam. Um broche pode consumir até 300 horas de trabalho deum único artesão, e, por isso, a empresa francesa reserva a técnica para as coleções de peças únicas. Em busca de melhorar o que já é reconhecido (e copiado) a distância, a Van Cleef agora usa pedras no formato marquesa para unificar a superfície e deixá-la ainda mais reluzente. Diz a lenda que a lapidação, também conhecida como navete, reproduz o formato do sorriso da Madame de Pompadour — teria sido uma encomenda do rei Luís XV para que a marca registrada de sua amante reluzisse sempre em seu dedo.