Já fui santa
O fotógrafo Andrea Di Martino peregrina pela Itália em busca de igrejas dessacralizadas e ressucitadas em forma de teatro, hotel, museu e até oficina mecânica
Em frente ao altar está uma mesa de pingue-pongue e, no lugar dos bancos dos fiéis, cadeiras de plástico típicas de bares de periferia. Os nichos antes ocupados por Nossa Senhora e Santa Luzia servem de apoio para troféus do Polisportiva Libertas, de Montescaglioso, uma cidade de 10 000 habitantes no sul da Itália. A sede do time de futebol da terceira divisão fica no centro — na Igreja de Santa Luzia, construída na primeira metade do século XVII, que deixou de ser sagrada em 1971 para abrigar o clube. Ninguém contabiliza, mas como esta existe outra centena de locais de culto católico na Itália cuja função foi modificada. Vendidas por preços na casa de 1 milhão de euros — dependendo do estado de conservação —, as igrejas se transformaram em lojas de decoração e hotéis. Outras ganharam destino desconcertante, caso da oficina mecânica da Lombardia. Foram essas mudanças que inspiraram o fotógrafo Andrea Di Martino, de Milão, a peregrinar pela Itália nos últimos quatro anos. Batizada de The Mass Is Ended (A Missa Acabou), a série das igrejas dessacralizadas deve terminar no fim do primeiro semestre e virar um livro em 2014. “Moradores apaixonados por história me ajudaram a levantar o passado dos lugares”, diz. Martino sabe que as imagens podem gerar conclusões sobre o declínio da fé católica. Ele está, no entanto, interessado na arquitetura. O mercado imobiliário, idem: com projetos interessantes, boa localização e um pé-direito bem alto, essas igrejas são ótimo negócio. O destino de um lugar, afinal, não dura para sempre. Nem mesmo o daqueles que nos preparam para a vida eterna.