Uma história de amor à arte: a trajetória de Monique Gardenberg
A produtora, cineasta e diretora teatral conta a sua história e fala de Zé Nogueira (1955-2024), curador do Free Jazz e do C6 Fest que faleceu em abril
O denominador comum de todos os anos de Free Jazz, Tim Festival, BMW Jazz Festival e, agora, o C6 Fest é Monique Gardenberg, 65.
A produtora cultural, diretora teatral e cineasta baiana fundou a Dueto Produções em 1982, ao lado de sua irmã, Sylvia (1960-1998), e desde então esteve envolvida em projetos dos mais variados que movimentaram a cultura no Brasil.
Nascida em Salvador, se fixou no Rio de Janeiro na juventude para cursar economia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Como diretora cultural do centro acadêmico, passou a agitar a cena musical.
“Era um título pomposo e curioso, pensando em retrospectiva. Mas tudo que eu fazia era me perder pelo Baixo Leblon com colegas, atrás de artistas. Foi assim que conseguimos Gonzaguinha, Moraes Moreira, Fagner, Sérgio Ricardo, e tantos outros, para tocar no Teatro de Arena da faculdade”, conta.
Aos poucos, as gravadoras foram tomando conhecimento do trabalho de Gardenberg e começaram a vir os convites profissionais. O início nos bastidores da música já foi grandioso: virou produtora da turnê do disco Clube da Esquina 2 (1978), de Milton Nascimento. Depois, passou a trabalhar com Djavan.
“O estouro do disco Luz (1982) já não permitia que eu cuidasse da carreira dele de forma caseira. Era preciso abrir uma empresa, com nota fiscal e sede. Foi aí que liguei para Sylvinha, para saber se ela topava abrir uma produtora comigo. Ela tinha menos paciência para o trabalho de escritório, e eu tinha fobia de multidão, então nos complementamos muito bem”, diz.
À época, as duas empresárias namoravam membros da banda de Djavan — Monique se relacionava com o saxofonista, Zé Nogueira (1955-2024), “amigo e parceiro de uma vida inteira”. Naquele momento, acompanhando shows em festivais de jazz ao redor do mundo, nasceu a ideia do Free Jazz.
“Sempre digo que criamos (o festival) para nos exibir para eles, impressioná-los… Mas o fato é que voltamos todos encantados com Wynton Marsalis, Bobby McFerrin, David Sanborn, Pat Metheny, entre outros talentos que despontavam”, recorda.
A partir dos anos 90, Monique traçou uma carreira relevante como diretora de peças e filmes. “Marina Lima, minha amiga-irmã, foi quem achou que eu poderia dirigir. Fiz o show O Chamado, e gostava de sentir, na mesa de luz, como cada canção tinha um efeito diferente, a depender do meu estado emocional. Isso me levou a começar a escrever. Larguei tudo e fui estudar nos Estados Unidos, em 1989.”
Desde então, lançou filmes como Jenipapo (1995), Benjamin (2003), Paraíso Perdido (2018) e Ó Paí, Ó (2007), cuja sequência foi lançada no ano passado, com produção da Dueto e direção de Viviane Ferreira.
No teatro, encenou espetáculos como Os Sete Afluentes do Rio Ota, em 2002 e 2019. E tem um próximo projeto nos planos. “Recebi o convite de Marcelo Drummond para assumir a direção de Senhora dos Afogados, de Nelson Rodrigues. Vou me entregar a essa tragédia delirante”, conta.
Com o falecimento de Zé Nogueira no último dia 26 de abril, o festival deste ano acontece em meio a uma perda inestimável para a história do evento e, claro, da própria Monique.
“Ele foi a minha inspiração. Aprendi a me ligar nos detalhes e a entender de música através de seus comentários entusiasmados, ainda no tempo em que integrava a banda Sururu de Capote. Seu rigor musical foi fundamental para que o festival construísse sua história em cima da excelência artística”, define a produtora.
Seu legado continuará vivo, celebrado com a boa música que passará pelo Parque Ibirapuera nos próximos dias. ■
Publicado em VEJA São Paulo de 17 de maio de 2024, edição nº 2893