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“Nunca quis ser unânime”, diz Mochakk, que leva festa para o Anhangabaú

O DJ paulista, que lança novo EP nesta sexta (26), fala sobre a sua trajetória, saúde mental e a relação entre funk e música eletrônica

Por Tomás Novaes
25 jul 2024, 17h10

Com 24 anos de idade, Mochakk é um dos DJs brasileiros que mais ganha espaço nas pistas mundo afora. E, neste sábado, volta de turnê na Europa para agitar o Vale do Anhangabaú com a sua festa Mochakk Calling.

Nascido e criado em Sorocaba, Pedro Maia mora em São Paulo entre as turnês pelo Brasil e exterior. Inclusive, toda a identidade visual do seu evento tem inspiração no caos urbano paulistano (leia a entrevista mais abaixo).

Ao longo dos anos, o DJ criou um estilo próprio. Em cima do palco, discoteca sentindo a música com as mãos, fazendo gestos que viraram sua assinatura, assim como o uso de trechos falados, e não cantados, em músicas.

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O DJ paulista: lançamento nesta sexta (26) e festa em São Paulo no sábado (27) (Fabrizio Pepe @fabpepe_/Divulgação)

No currículo, tem apresentações em festivais e eventos internacionais como Coachella, Primavera Sound, Sónar e Cercle, além de comandar seu próprio selo musical, a Dogghaüz Records. No Instagram, são mais de 1,6 milhão de seguidores, e, só em 2023, fez 160 shows em 24 países e 111 cidades.

A festa na capital paulista, que tem expectativa de receber 5 000 pessoas, também terá sets de Cesar Nardini B2B Jay Mariani, Classmatic, Due, Eli Iwasa, Kenya20hz Mu540. Os ingressos podem ser comprados no site da Ingresse.

Nesta sexta (26), Mochakk lança a primeira metade do seu novo trabalho, o EP Locomotiva Ibiza 2099 (2024), pela CircoLoco Records. Confira mais sobre o lançamento, sua trajetória e outros assuntos na entrevista a seguir.

Para começar, qual a história do nome Mochakk?

Eu tinha outro nome de projeto antes, que era bem mais zoado, e quando as minhas músicas começaram a ficar com uma qualidade um pouco mais alta, quis dar uma repaginada. Criei uma marca nova para lançar essas músicas um pouco melhores. E queria que tivesse a ver com o meu sobrenome, que é Maia. Então pesquisei algumas coisas sobre mitologia Maia, descobri o deus da chuva, trovão e prosperidade, que é o Chaac, e dei uma estilizada na palavra, misturando com o café mocha, que eu gosto muito. E assim virou essa palavra.

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Como começou a sua relação com a música, e quando você começou a tocar?

Sempre gostei de instrumentos, meus pais eram muito fissurados em música. Minha mãe gostava muito de soul e coisas new age, anos 80, e meu pai era mais do rock e do blues. Com uns doze anos, descobri um programa de produção no computador e comecei a fazer uns beats de brincadeira. Comecei a tocar na época da escola ainda, com uns quinze anos. Eu estava na porta do colégio, esperando a minha mãe me buscar, quando um moleque me parou, disse que tinha uma festa e perguntou se eu gostaria de vender os ingressos na escola, ganhando uma porcentagem. Topei e fiquei muito amigo dele, que hoje é meu sócio, o Cesar Nardini. Ele me ensinou a tocar, me mostrou umas coisas de house, e eu comecei a tocar na festa dele. Ele me buscava na escola e a a gente ia junto para o club, para treinar no equipamento. Comecei a lançar as minhas músicas na internet, até chegar em algumas gravadoras, e começar a tocar em outros lugares do Brasil, principalmente no Sul. E, depois, os meus vídeos deram certo no exterior, e a parada se expandiu para fora (do Brasil).

Você já tocava mais house nessa época?

Quando comecei, eu produzia beats de hip-hop, na verdade. Fazia boom bap, uns hip-hops mais old school, meio anos 90, que eu gostava muito de ouvir. Comecei tentando recriar aquilo que eu gostava, e depois passei a exercitar os meus sons autorais. Mas eu já gostava de ouvir algumas coisas de música eletrônica. Esse amigo meu, Cesar Nardini, foi quem me mostrou as coisas que estavam rolando, inclusive de artistas brasileiros, como o Vintage Culture, o Alok, e comecei a descobrir sonoridades que eu nem sabia que existiam. A partir desse encontro, fui conhecer a fundo esses estilos, house, techno e todas as vertentes de música eletrônica que dominam o negócio.

Você chegou a fazer faculdade de música?

Primeiro, eu cursei moda por um semestre. Minha mãe era estilista e eu cresci mexendo com roupas. Às vezes eu via uma peça legal na internet e pedia para ela fazer algo parecido, e ajudava com os moldes, a cortar os tecidos. Mas fiz um semestre só, não consegui seguir porque eu já tocava nessa época, e o curso tinha muitos trabalhos. Então decidi levar a música como primeira carreira, e fui fazer produção musical na Belas Artes (faculdade em São Paulo), fiz os dois anos do curso, mas peguei algumas DPs por perder aula. Veio a pandemia e resolvi trancar para cursar elas presencialmente, mas durou tempo demais e acabei perdendo a matrícula. Então não tenho meu diploma, mas fiz o curso inteiro.

Há quanto tempo você mora em São Paulo, e em que bairro?

Me mudei para São Paulo com dezessete anos. Morei primeiro nos Campos Elíseos, em um estúdio minúsculo, com um amigo meu. Depois, três amigos dividiam um apartamento em Perdizes, e um deles se mudou para Campinas. Quando vagou um quarto, fui para lá, e até hoje moro junto com esses amigos em Perdizes. É quase uma república universitária. Mas estou com planos de me mudar para Pinheiros.

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Como veio essa ideia de começar a gravar os seus sets e postar nas redes sociais?

Quando vou tocar, não sei quais serão todas as músicas. Tenho mil e tantas faixas no meu HD, e vou tocando o que sinto que vai encaixar naquela hora. Não dá para prever que horas vai acontecer alguma coisa, então o processo é gravar tudo e depois pegar os momentos legais. Todo mundo já utilizava essa dinâmica de trabalho na noite, mas o Nadai (Pedro Nadai, seu videomaker) teve a ideia de fazer um compilado dos melhores momentos. Nós dois temos o background de dançar hip-hop e break, e, nesses nichos de dança, rola muita batalha de freestyle, em que basicamente você tem que ilustrar os sons com movimentos do seu corpo. Gosto muito de fazer gesticulações no set, e ele começou a fazer movimentos de câmera acompanhando esses meus gestos. Ficou uma estética muito maneira, e isso deu o tom do meu conteúdo visual. Um dia, quando tinha só 180 seguidores no TikTok, peguei um desses vídeos, fiz um corte vertical e postei. Em 24 horas, foram 1,3 milhão de views, e começou a pipocar convites para tocar em vários países.

Que ano foi isso?

Foi no começo de 2021. Na metade do ano a gente já estava partindo em turnê para a Europa, tocando na Sérvia, Espanha, Itália. A primeira data que eu toquei fora do Brasil foi uma after party da Fórmula 1 em Jedá, na Arábia Saudita. Foi bizarro. Assim a gente começou a postar esse tipo de conteúdo, com a câmera virada para o DJ, da perspectiva da pista. Depois desses vídeos explodirem, todo mundo começou a gravar assim, e deu certo para muita gente.

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Registro da festa ‘Mochakk Calling’ em Lisboa: rolê no jardim da Torre de Belém (Matheus Massarotti (@qifotomassa)/Divulgação)

Como você preserva sua saúde mental, com essa agenda maluca?

É uma parada que você assina, concorda com os termos e vai. Vivo tudo o que sempre sonhei, trabalhando com o que mais gosto. Mas, realmente, é cansativo, não vejo a minha família e meus amigos o quanto eu gostaria. É muito difícil fazer uma viagem que não é de trabalho, sem falar na saúde física. Pegar vários voos, dormir mal, comer comida de aeroporto. Você precisa fazer coisas na sua rotina para compensar isso, senão você não dura. Eu tive um problema sério nas costas, tenho dois discos desgastados porque eu estava subnutrido, sedentário e dormindo pouco. Hoje em dia, tenho uma rotina totalmente diferente, me alimento melhor, tenho uma rotina de exercícios maneira, faço fisioterapia, musculação. Bebo muito pouco, 5% das festas em que eu toco eu bebo, o resto fico só na água. São coisas que eu não fazia no começo, você não pensa em ser um DJ atleta para aguentar a carreira. Quando eram cinco datas no mês, eu podia beber e fazer um after, mas hoje, com quinze, vinte datas, não tem como. E terapia também é algo muito importante, que eu não deixo de fazer. Me ajuda muito a desvanecer ideias que estão esfumaçadas na cabeça ou a resolver ciclos de overthinking.

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Qual é a ideia do Mochakk Calling, como nasceu esse projeto?

É um evento que a gente desenvolveu em equipe. Faz um tempo que queríamos criar uma festa autoral, para traduzir não só o meu universo sonoro, mas também outros combustíveis artísticos. Por exemplo, visualmente, na produção do palco e toda a estética, tudo remete à urbanidade, a São Paulo, o caos, fios elétricos, torres. Adoro viajar, mas o meu lugar preferido é São Paulo, em casa. Tentar trazer essa aura para outras cidades do mundo é muito massa. Aqui na Europa não tem essa mesma visceralidade, e eu sinto falta, gosto muito desse caos. Vamos trazer também convidados, estamos sempre buscando nomes locais, e também não se prendendo só a house ou techno. O Calling não é só um chamado para o público conhecer meu universo, mas também para a galera se ligar em coisas que estão acontecendo na cena. Estou chamando artistas, estou chamando o público, estou chamando todo mundo para ver aquilo.

Nesta sexta (26), você lança um EP. Que trabalho é esse?

A gente fez um EP de seis faixas, que vai sair em duas partes. A primeira terá No Boys Allowed, com uma rapper e cantora que se chama Tommy Genesis. Serão duas versões desse som, uma house e outra breakbeat. Também terá um collab com o Nadai, chamado Estribeira. Na segunda parte, vamos lançar Locomotiva Ibiza 2099, a faixa-título. Vão ter duas versões dessa, uma dub e outra com vocais, com a DJ e produtora VTSS. E também um outro som que se chama The Line, que estava parado na gaveta.

Você construiu uma sonoridade que usa muito trechos falados nas músicas. Como começou isso?

Gosto bastante de spoken word, músicas que usam vocais falados. Isso antes de ser fã de música eletrônica, já gostava de beats de hip-hop com alguma voz falando uma parada maneira, algum sample de discurso. E sempre achei legal você colocar mensagens não cantadas dentro de uma música. E samplear é um negócio que, também por gostar muito de hip-hop, acabei sempre fazendo e gostando. Estou sempre garimpando, procuro diálogos de filmes, pesquiso no YouTube, vou atrás de pessoas interessantes e procuro entrevistas. O processo depois é a parte mais burocrática, de liberar o sample e trocar ideia com o artista original, sempre faço as coisas corretas para não ter atrito com ninguém. Vou sempre fazer sampling, mesmo que seja burocrático, porque acho que vale a pena. Essa ferramenta deu para a gente não só músicas incríveis, mas até gêneros inteiros. Se não fosse o sampling, não existiria hip-hop e house.

“Grande parte da grana do cenário eletrônico no Brasil se concentrou no house e no techno, e dificilmente chega para DJs de funk que têm o mesmo engajamento”

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Como você lida com as críticas dos haters na internet sobre a sua maneira de tocar ou sua mistura de gêneros?

Cara, qualquer coisa que você fizer, vão te criticar. Antes dos meus vídeos estourarem, tinha gente que achava legal o jeito que eu tocava gesticulando, diziam que os DJs tocavam olhando para baixo. Depois, começaram a dizer que eu fazia muita maracutaia e estava sendo espalhafatoso. Se eu toco só coisas underground, vão criticar. Se eu toco só coisas comerciais, vão criticar. Eu não ligo mais para essas coisas. Nunca quis ser unânime, não quero ser o maior artista do mundo, hoje em dia eu faço o que gosto e é isso.

Recentemente, após um set seu com o Mu540 no festival Só Track Boa, rolou uma discussão na internet sobre a relação entre funk e música eletrônica. Qual a sua visão sobre isso?

Eu gosto de funk, procuro entender, estudo sobre e vou continuar tocando. Isso ter acontecido no Só Track Boa foi importante para caramba, porque é um ritmo de música eletrônica criado no Brasil. Se você botar um cara europeu para produzir, ele nem sabe por onde começar. A galera gringa toca samples de funk o tempo todo, mas nos festivais brasileiros sempre existiu essa separação de mundos. O surgimento do funk tem raízes muito parecidas com o nascimento do house, e essa segregação é totalmente baseada em elitismo e preconceito com a música eletrônica periférica, até por conta da grande higienização que aconteceu no house e no techno. Depois de um certo boom, se tornou música de playboy na cabeça da galera, e não era, no começo. Quando as coisas acontecem no mesmo espaço, você força o choque. Isso é interessante e importante, porque grande parte da grana do cenário eletrônico no Brasil se concentrou no house e no techno, e dificilmente chega para DJs de funk que têm o mesmo engajamento, ou às vezes até mais números e relevância. Os caras estão ganhando menos. É música eletrônica, criada aqui, tem que estar nos festivais também.

No exterior, esse purismo da cena eletrônica, em relação ao funk, também existe?

O Skrillex está tocando funk na gringa com o Fred Again, a gente vai ficar reclamando e deixar os gringos ganharem grana em cima disso? Não faz o menor sentido. Tem que estar rolando essa mistura, sempre foi uma música de pista, de inclusão, nunca teve a ver com segregação. Os argumentos que a galera usa para não deixar o funk penetrar no nicho house ou techno são completamente inválidos. Se for falar que é por conta dos vocais explícitos, tem um monte de house com vocal explícito em inglês, um monte de techno com putaria e letras de crime. Dizem isso para esconder o preconceito e o elitismo. Eu não ligo para as críticas, faço porque é legítimo, é brabo, e tem que estar chegando mais oportunidade para essa galera também.

Mochakk Calling. Vale do Anhangabaú, Centro. ♿ Sáb. (27), 20h. R$ 560,00 a R$ 1 400,00. ingresse.com.

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