#SPsonha: aprender a otimizar terrenos minúsculos
Mudanças no Plano Diretor finalmente permitem que pequenos terrenos possam abrigar moradia
Imaginemos o pós-pandemia: parte das classes altas vai continuar refugiada em condomínios fechados ou estâncias no interior, e aqueles com imóveis espaçosos poderão tornar permanente o home office.
Mas e aqueles que moram longe do emprego porque o preço do metro quadrado onde estão as grandes empresas é proibitivo? Continuarão a fazer longas viagens de ônibus ou terão de trocá-lo por carros-protegidos-do-vírus, piorando o nosso ar?
Hora de debater como permitir mais gente morando nas regiões desenvolvidas, com boa infra e com empregos na cidade.
A legislação municipal paulistana se deu ao luxo, por mais de cinco décadas, de inutilizar milhares de imóveis e terrenos vazios pela cidade, graças a regras muito restritivas de onde e quanto se podia construir. Com recuos obrigatórios pelos quatro lados de qualquer edifício, uma porcentagem de área permeável e às vezes exigindo garagens, muitos terrenos acabaram sendo relegados a estacionamentos (em outros, a grama cresce, e o proprietário se limita a colocar tapumes e rezar para se livrar do mico imobiliário).
É um desperdício, especialmente quando milhares, mesmo com renda de classe média, são empurrados para bairros cada vez mais distantes de onde trabalham, apenas por não encontrarem ofertas bem localizadas a preços mais acessíveis.
Os últimos Plano Diretor e Zoneamento melhoraram um pouco a situação, mas ainda engatinhamos. Pelo mundo, felizmente, surgem cada vez mais iniciativas de como otimizar esses pequenos espaços. As razões são variadas. Disparou o preço de morar em áreas centrais. Como acontece em São Paulo, o grosso do crescimento em muitas cidades ocorre em áreas periféricas, sem infraestrutura para tal. Nova York convocou um concurso de projetos no ano passado, “Grandes ideias para pequenos terrenos”, para estimular arquitetos a pensar em soluções criativas de habitação social em pequenos lotes que pertencem à prefeitura nova-iorquina (a prefeitura paulistana, por exemplo, tem centenas de terrenos assim). Os vencedores foram chamados para formar times de desenvolvimento com as autoridades habitacionais municipais (veja fotos de alguns dos vencedores nesta reportagem).
O Edifício La Juliana, em Santiago do Chile, é outra prova de como dá para fazer um belo prédio em um espaço reduzido. O escritório Ipiña+Nieto Arquitectos, também responsável pela reforma da Embaixada do Brasil no Chile, conseguiu projetar um edifício residencial com dezesseis apartamentos, uma loja térrea e escritórios em um terreno de 159 metros quadrados (e apenas 8 metros de fachada!). Com nove andares, janelões e um fosso interno, garantiu iluminação e circulação de ar às unidades. A lei local é esperta.
Por aqui, algumas poucas iniciativas tentam aproveitar esses pequenos terrenos perdidos em áreas bem servidas da cidade. O arquiteto Marcos Gavião está projetando cinco edifícios de doze andares em terrenos de 300 a 420 metros quadrados pela primeira vez, graças às novas leis. Em comum, eles têm cerca de quarenta unidades cada, de diversos tamanhos, entre 20 e 100 metros quadrados. Ficam em bairros como Vila Nova Conceição e Jardins. “São obras pequenas, logo mais caras, que só se viabilizam em bairros muito valorizados. A incorporadora faz em pares, canteiros bem próximos, para contratar a mesma construtora e ratear os custos fixos”, conta o arquiteto, que trabalha com as incorporadoras TPA e Next.
Para o incorporador Andre Czitrom, que faz habitação pelo Minha Casa, Minha Vida, no Centro e na Bela Vista, os incentivos deveriam ser maiores. “Normas de desempenho deveriam ser diferentes. Permitir mais adensamento para quem não murar e colocar comércio no térreo”, reclama. “Em terrenos com menos de 250 metros quadrados e frente com menos de 8 metros de largura, recuos já não são mais exigidos. Deveriam fazer o mesmo com os até 500.” Aprendendo com Tóquio.
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 20 de maio de 2020, edição nº 2687.