Como funciona central de câmeras que prendeu 159 pessoas em flagrante
Com reconhecimento facial ainda em testes, Smart Sampa terá 40 000 equipamentos conectados
Inaugurada há pouco mais de um mês na Rua XV de Novembro, no Centro Histórico, a central de monitoramento do Smart Sampa tem como objetivo reunir, em um só lugar, as imagens provenientes das mais de 15 000 câmeras que começaram a ser instaladas pela prefeitura, desde fevereiro, em ruas, avenidas, pontes, viadutos, calçadas, escolas municipais, prédios públicos, mobiliários urbanos, entre outros.
A meta da gestão paulistana é chegar a 20 000 aparelhos até o fim de 2024, juntamente com o compartilhamento de outras 20 000 câmeras particulares, colocadas em prédios, casas, parques concedidos (como Ibirapuera e Villa-Lobos), além de empresas privadas e públicas, como estações de metrô. “Quando isso ocorrer, a central terá acesso às imagens de uma câmera para cada 300 moradores da cidade”, afirma o secretário de Segurança Urbana, Alcides Fagotti Junior.
Com tecnologias de reconhecimento facial, leitura de placas de veículos e alguns modelos com um alcance de 4 quilômetros, além de inúmeras utilidades, os aparelhos já possibilitaram a prisão em flagrante de 159 pessoas. Duas dessas detenções ocorreram em uma escola municipal de Cidade Tiradentes, na Zona Leste.
Furto de cabos Câmeras instaladas na parte externa de uma escola, com giro de 360 graus, captaram um homem pulando o muro para furtar fios e cabos. O caso ocorreu em Cidade Tiradentes, na Zona Leste. Acionada pela central Smart Sampa, a Guarda Civil Metropolitana mandou agentes ao local, que efetuaram a prisão em flagrante.
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Menos de uma semana depois de ser preso (e solto), o mesmo homem invadiu a escola e foi novamente detido pela Guarda Civil Metropolitana.
Em 12 de junho último, um homem que havia pulado o muro para furtar fios, cabos e cestas básicas foi detectado pelas imagens e preso ali mesmo, oito minutos após a central acionar uma viatura da Guarda Civil Metropolitana que estava por perto.
Cinco dias depois, o mesmo assaltante, que havia sido beneficiado com a possibilidade de responder ao crime em liberdade, pulou novamente o muro da mesma escola e acabou detido pela segunda vez. Há também casos de crimes cometidos no Centro, incluindo a região da cracolândia (veja os quadros ao longo da reportagem).
Com alcance de até 4 quilômetros, uma câmera instalada nos arredores da cracolândia, no Centro, flagrou um homem com um objeto na cintura que parecia ser uma arma. “O homem mancando está com algo na bermuda”, disse o agente na central para os guardas que estavam próximo ao chamado “fluxo”. Revistado, o cidadão, que estava mesmo armado, foi detido.
Apesar de polêmico, o sistema de reconhecimento facial — que chegou a gerar questionamentos na Justiça devido à possibilidade de reforçar o racismo estrutural, hipótese descartada pelo Judiciário — conseguiu localizar, desde fevereiro, onze pessoas que estavam desaparecidas e faziam parte do banco de dados estadual. Sobre os bancos de criminosos, não há ainda nenhuma integração com sistemas federais, apenas com a lista de foragidos disponibilizada pela Polícia Civil em seu site. “O estuprador que estiver foragido e andando na cidade vai passar pela câmera, que comunicará os agentes de segurança, tanto a Guarda Civil quanto a Polícia Militar, para poder fazer a prisão”, afirmou o prefeito Ricardo Nunes.
Quando abriu o capô para levar a bateria do carro, o assaltante talvez tenha se preocupado em não ser visto pelos policiais que dão plantão na delegacia na mesma rua, a Marquês de Paranaguá, próxima à Rua Augusta. Captado pelas câmeras da prefeitura, o homem foi detido em flagrante depois de colocar o objeto em um carrinho de supermercado quando se dirigia a um ferro-velho.
Ao todo, são quatro modelos de câmera, que variam em tamanho. As instaladas próximas a semáforos — que se assemelham aos radares que registram infrações de trânsito —, embora registrem as placas dos carros, não autuam motoristas que furam o sinal vermelho ou passam acima do limite de velocidade, por exemplo. “Essas câmeras servem para flagrar veículos furtados, além de monitorar o trânsito das vias”, diz o secretário Fagotti, se referindo às possíveis integrações do Smart Sampa com órgãos municipais, como a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), e de prestação de serviço, como a Enel. “Todos eles terão espaço reservado na nossa central”, afirma.
Vejinha visitou a central do Smart Sampa na sexta-feira, dia 9 de agosto. No térreo, a área é aberta à população e possui dados atualizados de ocorrências na metrópole. Nesse dia, a reportagem acompanhou parte de um treinamento específico para a criação de um algoritmo responsável por gerar alertas de furtos de cabos em todas as regiões da cidade.
A ideia é que o software emita alertas automáticos quando houver tentativas de subtração dos fios. O mesmo poderá ocorrer com outros crimes, como pichação e o descarte irregular de entulhos, esse último, passível de multas ambientais e apreensão de veículos. “Quando o algoritmo identificar movimentação atípica nos locais de descarte, o próprio programa vai ler as placas dos caminhões e verificar quais autorizações ele possui”, acrescenta Fagotti. “O principal objetivo do Smart Sampa é otimizar serviços e integrar sistemas, desde o furto de cabos até o alerta de chuvas fortes.”
Esta não é a primeira vez que a prefeitura de São Paulo aposta nas câmeras para reduzir índices de criminalidade e melhorar a gestão da metrópole. Em 2017, o então prefeito João Doria criou o City Câmeras, com a meta de integrar em três anos 10 000 equipamentos próprios e particulares com a ajuda da população, mas a adesão não chegou a 20% do objetivo e o programa foi descontinuado. Entre os entraves estava a obrigatoriedade de os cidadãos arcarem com os custos de armazenamento das imagens “na nuvem”.
Após assumir o governo municipal, em 2021, Ricardo Nunes viajou a Buenos Aires, Londres e Nova York e viu de perto os modelos existentes nessas cidades, cujas integrações de diversos órgãos, públicos ou privados, são a principal receita para obtenção de êxito em vários setores, não apenas na segurança urbana ou viária. Na central de São Paulo, além de CET e Enel, haverá integração com Metrô, CPTM, Samu, Defesa Civil, além das polícias Civil e Militar, entre outros.
Na central do Smart Sampa também foi criada uma sala de gerenciamento de crise, que poderá ser acionada em casos de ocorrências relevantes, como enchentes ou incêndios. Agora, o desafio da prefeitura é fazer o novo sistema cumprir o objetivo de melhorar a gestão pública e, consequentemente, a vida dos paulistanos.
Publicado em VEJA São Paulo de 16 de agosto de 2024, edição nº2906