O novo “Tapa na Pantera” de Maria Alice Vergueiro
Um exemplar da “Bíblia Sagrada” aberto repousa, entre uma estátua de Santo Antônio e um candelabro, sobre um balcão no confortável apartamento de Higienópolis. Os pesados móveis de madeira e os sofás discretos sugerem que ali, em frente ao Parque Buenos Aires, vive uma mulher de 80 anos, refinada e de cabelos brancos, bem ao […]
Um exemplar da “Bíblia Sagrada” aberto repousa, entre uma estátua de Santo Antônio e um candelabro, sobre um balcão no confortável apartamento de Higienópolis. Os pesados móveis de madeira e os sofás discretos sugerem que ali, em frente ao Parque Buenos Aires, vive uma mulher de 80 anos, refinada e de cabelos brancos, bem ao estilo de tantas outras senhoras do bairro. Em meio aos elementos clássicos da decoração, a imagem do guerrilheiro argentino Ernesto Che Guevara e um quadro do dramaturgo irlandês Samuel Beckett saltam aos olhos e oferecem pistas destoantes em relação ao perfil da anfitriã.
De raízes aristocráticas, Maria Alice Monteiro de Campos Vergueiro, a dona do imóvel, aprendeu três idiomas até a adolescência, casou-se aos 22 anos com um advogado, teve dois filhos e, separada meia década depois, começou a se desviar da rota — para nunca mais parar. Nessa caminhada menos convencional, entrou fundo na trilogia sexo, drogas e teatro. Com atuações surpreendentes, virou a primeira-dama do teatro alternativo da capital, lutou contra o alcoolismo, esnobou convites para novelas da Rede Globo e conheceu o sucesso popular na internet com o vídeo “Tapa na Pantera”, em 2006, encarnando de forma impagável uma velha consumidora de Cannabis.
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Aos 80 anos, ela ainda foge ao máximo das obviedades. Muitas vezes, paga uma fatura alta por suas ousadias, mas as enfrenta de cabeça erguida. “Nem sempre foi assim”, confessa. “Eu já baixei a guarda para muita gente.” Desde o fim de 2000, Maria Alice convive com a doença de Parkinson e se esforça para que a interferência do diagnóstico na sua profissão seja a menor possível. “Minha fala já foi afetada, e nem sempre encontro aquela palavra na ponta da língua, mas trouxe o problema de saúde para meus personagens e não deixo de atuar”, afirma, com a voz embargada e uma lucidez espantosa. A artista passa o tempo inteiro em uma cadeira de rodas por causa de uma artrose e uma cirurgia malsucedida para a colocação de próteses nos joelhos. Na peça “As Três Velhas”, apresentada entre 2010 e 2013, desfilava pelo palco desenvolta sobre sua cadeira, cantava e mostrava os seios. “Quando você aceita uma limitação, tudo fica ilimitado”, justifica.
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