Emilio Orciollo Netto sobre “Também Queria Te Dizer”: “desembolsei 30 000 reais e foi a melhor coisa que fiz”
O ator paulistano Emilio Orciollo Netto, de 40 anos, faz no dia 1º de junho a centésima apresentação de um projeto muito pessoal. Com o monólogo tragicômico “Também Queria Te Dizer”, o artista superou um desafio profissional sonhado há muitos anos. No palco do Teatro Eva Herz, ele dá vida a seis personagens extraídos do […]

O ator paulistano Emilio Orciollo Netto, de 40 anos, faz no dia 1º de junho a centésima apresentação de um projeto muito pessoal. Com o monólogo tragicômico “Também Queria Te Dizer”, o artista superou um desafio profissional sonhado há muitos anos. No palco do Teatro Eva Herz, ele dá vida a seis personagens extraídos do livro de Martha Medeiros sob a direção de Victor Garcia Peralta. Para viabilizar o projeto, Orciollo desembolsou 30 000 reais e recuperou uma coragem às vezes escondida em duas décadas de carreira.
O fato de você ser um ator de 40 anos influenciou na escolha por um projeto formado por personagens mais confessionais?
A vida da gente se mistura o tempo todo com a carreira. Então, vi que era hora de dizer algumas coisas, bem como os personagens fazem, até porque minha história pessoal entrou em outro momento. Estou mais maduro como ator e também não sou mais um garoto. Tenho responsabilidades, inclusive com o público. Quando decidi montar essa peça, eu estava vindo de uma comédia que adorei fazer, “Os Difamantes”. Foram quatro anos em cartaz, sendo dois deles no Rio de Janeiro, ao lado da Maria Clara Gueiros. Em São Paulo, fiz com a Paula Cohen. Queria me dar um presente, enfrentar um desafio maior. Quando estreei “Também Queria Te Dizer” no Rio, eu olhei para a plateia e dei de cara com o Guilherme Leme, o Selton Mello e a Maria Clara. São pessoas que admiro, por quem tenho muito respeito profissional, então precisava dar o meu melhor. No final, eu ouvi gente falando: “eu entendo por que o Emilio decidiu fazer esse texto”.
Você estudou na Escola de Arte Dramática (EAD), a instituição mais tradicional do Brasil. O senso de responsabilidade vem de lá?
É um aprendizado que carrego da minha formação. A EAD faz você estabelecer um compromisso com sua arte. Não importa o gênero ou o tipo de arte que você pratica, mas é fundamental estar comprometido com ela. Ninguém passa impune por lá, né? No primeiro dia de aula, já ouvimos histórias como a da sopa que o Alfredo Mesquita (fundador da EAD) oferecia aos alunos. Quando prestei, eram quase mil candidatos. Como eu não vou valorizar e carregar comigo essa experiência?
Quem era sua turma na EAD?
Minha turma era muito bacana. Fui colega do Marcello Airoldi, Fabiana Gugli, Paula Cohen, Gustavo Machado, gente que seguiu trabalhando muito bem por aí.
Como você descobriu as cartas masculinas da Martha Medeiros?
O Victor Garcia Peralta me apresentou vários textos. Um deles foi o “Monster”, do Daniel MacIvor. Felizmente, eu não fiz (risos). Ainda mais vendo o trabalho maravilhoso do Enrique Diaz na montagem dele. No final de 2011, durante uma turnê, o livro da Martha caiu em minhas mãos e eu o devorei em uma tarde no hotel. Fiquei encantado. Vi que tinha teatro ali. Estreamos no Rio em novembro de 2012. Na última sessão de São Paulo, no dia 1º de junho, vai ser a centésima apresentação.
+ Leia entrevista com a escritora Martha Medeiros.
O que mais te encantou no texto?
Tem horas que você pensa que aquele texto foi escrito pelo Mário Bortolotto ou pelo Jô Bilac. Não, foi pela Martha Medeiros mesmo. Existe também a versão feminina, que foi montada pela Ana Beatriz Nogueira e são cartas mais ternas. As masculinas têm outro tom. Elas são mais fígado, são mais pâncreas mesmo.
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Você bancou o projeto com dinheiro do seu bolso?
Desembolsei 30 000 reais e foi a melhor coisa que fiz. Nem sempre vale a pena esperar pelo patrocínio. Claro, é muito importante receber um, viabiliza muitas coisas, inclusive viabilizou essa temporada em São Paulo. Mas muitas vezes o patrocínio demora muito – ou nem sai. E você perde a hora de fazer um trabalho que deseja muito no momento em que seria importante. Quando saí da EAD, eu queria montar “Anti-Nelson Rodrigues”. Sou apaixonado pela história do Oswaldinho e da Joyce e acho curioso que a maioria das pessoas fala que é um texto menor do Nelson. Muita gente carrega um sonho pela vida afora e nunca o concretiza. Decidi correr atrás. Também estou entre os produtores de um filme, “Por Trás do Céu”, dirigido pelo Caio Sóh, um cara muito talentoso, marido da Nathalia Dill.
Mas cinema já é um sonho bem mais caro do que o teatro, não?
É preciso investir um pouco mais de 30 000 reais (risos). No elenco, somos eu, Nathalia Dill, Everaldo Pontes e Paula Burlamaqui. Filmamos na Paraíba, durante a temporada da peça em São Paulo. Eu fazia o espetáculo no domingo e corria para o aeroporto. Voava para João Pessoa e, na segunda, estava no set. Na sexta, voltava para o palco.
Essas investidas de produtor são viabilizadas porque você é contratado da Rede Globo, certo?
Claro que é possível eu me produzir e fazer trabalhos diferentes porque tenho uma segurança oferecida pela Rede Globo. Sou contratado desde 2006 e, logo que terminou “Amor à Vida”, renovei até 2017. Nesse momento, eu quero contar histórias que esteja a fim. Na televisão, nem sempre você vive o personagem que sonha, então é preciso buscá-los no teatro e no cinema. Também estreio como diretor com a peça “Atrás da Porta”, escrita por Guilherme e Fernando Scarpa. São dois casais que acertam as contas em uma cozinha. Entramos em cartaz em 19 de julho no Teatro Glaucio Gill, no Rio.
Você percebe que o seu trabalho na televisão leva público para o teatro?
Eu acredito que quem faz novela tem o compromisso de formar público. Para mim, o Antonio Fagundes é o maior exemplo. Ele é um trabalhador. Está sempre na televisão sem jamais deixar o palco. O público de televisão vai ver o ator da novela em uma peça. Se ele gostar, vai ver a sua peça seguinte e, assim, é despertado o interesse dele por outros espetáculos também.
No dia em que assisti ao espetáculo, você convidou a plateia para um debate e fiquei surpreso com a pertinência das perguntas do público. Esse bate-papo é uma rotina?
Eu tive essa ideia depois de ver o debate sobre “Vermelho”, espetáculo com o Fagundes, e resolvi testá-la. Encontro pessoas com um raciocínio muito lógico, interessadas no conceito da montagem, em saber como ela foi concebida. Ninguém pergunta dos personagens que fiz nas novelas, por exemplo. Faço questão de levar esse papo para todas as cidades por onde passo. Em São Luís, no Maranhão, tive uma experiência emocionante. Uma senhora perguntou se poderia declamar uma poesia. O marido dela tinha morrido em um acidente de carro. Ela se identificou com um dos personagens do espetáculo. Foi muito bonito.
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