‘A Melhor Mãe do Mundo’ faz retrato do afeto maternal em meio à violência
Lançamento de Anna Muylaert traz Shirley Cruz e Seu Jorge como protagonistas

Amar incondicionalmente, proteger os filhos… Essas são algumas palavras que podem descrever as atitudes de uma boa mãe, mas nada chega aos pés de ver esse amor único na prática. A Melhor Mãe do Mundo, de Anna Muylaert, faz isso. Mostra, sem precisar dizer com todas as letras, ser um filme sobre uma mulher como qualquer outra, que é, porém, um universo inteiro quando a observamos diante das suas crias.

Gal (Shirley Cruz) é uma catadora de recicláveis com enorme aptidão maternal. Quando se torna vítima de violência doméstica do marido, Leandro (Seu Jorge), ela vai à polícia prestar queixa e foge da casa, no Glicério, com os filhos Rihanna (Rihanna Barbosa) e Benin (Benin Ayo).
Então, parte para as ruas em direção ao lar de uma conhecida, em busca de abrigo, e com o sonho de ir ao Itaquerão ver um jogo do Corinthians. Sem dinheiro, recorre à carroça para transportar as crianças, no que ela chama de “grande aventura”, na intenção de poupar os pequenos da dura realidade. Leva-os a um parque de diversão e para tomar banho na fonte da Praça Ramos de Azevedo.

Os apuros dessa jornada evidenciam os esforços sobrehumanos da protagonista. Ela terá que ser forte e ouvir a si mesma quando o marido tentar impedir essa rota de liberdade, para não permitir que o ciclo se repita. É uma história essencial para entender mais da mente materna, a partir da visão clara e bem definida da diretora.

Embora os momentos de construção do carinho (e não só da diversão) entre mãe e filhos sejam rápidos, são funcionais e suficientes para costurar a trama. O espectador sai da sala de cinema com apego pelos dois, como se fosse a própria mãe deles. São todos carismáticos, incluindo Leandro — e é justamente aí que mora o problema da violência doméstica —, por isso, palmas ao elenco. Confira a seguir entrevistas com Anna e os atores.
Anna Muylaert fala sobre novo lançamento

A história veio de um lugar pessoal para a diretora, tanto pela parte da maternidade quanto do relacionamento abusivo. “Eu só fui entender que era abusivo depois e fui ficando muito magoada comigo mesma por ter deixado aquilo acontecer”, conta. “Aí comecei a pensar sobre a formação milenar das mulheres, como uma mãe pode passar uma maldição para a próxima geração se ela não parar.” Com essa reflexão na cabeça, conheceu a história de duas carroceiras que levavam as crianças com elas e juntou os pontos. “Fui pesquisar sobre esse mundo e conhecer as pessoas. Entrei com a sensação de que elas seriam coitadas e saí com a sensação de que elas eram guerreiras, deusas, rainhas, pela força das histórias e da vida.”
Shirley Cruz fala sobre protagonista em ‘A Melhor Mãe do Mundo’

A atriz decidiu fazer parte do projeto pois tinha “todos os ingredientes possíveis” que a interessam como atriz. “Eu sempre fui fã da Anna, apelidei de cinema de fé. Essa mulher tem fé que o audiovisual é realmente uma arma poderosa no combate à violência e desigualdade”, diz. “Eu sabia que ela não ia querer uma mulher coitada. É uma história de vitória, superação.” Shirley gravou o filme logo após ter dado à luz uma menina. “Isso me deu todo o tom. Eu falo que meu útero chegava primeiro naquele set. Ele ainda sangrava, estava desorganizado.” Ela acredita que o filme toca em assuntos complicados de um jeito brilhante e esperançoso e espera que vá incentivar as pessoas a olhar com empatia para as mulheres à volta.
Seu Jorge vive papel desafiador em novo longa

O papel foi desafiador para o ator e cantor. “Até a gente chegar àquele resultado, foi um processo de muita escuta, principalmente de Shirley como Gal”, afirma. Segundo o artista, ao mesmo tempo que o personagem é carismático, também é brutalizado. “Ele é quebrado”. Seu Jorge expressa alegria em retornar ao cinema brasileiro, após participar de Asteroid City (2023), de Wes Anderson. “Quando acabou A Vida Marinha com Steve Zissou (2004), ele disse que iria me convidar para um extra. Nutri esperança e levou 18 anos para acontecer. Fiquei maravilhado de reencontrar amigos. Na cinematografia dele, nada mudou”, conta. “Foi bonito, foi bacana, mas eu fico doido para voltar para casa, porque nossas histórias são muito fortes.”
Rihanna e Benin

Assim como Gal poupa os filhos das dores com brincadeiras, os atores Benin Ayo e Rihanna Barbosa também se divertiram durante as filmagens. “A cena mais legal foi a do meu dente caindo, fiquei em choque”, define o menino. Ele ainda cita os trechos no parque de diversões e o banho na fonte da Praça Ramos de Azevedo. “Foi a experiência mais legal que eu já tive na minha vida”, ele completa. Rihanna compartilha do sentimento: “É um filme emocionante, que conta a realidade de várias mulheres. Para mim, foi uma honra fazer. A Anna é uma diretora sensacional, ela trabalha com muito profissionalismo e ao mesmo tempo é muito divertida. Toda hora que a gente fazia a gravação direitinho ela dava balinha de menta.
NOTA: ★★★☆☆
Publicado em VEJA São Paulo de 8 de agosto de 2025, edição nº 2956