Alentejo, região portuguesa líder de mercado no Brasil, está no auge
Depois de décadas de ostracismo, área volta à mesa nacional
O Alentejo é hoje a origem de vinhos do Velho Mundo mais vendida no Brasil — frisando que não é apenas a origem portuguesa campeã, mas de toda a Europa. Importamos, no ano passado, 4 milhões de litros de lá.
Apesar de o produto ter história milenar na região, o Alentejo renasceu nas últimas décadas. Basta dizer que em meu primeiro livro, O Vinho para Quem Tem Estilo, escrito nos anos 90, no qual eu detalhava as principais regiões portuguesas, eu nem sequer citava o Alentejo. A explicação é simples.
Durante o chamado Estado Novo (1933-1974), o Alentejo foi designado como “celeiro de Portugal”, e a maior parte das vinhas foi substituída por cereais. Após a Revolução dos Cravos, em 1974, lentamente a região retomou sua vocação para o vinho. Até os anos 1970, havia menos de 200 hectares de vinhedos. Hoje, são 22 000. Metade do vinho consumido atualmente naquele país vem do Alentejo, que conta com cerca de 2 000 viticultores e 200 vinícolas, fabricando mais de 100 milhões de litros por ano.
Embora centenas de castas estejam em produção ali, as mais típicas são, nas tintas, alicante bouschet, aragonez (também chamada tinta roriz no Douro e tempranillo na Espanha) e trincadeira. Nas brancas: antão vaz, arinto e roupeiro. Outras cepas, menos tradicionais na área, estão sendo cada vez mais plantadas, como syrah, touriga nacional e, principalmente, touriga franca.
O maior motivo do avanço dessas variedades é a mudança climática, com o aumento das temperaturas e da falta de água — fator crítico por lá. Estive no início de agosto na região e vivi dias de mais de 40 graus. Visitei vinhedos destruídos pelo calor e pela seca. Uma situação grave, que assola várias áreas ao redor do planeta.
Motivada por essa situação, a Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA), em parceria com a Universidade de Évora, desenvolveu o Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo, um dos pioneiros — PSVA, iniciativa pioneira em Portugal. O programa, com certificação gratuita, engloba dezenove quesitos, como gestão da vinha, dos solos, dos resíduos, da energia e da já citada água. A iniciativa conseguiu reduzir em várias propriedades o consumo de energia em 30% e de água em 20%, além de aumentar a taxa de reciclagem em quase 40%. Já são certificados 122 viticultores e 42 vinícolas, englobando mais da metade do que é produzido na região.
Uma peculiaridade alentejana são os “vinhos de talha”, um sistema ancestral herdado dos antigos romanos que estiveram por ali. Esses vinhos artesanais, feitos em ânforas de barro, reconhecidos como Patrimônio Cultural Imaterial da Unesco, fazem do Alentejo o único local do mundo, junto com a Geórgia, no leste da Europa, com produção contínua em ânforas há mais de 2 000 anos.
António Maçanita FitaPreta O Ancestral. Elaborado com vinhas velhas, entre 35 e 51 anos, de diversas castas tradicionais misturadas no vinhedo, entre elas roupeiro, rabo de ovelha, arinto, tamarez e alicante branco, sem passagem por barrica e com apenas 12,5% de álcool. Um vinho mineral, seco, fresco e frutado, com muito caráter. R$ 289,90, na Evino.
Terras de Estremoz Regional Alentejano Tinto. Da vinícola Ségur Estates. Elaborado com aragonez, trincadeira e castelão. Com estágio em barricas de carvalho francês de segundo e terceiro uso durante três meses, com 13,5% de álcool. R$ 50,47, na Wine.
Reguengos Reserva Alentejo D.O.C. Da Cooperativa de Reguengos de Monsaraz. Elaborado com alicante bouschet, aragonez e trincadeira. Amadurece em barricas de carvalho americano e francês por doze meses. Tem álcool alto, de 15%. R$ 149,90, na Amazon.
Vinho de Talha Moreto. Feito com a casta tradicional moreto, de vinhedos de oitenta anos, fermentado em talhas (ânforas) de barro. De cor rubi clara. Aroma de fruta fresca vermelha. Paladar de ótima acidez, frescor, textura um pouco rústica da talha. Bem “raiz” dentro do estilo, mas com modernidade na elaboração (limpeza, definição). R$ 280,50, nas Americanas.
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Publicado em VEJA São Paulo de 7 de setembro de 2022, edição nº 2805