“Sem amigos, ninguém escolheria viver”
Diana Gabanyi, da The School of Life no Brasil, ensina a ser sincero e, em certos pontos, vulnerável para desenvolver laços duradouros
Aristóteles, autor da frase acima e um dos três grandes filósofos gregos, ao lado de Platão e Sócrates, acreditava que a amizade é o ingrediente mais importante de uma vida feliz, mesmo para quem tem tudo o mais que a vida pode oferecer.
Ele também pensava sobre os tipos de amizade, e sugeriu um exercício interessante, pedindo que cada um listasse os amigos — o parceiro, o amigo mais antigo, o sócio, o professor, os colegas de trabalho, os vizinhos… Nesse grupo tão vasto de relacionamentos, quem poderia ser considerado um verdadeiro amigo?
Chegamos a algumas categorias. Na dos colegas de trabalho, por exemplo, a amizade permanece firme enquanto estamos no mesmo ambiente diariamente, mas não se fortalece quando um vai embora. Na da amizade profunda, você sabe que o relacionamento vai durar a vida toda. Aqui, os velhos amigos têm um papel importante.
Antes de começar a escrever esta coluna, decidi fechar o computador e ligar para uma grande amiga, de mais de 25 anos. Ela hoje não mora em São Paulo, ou seja, nossos encontros se tornaram mais raros do que gostaríamos. Nós nos perdemos no trabalho, nas obrigações da casa e em outros compromissos menos importantes que tornam uma longa e necessária ligação telefônica, tão simples de fazer, também uma raridade. Durante uma hora, conversamos de tudo. Até choro teve, em um nível de vulnerabilidade que talvez só seja possível entre velhos amigos.
Domine a arte de uma boa conversa. É nela que se revela a verdadeira personalidade. Nenhuma atividade humana exige mais atenção, por ser ela a mais comum. através da conversa, podemos ganhar ou perder. Não seja inacessível. Ninguém é tão perfeito que não precise do conselho dos outros. aquele que não ouve é um tolo incorrigível. Deixe a porta aberta para a amizade; ela é a porta do socorro
E se formos ainda mais para trás? Qual é o seu amigo hoje em dia de quem você conhece bem a família, os pais e os irmãos? Você se lembra daquele amigo de escola cuja casa você frequentava? Sou feliz por hoje em dia ter amigos de verdade — não muitos — que conheço desde os 5 anos de idade (ou até menos). Mesmo que a vida tenha nos levado para caminhos diferentes por um período (ainda que longo), essas são amizades diferentes de todas as outras.
Cada um desses relacionamentos funciona como uma ligação a uma versão anterior de mim mesma que é inacessível no dia a dia, mas que contém percepções extremamente importantes. São essas amizades que nos lembram de como éramos na infância — e a nossa infância nos dá muitas pistas de quem somos como adultos. Quando estou com um velho amigo, que hoje consigo encontrar com frequência, fazemos um balanço da jornada que percorremos. Temos a oportunidade de ver a nossa evolução, o que antes era um sofrimento, o que costumava importar e hoje é irrelevante ou o que esquecemos completamente de que gostávamos tanto e com que podemos retomar contato. O velho amigo é um guardião de memórias. Velhos amigos são partes imprescindíveis de nós mesmos, mas que estamos sempre correndo o risco de esquecer.
Esta reflexão não está aqui para dizer que as amizades atuais não importam. Elas são apenas diferentes. Foi através de uma amizade instantânea com a Jackie de Botton, há quase uma década, que surgiu a The School of Life no Brasil. Ainda que possamos discordar em alguns pontos do negócio ocasionalmente, fazemos questão de colocar a nossa amizade acima de tudo. Afinal, como dizia Aristóteles, sem uma verdadeira amizade, você não consegue se encontrar.
Diana Gabanyi, junto com a amiga Jackie de Botton, é fundadora da The School of Life no Brasil, escola localizada na Vila Madalena que ensina que ser sincero — e, em certos pontos, vulnerável — é essencial para ouvir com cuidado e compaixão e desenvolver laços fortes e duradouros.
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 10 de julho de 2019, edição nº 2642.