“Ter um namorado é vergonhoso?”
Artigo viral da Vogue UK questiona a função e os constrangimentos de um relacionamento heterossexual
Dias atrás, li o artigo da escritora britânica Chanté Joseph, “Is Having a Boyfriend Embarrassing Now?”, que movimentou a internet. Ela fala de um novo constrangimento entre mulheres jovens: o de admitir um relacionamento heterossexual.
Por baixo do tom provocativo, o texto expõe o quanto a sociedade brasileira e nós, enquanto mulheres que vivemos aqui, carregamos uma ferida exposta pelo machismo latino-americano: perceber o quanto ainda somos moldadas pela lógica do amor como validação.
Chanté escreve como uma mulher negra que conquistou autonomia e espaço, mas reconhece o peso de um sistema que sempre exigiu que tivéssemos “alguém”.
E é impossível não pensar na nossa realidade.
Aqui, no Brasil, para nós, mulheres negras, independência nunca foi discurso: foi sobrevivência.
Nossas mães, avós e tias não puderam contar com homem nenhum para existir, elas sustentaram famílias, criaram filhos, alimentaram o país. Mesmo assim, até hoje, existe uma validação silenciosa quando uma mulher chega acompanhada.
E eu concordo que uma mulher negra sendo amada, postando sua foto num casamento feliz com um homem negro ao lado e crianças sorridentes é revolucionário num país que tem como plano nos exterminar há mais de um século. Mas o simples fato de “ter um homem do lado” não deveria ser fator predominante para que a sociedade julgue essa mulher digna da humanidade que o racismo insiste em tentar nos arrancar.
Nas redes, o debate virou espelho e catarse.
A Adriana Ventura tuitou: “A gente amando os homens em voz baixa, quase em silêncio” e completou: “é sobre equilíbrio.” A Maju Torres celebrou “as garotas que são casadas ou namoram, mas pra quem o relacionamento é um detalhe, não o todo”.
Essas frases captam o espírito de um tempo em que o amor pode existir sem sequestrar a individualidade. Como escreveu uma outra usuária: “tem mulher que se afasta das amizades pra viver a instituição casal” e sabemos que isso não é uma raridade.
Adriana Ventura em seu livro e suas redes fala da síndrome da escolhida, essa fantasia de que o amor romântico, especialmente o heterossexual e monogâmico, é o ápice da realização feminina. Mas quando olhamos de perto, essa estrutura serve mais à manutenção do patriarcado do que ao florescimento do afeto.
Vivemos um mundo politicamente polarizado, onde até os modos de amar parecem ter filiação partidária. Ter ou não ter um relacionamento heteronormativo passa a ser lido como gesto de conservadorismo ou de progressismo. Mas é preciso lembrar que: casamentos sempre foram negócios, acordos sociais e políticos travestidos de destino romântico, e ainda é! O amor nunca esteve fora da política, porque desejar também é uma forma de escolher o que se acredita. No fim, o que atrai não é só a imagem, mas o que ela comunica: valores, repertórios, modos de estar no mundo.
E talvez seja por isso que vemos tantas mulheres dizendo “não” a vínculos, a performances, a culpas. Mulheres que falam abertamente sobre longos períodos sem sexo, sobre prazer sem par, sobre amor sem centro masculino.
bell hooks já dizia que o amor não é posse, é prática de liberdade. É bonito ver mulheres reconhecendo que o amor não precisa pedir desculpas pra existir fora da norma.
Que dá pra amar e ainda assim caminhar inteira. Mas será que numa relação heteronormativa temos homens com coragem suficiente para amar uma mulher inteira?
Talvez o novo amor revolucionário não seja o que se exibe como troféu, mas o que se constrói com autonomia, sinceridade e coragem.
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