Carimbo de visto em até três semanas
A rotina do consulado americano ficou ainda mais agitada depois da decisão de Barack Obama de reduzir a burocracia para os processos
Num passado não muito distante, boa parte dos paulistanos sofria bastante na hora de procurar o Consulado dos Estados Unidos. Na época em que ele funcionava na Rua Padre João Manuel, nos Jardins, algumas pessoas chegavam a dormir na calçada, pois as filas para o atendimento eram intermináveis. Parte delas saía de lá com o visto negado, sem maiores explicações. Em meados da década de 90, veio à tona um escândalo motivado por uma denúncia de um dos entrevistadores. Segundo ele, os candidatos eram avaliados também de acordo com sua aparência, recebendo na ficha anotações como “parece pobre” ou “garoto rico”. Em 2004, o consulado se mudou para a Chácara Santo Antônio, na Zona Sul, com a promessa de melhorar o atendimento. Desde então, a taxa de reprovação caiu de 21% para 5%. Isso não impediu o fim das queixas sobre a morosidade da burocracia.
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O sofrimento continua, mas poderá diminuir consideravelmente nos próximos meses. No último dia 19, o presidente Barack Obama anunciou que pretende agilizar a concessão de vistos para o Brasil e a China. Cada visitante desses países gasta nos Estados Unidos 5.000 e 6.000 dólares por viagem, respectivamente. A projeção é que até 2016 o número de turistas brasileiros aumente em 274%. Em 2011, estima-se que tenha sido mais de 1,5 milhão, um recorde. Os paulistas representam metade desse contingente, o que faz do consulado americano na capital — que atende também interessados de outros estados — o número 1 em emissão de vistos no mundo.
“Nosso objetivo é estreitar cada vez mais as relações entre as duas nações”, afirma o cônsul-geral interino William Popp. “Queremos mostrar que os brasileiros são bem-vindos.” Para dar conta da demanda, o consulado pretende implementar uma série de medidas até setembro. A meta é reduzir o tempo de agendamento da entrevista de dois meses para três semanas em 80% dos casos. Com isso, deve aumentar em 50% a média de 3.000 atendimentos feitos diariamente. “Recebemos agora muita gente que nunca foi para o exterior, das classes C e B”, diz a mineira Jussara Haddad, responsável pelo departamento de turismo e funcionária do consulado há duas décadas.
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A parte de vistos, entretanto, representa somente um quinto dos profissionais do consulado, que conta com setores como comércio, agricultura, finanças e cultura. Ele funciona em um complexo de oito prédios e ocupa um terreno de 56.000 metros quadrados. A propriedade, que antes sediava um laboratório farmacêutico, foi comprada por 19 milhões de dólares. Em tamanho, só perde para os consulados americanos de Hong Kong e Frankfurt. Basta passar pela frente para ver que ali, sobretudo depois dos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, a segurança é uma prioridade. Por todo lado há guaritas blindadas, guardas, câmeras, detectores de metal e raios X. Por trás dos bem guardados muros, porém, se esconde uma agradável área arborizada, com uma extensa parte de lazer que reúne piscina, parquinho, campo de futebol, quadra de basquete e academia.
Não só os funcionários e seus parentes aproveitam essas comodidades. Elas também são oferecidas aos participantes de programas culturais do consulado, que saboreiam churrascos típicos, aprendem a fazer cookies ou jogam beisebol. No estacionamento fica abrigada uma frota de carros blindados do modelo Suburban, da Chevrolet, reservados para diplomatas e autoridades americanas que vêm a São Paulo. Com o fim da guerra, um dos veículos que estavam no Iraque veio parar na Chácara Santo Antônio. Lá dentro, as paredes exibem retratos de Obama e da secretária de Estado Hillary Clinton, bandeiras, fotos de pontos turísticos, brasões e até cocares de índios.
Trabalham no consulado, das 7h30 às 16h30, 360 funcionários. Destes, 115 são diplomatas de carreira. Eles permanecem no posto por até três anos. Alguns se casam aqui. Nos últimos dois anos, oito diplomatas tiveram filhos na cidade. Da área de cultura, Katherine Caro, de 31 anos, logo deve fazer parte do grupo. “Os estrangeiros gostam de ter filhos em São Paulo porque os hospitais são bons e as babás mais baratas”, conta. Ela trocou alianças com um diplomata mexicano que também trabalha na capital.
Uma das chefonas da seção de vistos, a durona A.M. (que não quis ser identificada) coleciona histórias curiosas em seus 25 anos de serviço. Já viu gente tendo de ser escoltada por seguranças após armar um barraco ou desmaiando porque não conseguiu a aprovação. Há quem agradeça tanto por ter passado pelo crivo que manda caixas de bombons, uísque e mesmo joias, que não passam da porta de entrada. “Instruímos os funcionários a ser simpáticos, porém rápidos, evitando estender bate-papos”, diz. Nos próximos meses, A. terá muito trabalho pela frente, assim como o comerciante José Maria Pereira. Em sua banca em frente ao consulado, ele oferece os serviços de foto, internet, guarda-volumes e impressão de formulários. Pereira e seus concorrentes só têm a comemorar com as anunciadas mudanças no consulado e o interesse cada vez maior dos paulistanos em viajar para os Estados Unidos.
MUDANÇAS À VISTA
Medidas que devem ser implementadas até setembro para agilizar a concessão do visto
■ O prazo de agendamento de entrevista passa da média atual de dois meses para três semanas em 80% dos casos
■ Por dia, são atendidas 3.000 pessoas, número que deve crescer em até 50%
■ A equipe encarregada dos vistos deve dobrar para 143 funcionários
■ Hoje, estão isentos de entrevista menores de 14 anos e maiores de 80. A faixa etária se expandirá em breve, mas os detalhes ainda serão anunciados
■ Desde a última terça (24), o prazo de renovação para o visto vencido sem entrevista (se a pessoa continuar apta) aumenta de um para quatro anos
■ A espera para ser atendido, que chega a três horas, será diminuída.