Trânsito: Campanhas de educação
Pouco adianta encher as ruas da cidade de modernos equipamentos de controle de tráfego se o condutor continuar a desrespeitar as regras de trânsito
Campanhas de educação – Pouco adianta encher as ruas da cidade de modernos equipamentos de controle de tráfego se o condutor continuar a desrespeitar as regras de trânsito. Uma das soluções para mudar o comportamento de quem está ao volante são as campanhas educativas. “Quando bem-feitas, são um investimento barato, duradouro e efetivo porque acabam com práticas que comprometem a segurança e pioram o tráfego”, diz a pedagoga Nereide Tolentino, especialista em educação de trânsito e coordenadora do Projeto Transitando. Há dois anos, ela apresentou à CET um programa para inserir conceitos de segurança no trânsito em disciplinas do ensino médio de 250 escolas estaduais da cidade ao custo de 500.000 reais em três anos. Até hoje não obteve resposta. A CET, que gastou 3 milhões de reais com publicidade só no ano passado, diz que o programa está atrasado porque aguarda licitação. Profissionais de propaganda poderiam ser convidados a criar, gratuitamente, campanhas como essas. Caso houvesse um projeto bem definido, emissoras de TV ou rádio, jornais e revistas poderiam ceder espaço a elas. As campanhas também deveriam ser direcionadas aos 200.000 motoboys que trafegam pela cidade. Para cumprirem o prazo das entregas, eles ultrapassam limites de velocidade e circulam irresponsavelmente por entre os carros. O resultado já é bem conhecido: todo dia, um motociclista morre e outros 25 saem feridos em acidentes de trânsito – a maioria fica inválida.- Pedágio nas regiões centrais – Já que não é possível barrar o crescimento da frota, uma das saídas para diminuir os veículos em circulação é taxar os automóveis que rodem por determinados locais. Cobrar pedágio dos motoristas tem sido a receita adotada por algumas grandes cidades do mundo. Em Londres, Cingapura, Oslo e Estocolmo, para aliviar seus congestionamentos, quem circula pelas vias principais dos centros urbanos tem de pagar por isso. Os londrinos desembolsam cerca de 8 libras por dia (32 reais) para rodar pelo coração da metrópole entre as 7 e as 18 horas. “As críticas à medida eram grandes no início, mas diminuíram quando os primeiros resultados apareceram”, diz Ben Pennington, porta-voz da Transport for London, espécie de CET londrina. Desde 2003, quando o pedágio foi implementado, a área central livrou-se de 65.000 carros diariamente e o trânsito foi reduzido em 20%. Nesses quatro anos de operação, Londres arrecadou 2,4 bilhões de reais e investiu a metade disso em transporte público. “Os ônibus que cruzam a região receberam 18% mais passageiros”, explica Pennington. O sistema deu tão certo que em fevereiro deste ano foi expandido para o dobro da área original. Para que o pedágio funcionasse por aqui, especialistas calculam que teria de ser adotado em 212 quilômetros de vias centrais ao custo de, no máximo, 2 reais para os motoristas. A cobrança seria feita por meio de etiquetas eletrônicas – nos moldes do sistema Sem Parar – e geraria uma arrecadação de cerca de 700 milhões de reais por ano. “O centro de São Paulo é bem servido por linhas de metrô, que poderiam transportar os motoristas vindos dos carros”, diz o engenheiro de tráfego Francisco Moreno Neto. Antigo defensor do “pague e rode”, o presidente da CET, Roberto Scaringella, garante que o pedágio não está nos planos da atual gestão municipal. “Foi uma determinação do prefeito”, afirma. Essa decisão contraria as próprias recomendações do Plano Integrado de Transportes Urbanos, o Pitu 2025, que prevê a cobrança para aliviar os congestionamentos e financiar melhorias no transporte público da região metropolitana. – Tirar da rua os carros em más condições. Não, eles não têm o direito de colocar vidas em risco. Nem de contribuir para o caos na cidade. Das 800 ocorrências que a CET atende diariamente, 460 são causadas por veículos quebrados que entopem as ruas de São Paulo. O bloqueio de uma única faixa na Marginal Tietê por apenas quinze minutos gera, em média, 3 quilômetros de fila. Segundo o Departamento Nacional de Trânsito, cerca de 73% da frota tem mais de dez anos de idade. Os carros velhos e malconservados são os mais propensos a apresentar avarias. Como muitos não reúnem as mínimas condições de segurança, representam um perigo real para outros motoristas e pedestres. Boa parte não passa por avaliações periódicas. Foi o que concluiu o site automotivo WebMotors depois de inspecionar gratuitamente 709 veículos em parceria com seguradoras. Todos os automóveis foram reprovados no teste por apresentar pelo menos um problema mecânico. Para piorar, 37% deles emitiam mais poluentes do que o previsto pela fábrica. “Esses carros atrapalham o tráfego, contaminam o ar e ainda podem causar acidentes”, diz o engenheiro de segurança veicular Alexandre Benedito Novaes, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O meio de retirá-los de circulação ou obrigar seus proprietários a consertá-los chama-se Inspeção Técnica Veicular, prevista desde 1997, quando foi lançado o novo Código de Trânsito Brasileiro. Um projeto de lei que a torna obrigatória aguarda desde 2001 a aprovação da Câmara dos Deputados. Não está sequer na pauta de votações. Caso a inspeção fosse instituída, o governo não gastaria nada com ela. Os motoristas arcariam com seus custos. “Donos de carros de passeio gastariam de 20 a 50 reais por ano”, afirma Novaes. Países europeus que hoje vistoriam suas frotas regularmente conseguiram reduzir os acidentes em 5 a 10%. A Cidade do México derrubou as emissões de poluentes em 30%. Um dos bons efeitos colaterais é que o tráfego passa a fluir melhor com a saída dos veículos não aprovados na inspeção. “Em São Paulo, cerca de 30% dos automóveis, que não têm condições de circular, deixariam as ruas”, estima Alan Cannell, engenheiro especialista em segurança viária. Controle de tráfego automatizado – Se saíssem às ruas ao mesmo tempo, os 5,6 milhões de veículos da capital precisariam de 22.000 quilômetros de vias para se acomodar. Colocar toda essa frota nos atuais 16.000 quilômetros de malha viária de São Paulo desafia qualquer princípio da física. A solução de abrir grandes ruas e avenidas, além de cara, é um convite para que mais carros preencham os novos espaços, aumentando os engarrafamentos. Metrópoles do mundo todo perceberam que a única saída é administrar melhor o espaço disponível, investindo em tecnologia. “Se os 1.500 quilômetros de ruas por onde circulam 70% dos veículos fossem monitorados, o alívio já seria grande”, diz o engenheiro de tráfego Chequer Jabour Chequer, especialista em ITS, sigla em inglês para sistema de transporte inteligente. E isso não significa apenas consertar os 1.040 dos 1.300 semáforos inteligentes que estão quebrados. Com a ajuda de sensores, tais equipamentos calculam o tempo de abertura e fechamento de acordo com as condições das ruas e avenidas. Para começar a derrubar as médias de congestionamento, calcula-se que seriam necessários outros 1.300 semáforos high-tech. Mas pouco adianta ter sinais com QI se um carro quebrado bloqueia a rua e a central da CET não consegue detectá-lo. É aí que entram as câmeras de TV, que flagram obstáculos e infrações e ajudam a CET a atender mais rapidamente acidentes, carros quebrados e veículos estacionados irregularmente. Hoje, só 45 das 151 câmeras espalhadas pela cidade funcionam. É preciso, pelo menos, que todas voltem à ativa. A instalação de outras 350 garantiria que as principais ruas da cidade fossem vigiadas. Motoristas poderiam ser alertados sobre as condições do tráfego por meio de painéis com mensagens variáveis. Semáforos, câmeras e painéis custariam à prefeitura cerca de 200 milhões de reais. Uma nova lei deve reforçar o monitoramento. Sancionado pelo Contran em novembro do ano passado, o Sistema Nacional de Identificação Automática de Veículos (Siniav) obriga toda a frota brasileira a ser equipada com chips eletrônicos de controle. As utilidades da tecnologia vão além da identificação de carros roubados. Como o sensor informa a velocidade, a CET poderá, por exemplo, identificar os carros que invadem corredores de ônibus, burlam o rodízio e rodam irregularmente. “Seria uma revolução no controle de tráfego”, diz Scaringella. “É por isso que queremos nos tornar a primeira cidade brasileira a implantar o sistema.” A idéia é bancar os chips com a arrecadação de multas. Segundo cálculos do Denatran, eles devem custar em média 20 reais por veículo. Para equipar toda a frota, a cidade gastaria em torno de 112 milhões de reais. Disciplinar a circulação dos caminhões Os já saturados 16 000 quilômetros de vias paulistanas recebem todo dia 230.000 caminhões – 180.000 trafegam nas marginais e 20.000 estão só de passagem pela cidade. Segundo a CET, a cada três horas um deles quebra e pára o trânsito. Embora representem apenas 4,5% da frota que transita pela capital, os caminhões são responsáveis por 35% dos congestionamentos, de acordo com dados do Sindicato das Empresas de Transporte de Carga (Setcesp). Ou seja, é essencial disciplinar com todo o rigor sua circulação. O que precisa ser feito: Terminar o trecho sul do Rodoanel – Seus 57 quilômetros estariam ligados aos 32 quilômetros já existentes do trecho oeste, cruzariam as rodovias dos Imigrantes e Anchieta e permitiriam o escoamento de cargas para o Porto de Santos. Simulações da Secretaria Estadual dos Transportes apontam que a Marginal Pinheiros ficaria livre de 43% dos veículos pesados que nela circulam. Na Avenida dos Bandeirantes, a diminuição seria da ordem de 40%. Dados da CET indicam que o trânsito de carga nas marginais Tietê e Pinheiros foi reduzido em 20% após a inauguração do trecho oeste, em 2002, o que aliviou também a Avenida Francisco Morato. Orçado em 3,5 bilhões de reais, o trecho sul do Rodoanel deve ficar pronto até 2010. O estado deve investir 250 milhões de reais por ano e o governo federal, outros 79 milhões. O restante ficaria a cargo de concessionárias que cobrariam pedágio para financiar a obra. Construir centros de distribuição na periferia. Com o Rodoanel pronto, a idéia é que a iniciativa privada construa centros de distribuição em seu entorno, como acontece em cidades européias, entre elas Londres, Lisboa e Roma. Carretas vindas dos portos ou do interior desembarcariam a carga nessas plataformas. A mercadoria entraria na cidade em veículos menores, que não atrapalham tanto o trânsito. “Para algumas empresas, o custo da construção desses centros seria compensado pela economia de tempo e dinheiro nas entregas”, diz o consultor em logística Antonio Carlos Rezende. Proibir a carga e descarga durante o dia em grandes estabelecimentos – Desde abril de 2005 vigora na cidade um decreto que proíbe a operação de carga e descarga em 2 345 shoppings, supermercados e estabelecimentos de grande porte das 6 às 22 horas, em toda a cidade. O objetivo é aproveitar a madrugada para fazer entregas. Mas a lei é ineficaz: só atinge 3% da frota e permite que os comerciantes recebam mercadorias durante o dia se forem entregues por pequenos caminhões de até 5,5 metros de extensão. “Isso acabou desestimulando a entrega noturna”, diz Fernando Abrahão Zerati, assessor técnico do Setcesp. Até o fim de fevereiro, apenas uma empresa tinha sido multada por descumprir a lei. A solução é mudar a legislação para proibir que os grandes estabelecimentos recebam mercadorias durante o dia, com qualquer tipo de veículo. Criar faixas exclusivas na Avenida dos Bandeirantes – A implantação de um corredor para os 28.000 caminhões que passam por ali – boa parte rumo ao litoral – poderia reduzir de 12 para 6 quilômetros a lentidão média diária. Seriam usadas as duas faixas mais à esquerda de cada sentido. A velocidade média deve subir dos atuais 20 quilômetros por hora para 35 quilômetros por hora. Outro impacto da obra seria a economia anual de cerca de 70 milhões de reais com combustível. A nova Bandeirantes já está nos planos da prefeitura e o orçamento deste ano destina 30 milhões de reais para a obra (de um total de 200 milhões de reais necessários). Só falta tirar do papel.