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A jornada de um jovem empreendedor afegão na capital paulista

Há apenas um ano no Brasil, Esmatullah Mohsini já domina o português, conquistou uma família brasileira e desenvolveu uma linha própria de bolsas

Por Débora Lopes
10 nov 2023, 06h00
O afegão Esmatullah Mohsini em sua fábrica de bolsas (Leo Martins/Veja SP)
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Durante o voo para o Brasil, o costureiro afegão Esmatullah Mohsini, 19, pediu a Deus uma nova oportunidade. Nesse momento, ele deixava para trás a vida em sua cidade de origem, Gázni, no interior do Afeganistão. Lá, o jovem trocou os estudos pelo trabalho pesado para ajudar no sustento da família. Mas a situação ficou ainda mais difícil em agosto de 2021, quando o movimento fundamentalista Talibã retomou o poder, violando direitos humanos e intensificando a insegurança alimentar. Esmat, como é chamado no Brasil, relembra os bombardeios sofridos em sua região e a perseguição política que culminou na morte de parentes.

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Com um português surpreendente para quem não era alfabetizado e vive no país há apenas um ano, ele conta que começou a trabalhar como costureiro aos 12 anos. Aos 15, ele e o pai se mudaram para o Irã. “Eu trabalhei das 8 horas da manhã até às 2 da madrugada durante quatro anos. Meus pais não sabiam que eu trabalhava isso tudo. Nunca falei. Nunca quis minha família triste.”

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Com a possibilidade de tirar o visto humanitário para o Brasil, não pensou duas vezes. Desembarcou no Aeroporto de Guarulhos em setembro de 2022. Passou dois meses morando no Terminal 2 ao lado de 250 afegãos na mesma situação. “Fiquei dez, quinze dias sem tomar banho”, relembra. Foi, inclusive, a falta de assepsia que acabou provocando uma proliferação de sarna entre os imigrantes.

No aeroporto, ele conheceu o casal de voluntários Charles Henrique Moreira, 47, e Sheila Chainho, 49, ambos representantes comerciais. Eles conversavam por um aplicativo de tradução. “Ensinei ele a falar ‘Vai, Corinthians!’”, brinca Charles. Até que, em dado momento, Esmat perguntou se ele tinha filhos. A resposta foi negativa. “Ele falou assim: ‘Deixa eu ser seu filho’. Eu perdi o fôlego”, relembra Charles. 

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Esmat
Esmat com os pais brasileiros, Sheila e Charles, celebrando seu aniversário de 19 anos (Arquivo pessoal/Reprodução)

A condição imposta pela família era de que ele só estudasse, sem trabalhar. “O Esmat era um menininho e hoje ele é um homenzinho. Ele luta muay thai, vai para a academia, já está brasileirinho”, revela a mãe, orgulhosa.

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O jovem afegão fez outros dois cursos de português. Depois, convenceu os pais brasileiros que precisava voltar a trabalhar para ajudar a família biológica que está no Irã. Foi aí que ganhou uma máquina de costura, passou a desenvolver suas próprias bolsas e criou a marca Esmat Wear. Sheila explica que quer torná-lo um empreendedor. “Se ele for trabalhar no Brás, vai ganhar 1 500 reais por mês.”

O jovem será um dos expositores da 28ª edição da Festa do Imigrante, que acontece entre os dias 17 e 20 de novembro no Museu da Imigração, na Mooca. O evento reúne gastronomia, dança e artesanato de mais de 55 países. “Nossa grande missão é estimular esses encontros da pluralidade, da multiplicidade, da diversidade”, aponta Marilia Marton, secretária de Cultura e Economia Criativa.

Esmat é uma história de sucesso entre tantas outras de imigrantes. De setembro de 2021 a abril de 2023, 6 417 afegãos chegaram ao país, segundo o Observatório de Migrações Internacionais (OBMigra). Os números apontam que 31% deles moram em São Paulo.

Recentemente, houve uma mudança na portaria que concedia aos afegãos o visto humanitário. “Nesse momento, os vistos não estão acontecendo”, explica Ana Paula Pinhati Oliveira, vice-presidente da Arro (Organização de Resgate de Refugiados Afegãos). “Histórias como a do Esmat só são possíveis com esse visto, que é tão importante para que eles possam ter uma chance.”

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Publicado em VEJA São Paulo de 10 de novembro de 2023, edição nº 2867

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