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Precisamos de equipamentos na periferia e continuidade no esporte, diz Tiago Camilo

Medalhista olímpico que agora comanda o Centro Olímpico da prefeitura afirma que “enxugam gelo” no setor e que os orçamentos são “ridículos”

Por Guilherme Queiroz
Atualizado em 27 Maio 2024, 20h40 - Publicado em 26 fev 2021, 02h00
Tiago, com uma camisa da prefeitura, sorrindo para a foto
Tiago Camilo, campeão mundial de judô em 2007 e prata em Sydney em 2000: diretor do Centro Olímpico, espaço de 50 000 metros quadrados na Zona Sul para treinamento de atletas de base de alto rendimento (Guilherme Guidetti/Seme/Divulgação)
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Medalhista olímpico, Tiago Camilo, 38, acaba de assumir o Departamento de Gestão do Esporte de Alto Rendimento da secretaria municipal e vai comandar o Centro Olímpico da prefeitura. Diz que “enxugam gelo” no setor, porque não há continuação de programas, e afirma que os orçamentos são “ridículos” e que há paulistanos com chance em Tóquio

Você já apontou a dificuldade para os atletas das categorias de base chegarem até o adulto. O Centro Olímpico que agora dirige é focado em crianças e adolescentes. Como melhorar o cenário?

Nós cumprimos duas funções importantes: uma é o rendimento. Somos um centro olímpico e queremos deixar isso claro para os atletas. Também tentamos cumprir uma função social. Muitos não sabem que o Centro existe. Então há um trabalho de fomentar o esporte nas comunidades. O meu papel é construir esse processo. A gente tem de entregar a Rede Olímpica (núcleos espalhados pela cidade), que faz parte dos planos da Secretaria de Esportes: estruturar o caminho, os polos nas periferias e depois dar encaminhamento. Vamos implementar as modalidades (esportivas) nesses locais com a metodologia do Centro, e mais para a frente a criança poderá ser direcionada para o Centro Olímpico.

Em uma cidade do tamanho de São Paulo, um único equipamento para alto rendimento, na região central, é o suficiente?

Não é. O atleta pega ônibus, leva duas, três horas para chegar ao Centro Olímpico todo dia. E é por isso que precisamos dos equipamentos periféricos. A gente tem de brigar por orçamento, fazer com que o prefeito, os políticos, entendam o esporte como política pública. E ter continuidade: você não pode começar e dois anos depois parar. O impacto é grande: você coloca uma criança (para treinar), ela tem esperança, começa a sonhar e você tira. Ela nunca mais volta para o esporte.

O poder público poderia atuar mais no esporte?

A rede pública entende o esporte como um gasto, e na verdade é um investimento. Os orçamentos do esporte são pequenos, ridículos. Ficamos sempre enxugando gelo, nunca temos um programa estruturado.

E como é isso em São Paulo, para gerir o Centro Olímpico e o setor de Esportes de alto Rendimento?

Foi um choque quando cheguei. O último investimento no Centro foi em 2009, quando a Magic Paula foi gestora. Os equipamentos vão se deteriorando, são quase 900 atletas por dia. São duas frentes de trabalho: primeiro, melhorar os equipamentos. Quando você tem um material debilitado, acaba prejudicando a segurança dos atletas. Outra questão são as contratações. Temos 46 colaboradores, e cerca de 24 são voluntários, um grande problema. A gente precisa também de mais 45 colaboradores, dobrar o quadro. O secretário (de Esportes e Lazer) Thiago (Milhim) se mostrou à disposição de pleitear esses recursos com o prefeito. Então agora vai ficar um trabalho nosso de convencer a cidade a investir: é o único equipamento do tipo em São Paulo. Se falamos de Olimpíada, a gente precisa treinar em um certo nível. Americanos, alemães, japoneses estão treinando com os melhores equipamentos. Nós temos atletas com chance de ir para os Jogos, então precisam de igualdade de estrutura.

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O Centro da prefeitura treina crianças e adolescentes de dez modalidades e as inscreve em campeonatos nacionais e internacionais. Apesar do “olímpico” no nome, é comum ver jovens chegarem até os Jogos?

É uma loteria. O alto rendimento às vezes é injusto. Você se dedica uma vida inteira ao esporte e pode acabar nem participando dos Jogos. Para que os atletas atinjam suas potencialidades, temos de dar estrutura. Depois, é uma questão muito individual, de quanto ele quer se dedicar e o preço que quer pagar por aquilo. Há atletas com potencial de Olimpíada, temos quem pode chegar lá e atletas que não vão chegar. Mas qual a ideia? Que os valores olímpicos estejam nas crianças e elas saiam melhores do que chegaram.

Quantos dos paulistanos que treinam com vocês têm chance real de medalha olímpica?

Temos um nome muito forte, a Christal (Bezerra, 16 anos). Ela é da ginástica artística, supertalentosa. Se não estiver em Tóquio, certamente estará em Paris. No futebol feminino, muitas atletas da seleção brasileira foram formadas no Centro Olímpico. Temos atletas da luta olímpica. Aline Silva saiu do Centro Olímpico.

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Quantos alunos o Centro pode receber?

Agora são em torno de 800, por causa da pandemia. Mas ali é para ter 1 000 rodando. Daria para ter mais? Sim. Desde que tenha contratação (de colaboradores).

“Os atletas falaram muito do Ibirapuera. E o Parque Olímpico, como está? Por que a gente não está no Rio brigando por isso? Eu fui lá recentemente e quase chorei”

Você acabou de chegar. Que modalidade tem a melhor infraestrutura e qual carece de investimento?

As melhores são o atletismo e a piscina (natação). O maior investimento precisa ser na ginástica e nas quadras, basquete, vôlei, handebol.

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Muito se tem falado sobre o projeto do governo estadual para o vizinho do Centro Olímpico, o Complexo do Ibirapuera. Você é a favor do plano?

É uma discussão profunda. Estamos falando de um equipamento defasado, a estrutura é ruim, precisamos de uma reforma geral no Conjunto Constâncio Vaz Guimarães. Sou do interior e quando vim para São Paulo, em 1997, morei no alojamento, tenho um carinho enorme por aquilo. Sou contra algumas coisas, como ter shopping ali. Mas sou a favor da reestruturação e de manter as atividades esportivas. Algumas coisas têm de ser respeitadas, a história do esporte paulistano. Pelo que me falaram, o ginásio vai ser mantido, haverá outras quadras fora também, que vão ficar no anexo ali. Os atletas falaram muito do Ibirapuera. E o Parque Olímpico, como está? E os outros equipamentos do legado olímpico? Estão todos sucateados. E por que a gente não está lá no Rio brigando por isso? Não fizemos o mesmo para defender o legado olímpico. Eu fui lá recentemente e quase chorei. Aquilo tinha de estar cheio de criança, com atividade o tempo inteiro.

Depois de um adiamento histórico, a Olimpíada de Tóquio deve ser entre julho e agosto. Como ex-atleta, você acha possível, na pandemia, manter o nível necessário para a competição?

Todos foram impactados por falta de espaço, treinamento. Existe essa preocupação com o nível que será alcançado em Tóquio.

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Como se sentiria se fosse na sua vez?

É difícil. Vários atletas estão em situações diferentes. Você tem alguns no seu último ciclo (de alta performance), outros que atingiram o índice (necessário para a Olimpíada) no ano passado, mas em 2021 podem não atingir. Ficaria preocupado e triste: é o sonho.

Cada vez mais em alta, o skate vai estrear em Tóquio. A modalidade será incluída no Centro Olímpico?

Está no nosso radar. Nós vamos implementar novas modalidades no Centro. O vôlei de praia está finalizando as obras. Estamos encaixando BMX para fazer a inauguração da pista. Para levantamento de peso, um espaço está sendo reformado. São obras antigas, quando cheguei estavam sendo entregues. Só o skate ainda estamos estruturando melhor. Temos um estudo de viabilidade em outro espaço, no (Parque do) Chuvisco (Zona Sul). De repente, ter uma pista no Centro, mas essa está nova, então poderíamos começar ali.

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Publicado em VEJA São Paulo de 03 de março de 2021, edição nº 2727

 

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