Polícia só esclarece 4% dos furtos por ano em São Paulo
Para especialistas, investimento em tecnologia, informação e inteligência melhoram trabalho; segundo delegado, há monitoramento qualitativo de casos
O governo vem apostando em mais policiais nas ruas para aumentar as prisões e diminuir a sensação de insegurança — a capital fechou 2022 com o maior número de furtos em vinte anos. Porém a segurança pública do estado que mais prende no país esbarra em um desafio histórico: o baixo índice de esclarecimento de crimes. Entre 2012 e 2022, a Polícia Civil de São Paulo nunca solucionou mais de 5% dos furtos e roubos por ano. A instituição considera um crime resolvido quando alguém é indiciado.
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Segundo dados obtidos via Lei de Acesso à Informação, em 2022 o estado somou 657 852 furtos, mas a Polícia Civil só esclareceu 13 023 casos, menos de 2%. Em 2019, pré-pandemia, ocorreram 612 819 furtos, e destes foram esclarecidos 24 669, uma taxa de 4%. Já em relação aos roubos, em 2012 o estado chegou a solucionar 5,5% dos casos, mas em 2022 foram apenas 2%.
Também costumam ficar sem resposta no estado os homicídios: em 2022, foram 753 solucionados entre os 2 909 registrados. Em 2019, foram resolvidos 50%. Estudo do Instituto Sou da Paz mostra esclarecimento de 34% em 2019, semelhante à taxa nacional. O estudo considera solucionado o crime que gerou denúncia do Ministério Público.
Carolina Ricardo, diretora-executiva do instituto, aponta que a falta de resposta do estado gera sensação de impunidade e desconfiança no sistema de Justiça. “Em muitos lugares uma mesma pessoa mata muita gente, então se você a tira de circulação, reduz o crime e mostra que o estado está dando uma resposta adequada. No caso de furtos e roubos, é possível descobrir se um grupo organizado comete o crime, e o estado consegue direcionar esforços para tirar de circulação os cabeças. Investimento em tecnologia, informação e inteligência permitem um melhor trabalho e impactam na redução criminal.”
Para o ex-secretário nacional de Segurança Pública e coronel da reserva da PM José Vicente da Silva, na prática a resolução é ainda mais baixa porque há uma subnotificação de furtos e roubos. “Todos os DPs precisam ter capacidade de resposta investigativa, não somente fazer registro. É importante observar os principais crimes e criminosos em cada distrito.”
O delegado Daniel Borgues, da 1ª Delegacia Seccional do Centro, afirma que houve “um aumento de delitos ao longo de 2022, que acabou causando uma disparidade no número de casos e esclarecimentos”. Ele diz que a Polícia Civil faz um “monitoramento qualitativo” dos esclarecimentos em todas as unidades. “Além da taxa, nós cobramos aqueles esclarecimentos qualitativos, grandes roubos e furtos, crime de homicídio e latrocínio. Quando você separa aquele furto de documento ou de celular, que na verdade a pessoa extraviou aquele celular, a estatística muda. Não podemos utilizar essa taxa para dizer que é o número de esclarecimentos que a polícia faz, não é a realidade.”
Publicado em VEJA São Paulo de 17 de maio de 2023, edição nº 2841