“Não dá para ficar no meio da rua correndo atrás das pessoas”
Luiz Carlos Zamarco defende levar dependentes químicos para a delegacia e, com ajuda da família, encaminhá-los para internação involuntária
Promessa antiga de todos os recentes governantes paulistas e paulistanos, a erradicação da Cracolândia, no centro, ganhou novos capítulos há duas semanas, quando a Polícia Civil e a prefeitura expulsaram os usuários de drogas da Praça Princesa Isabel, no centro. Dessa vez, a ideia de conduzir os dependentes químicos para a delegacia e, de lá, para um tratamento, com o aval da família, é a saída proposta.
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“Estamos há muito tempo no convencimento, mas não está resolvendo”, afirma Luiz Carlos Zamarco, que assumiu a pasta da Saúde depois que o titular, Edson Aparecido, anunciou sua saída para possivelmente concorrer como vice na chapa de Rodrigo Garcia (PSDB) nas eleições de outubro. Alvo de críticas pela ideia, o médico de carreira da gestão municipal diz que ninguém ficará preso caso não seja levado para uma clínica.
A ideia de levar usuários de drogas da Cracolândia para o distrito policial é vista por críticos como uma pré-internação compulsória, o que seria ilegal. O senhor acredita que essa iniciativa prospere?
A gente já faz esse trabalho de convencimento nas ruas. A diferença agora é que faremos uma conversa na delegacia, tentar convencê-los a ir para um CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) e oferecer tratamento.
Como vai ser esse convencimento na delegacia?
Vamos chamar os parentes próximos e dizer: “Ou você vai cuidar desse familiar ou vai permitir que a gente interne para cuidar”. A família vai participar desse processo.
Mas, se é a família quem vai decidir, por que não levar o dependente químico para um local mais acolhedor, como uma unidade de saúde, não para uma delegacia?
Pensamos nessa possibilidade. Mas o pessoal dos direitos humanos iria falar que estamos internando compulsoriamente, sem seguir os trâmites legais. Há várias pessoas para criticar, mas ninguém tem uma proposta melhor. Você pode criticar, mas o que propõe de diferente? A gente está tentando fazer dentro das normas. Ninguém está fazendo nenhum tipo de agressão. Estamos há muito tempo no convencimento, mas não está resolvendo. Não dá para ficar no meio da rua correndo atrás das pessoas.
E se na delegacia o usuário não quiser ser internado, ele vai ser preso?
Ele vai embora, não vai ficar preso.
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Como está a pandemia de coronavírus na cidade? O clima é muitas vezes de que já acabou, mas ainda morrem em média 100 pessoas por dia no Brasil. E na capital?
A pandemia na cidade está controlada. Temos hoje 175 leitos de UTI (destinados a coronavírus) e temos uma taxa de ocupação de no máximo 18%. Desses 175, nos dias em que há maiores ocupações chegamos a trinta pessoas. E temos 296 leitos de enfermaria, com taxa de ocupação de 12%.
E os índices de vacinação de todas as faixas etárias, como estão nesta semana?
A gente acredita que tudo tenha acontecido por causa da adesão forte à vacinação. Temos 31 milhões de doses aplicadas, atingindo 100% da primeira e segunda doses. A terceira estamos acima de 75%. Sobre a quarta, vacinamos 58% dos pacientes acima dos 60 anos.
É pouco esse índice de 58%, não?
Enfatizamos a importância para tomar a quarta dose. À medida que as pessoas vão percebendo que não tem internação e gravidade, há a tendência de relaxamento.
Há a chance de repiques de casos de Covid-19 e qual a expectativa de casos de influenza agora com a chegada do frio?
Da Covid a gente não espera repique por causa da cobertura vacinal. Sobre a influenza, que é importante, estamos fazendo campanha para que a vacinação tenha uma boa adesão. Estamos com 1,2 milhão de doses, abaixo da nossa expectativa. A meta é sempre 95% do público-alvo. Só a população de crianças na cidade é de 1 milhão. Poderíamos estar um pouco melhor, sim.
Não só para influenza que os índices vacinais estão abaixo da meta. As vacinas contra doenças infantis também não atingem a meta em todo o Brasil e aqui na capital não é diferente. Por quê?
As crianças já tinham adesão não satisfatória. Durante a pandemia, as pessoas ficaram um pouco receosas de procurar os serviços de saúde. E tem o problema do sarampo, teve caso confirmado. O vírus está circulando. Temos feito campanha para conscientizar a população.
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E os casos da hepatite misteriosa na capital, o que já se sabe?
O estado está seguindo isso. Tivemos no Hospital das Clínicas um caso de transplante (de fígado) em criança. Há três casos de crianças sendo investigados. Teve caso em uma criança de 3 anos que não dá para associar a nada. Não sabemos com o que estamos lidando. A evolução é muito rápida.
Há um sinal de alerta? Quais os sintomas?
Não tem o que fazer. Fizemos alerta aos departamentos de emergência sobre os sintomas: vômito, diarreia e febre são os primeiros sintomas. Falamos para os médicos ficarem atentos a esses sintomas e não acharem que é uma simples virose. Tem de falar com a família, ver se a urina está escura, por exemplo.
Dois anos depois da pandemia, a fila de exames e consultas na rede pública municipal só aumenta. Há relatos também de falta de remédios. Quando a prefeitura vai equacionar as demandas?
Estamos ampliando os atendimentos nos hospitais-dia para diminuir as filas de cirurgias. Antes da pandemia eram 150 000 pessoas na fila, o que só aumentou nos últimos dois anos. Já operamos 54 000 pessoas e agora estamos com 160 000 pessoas aguardando. Sobre os remédios, as faltas que ocorrem são por ausência dos insumos no mercado. Faltou dipirona em todos os lugares, não só aqui na prefeitura. A gente tem todas as compras regulares sendo feitas.
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Publicado em VEJA São Paulo de 25 de maio de 2022, edição nº 2790