Um amigo me convidou para almoçar. Combinamos o restaurante.Chegou
animado.
– Há quanto tempo a gente não se vê! A conversa foi ótima. Insistiu:
– Saia do regime! Vamos pedir uma sobremesa! Veio a conta.
– Hoje é minha! – avisou.
Estranhei. Abrir a carteira não é com ele. Seria um milagre, diante dos meus olhos? Observou os cartões de crédito, desanimado.
– Esqueci as senhas.Vamos ver se meu dinheiro dá, achei que a conta seria menor. Obviamente, não deu. Era truque. Pensei em chamar a polícia. Dizer que fora convidado para almoçar e agora levava o calote. Rangendo os dentes, paguei com meu cartão. Fomos passear no shopping. Dois outros amigos se agregaram a nós.
– Vamos torrar dinheiro? – perguntou ele, indicando um endereço famoso pelos cremes, sabonetes e perfumes importados. Ingenuamente, concluí que ele havia emprestado dinheiro de algum dos outros, que tinham decidido cortar os cabelos. Ele escolheu vários cremes e sabonetes.
– Este aqui, de amêndoas, é ótimo. Experimente – insistiu.
Deliciado diante da uma compra monumental, o vendedor espalhou não só o de amêndoas, mas vários tipos de creme nas minhas mãos, no pescoço, no nariz. Meu amigo revelou:
– Faço questão de oferecer de presente para você.
O vendedor montou duas pirâmides: a minha e a dele. O pão-duro sacou a carteira. E repetiu a cantilena.
– Não lembro a senha dos cartões. Veja se meu dinheiro dá. Arrepiei. Se era insuficiente para um almoço, como abarcar o lote de importados? Contas feitas, ele me encarou com ar de cachorro sem dono.
– Não dá.
Só então percebi o truque: eu é que pagaria! Se ele estava sendo tão generoso em me presentear, como não agir da mesma maneira? Fiz cara de paisagem.
– Ah, que pena… Amanhã você dá um jeito e volta aqui. O vendedor quase começou a chorar. Ele concordou.
– É, se não há outro jeito…
– E não se esqueça dos que ia me dar de presente – lembrei, venenosamente.
– Vai ganhar a linha completa! Amanhã deixo na sua casa!
Nunca mais tocou no assunto. Conheço uma senhora especializada no truque do restaurante. Marca um encontro em um lugar caro. Deita e rola! Na hora da dolorosa, refugia-se no toalete. A conta vem. O tempo passa. O garçom rodeia a mesa. Finalmente, pago. Fazer o quê? Invadir o toalete atrás dela? Outro conhecido comparecia com o cartão vencido. No momento de dividir, surpreendia-se:
– Ih, nem reparei. O cartão expirou! Impossível manter as boas maneiras:
– Essa você já contou na semana passada. Inventa outra. Nada me dá mais raiva do que presente de pão-duro.
– É só uma lembrancinha…
– Achei que esta caixinha de papelão tinha a sua cara!
– Trouxe este sabonetinho… Depois te dou coisa melhor. Presente para mim é algo escolhido com sentimento, seja caro ou barato. Melhor não ganhar nada do que ouvir desculpa. Pior é receber hóspede incapaz de comprar um refrigerante. Durante um ano, um conhecido recebeu um amigo do interior, aluno de um curso de fim de semana. Jamais contribuiu com um pãozinho francês. Ainda reclamava:
-O almoço está demorando! Tenho aula!
O pão-duro jamais tem trocado para o táxi, mas exige centavos do troco. Ou recicla presente ou estoca sacolas de grife para enfiar camisetas de camelô e fazer bonito. Um pão-duro pode ter qualidades que valham a amizade. Mas já decidi: em truque não caio mais. Se alguém escapar para o toalete na hora da conta, vou também. Se for preciso, fujo pela janela!