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Mulher que ficou presa com recém-nascido deixa penitenciária

Jessica Monteiro, de 24 anos, foi presa, deu à luz e retornou à cela de dois metros quadrados com o filho de dois dias de vida

Por Estadão Conteúdo
17 fev 2018, 18h18
Jessica Monteiro, de 24 anos, foi presa, deu à luz e retornou à cela de dois metros quadrados com o filho de dois dias de vida (Reprodução/Veja SP)
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A jovem que foi presa por tráfico de drogas e permaneceu com o bebê recém-nascido em uma cela no centro de São Paulo saiu da Penitenciária Feminina de Santana, na zona norte, na noite desta sexta-feira, 16.  A soltura de Jéssica Monteiro, de 24 anos, ocorreu após o pedido de habeas corpus ser aceito pelo juiz Carlos Bueno, da 10ª Câmara de Direito Criminal. Ela vai cumprir prisão domiciliar.

Jessica foi detida grávida há uma semana, no sábado, dia 10, e encaminhada à carceragem do 8º Distrito Policial (Brás). Ela saiu para dar à luz em um hospital no dia seguinte, no domingo, 11, e retornou dois dias depois com o bebê recém-nascido para a mesma cela de dois metros quadrados. Lá, permaneceu mais dois dias, quando foi transferida para a  Penitenciária Feminina de Santana, na zona norte de São Paulo.

Na decisão, Bueno pede a soltura imediata da mulher argumentando que o recém-nascido “necessita de sua efetiva assistência, ao que consta impossível ou difícil de ser prestada no presídio”. O juiz justifica que a libertação de Jessica, ré primária, “encontra amparo legal, jurídico e humanitário”.

Para o advogado especializado em direitos humanos Ariel de Castro, que acompanha o caso, a decisão da Justiça resgata “um pouco da dignididade violada” de Jessica e seu filho recém-nascido.

“Prevaleceu o bom senso e o ideal de justiça. Esperamos que esse precedente possa se estender a outros casos análogos. A partir de um caso emblemático como o dela, podemos ter mudanças significativas visando a efetivação dos direitos humanos e a proteção integral de crianças e adolescentes. Qualquer estabelecimento prisional é um ambiente inóspito e inadequado para o desenvolvimento de crianças, principalmente de recém-nascidos”, diz Alves.

Segundo o advogado, a mulher estava na maternidade da penitenciária com outras 37 presas também acompanhadas dos filhos. No total, há 450 mulheres na unidade.

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De acordo com a polícia, a jovem foi presa com 98 gramas de maconha. Na manhã de domingo, 11, quando deveria ter ido à audiência de custódia, Jessica entrou em trabalho de parto e foi encaminhada para o Hospital Municipal Inácio Proença de Gouveia, na Mooca, zona leste da capital, onde deu à luz. Ela já é mãe de uma criança de 3 anos.

Na audiência, o advogado de Jessica, Paulo Henrique Guimarães Barbezane, comunicou que a detenta estava hospitalizada por trabalho de parto. O juiz Claudio Salvetti D’Angelo decidiu manter a detenção, convertendo de prisão em flagrante para preventiva.

“É evidente que a grande quantidade e diversidade de entorpecente encontrada supõe a evidenciar serem os averiguados portadores de personalidade dotada de acentuada periculosidade”, justificou D’Angelo. O juiz argumenta ainda que a prisão preventiva é necessária “para garantia da ordem pública”.

Segundo Alves, que acompanha a situação, Jessica é ré primária. Após dar à luz, Jessica foi escoltada de volta para a carceragem do 8º DP na terça-feira, 13. Na cela, permaneceu por mais dois dias com o bebê. Somente na tarde desta quarta-feira, 14, ela foi transferida para a penitenciária feminina.

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Alves, que esteve na carceragem no Brás, relatou que a situação da cela era precária. Jessica estava em um colchão no chão. De acordo com o advogado, policiais ajudaram comprando fraldas e alimentos. Ao ser transferida na tarde desta quarta, o advogado disse ter conversado rapidamente com a detenta.

“Ela estava bastante abalada, chorando muito, falando que é inocente. Disse que não é traficante. E, no momento da transferência, agradeceu”, afirma. O advogado disse que no início da próxima semana fará um relatório à Corregedoria do Tribunal de Justiça solicitando a prisão domiciliar para que Jessica possa responder em liberdade.

A Secretaria de Segurança Pública (SSP) e da Administração Penitenciária (SAP) foram questionadas sobre por que Jessica não foi encaminhada, no sábado, diretamente para uma das três penitenciárias femininas com maternidade da capital, e também o motivo pelo qual o bebê ficou na cela com a detenta.

Em nota, a SSP confirmou o retorno de Jessica à carceragem do 8º DP com o bebê de 2 dias após o parto. “Seu processo de transferência foi iniciado, sendo concluído nesta quarta-feira (14)”, informou a pasta.

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Já a SAP informou que a detenta está no pavilhão materno infantil da Penitenciária Feminina da Capital e que o local possui atendimento especializado para recém-nascidos e bebês em período de aleitamento materno.

O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) diz em nota que foi a favor da prisão cautelar por ter “requisitos legais necessários”. O MPSP afirmou ainda que a manifestação da promotoria foi acolhida pela Justiça, que decretou a prisão preventiva, da qual cabe recurso. O órgão argumenta ainda que “não há vedação legal para a prisão preventiva de pessoa gestante e há regulamentação própria para convivência do infante com a mãe, sendo que sua execução deve ficar a cargo do Poder Executivo”.

De acordo com o órgão, “o flagrante estava formalmente em ordem e se faziam presentes os requisitos dos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal”. Os artigos determinam que a prisão preventiva poderá ser decretada “como garantia da ordem pública da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria”.

Mesmo não se referindo especificamente a esse caso, também há um posicionamento geral da Defensoria Pública do Estado de que mulheres gestantes e mães com filhos de até 12 anos incompletos têm direito à substituição da prisão preventiva pela domiciliar. Isso foi estabelecido no dia 8 de março de 2016 pela Lei 13.257, conhecida como Marco Legal da Primeira Infância, que alterou o Código de Processo Penal.

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Ação

Na próxima terça-feira, 20, está marcado o julgamento, pela 2ª turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de um habeas corpus em favor de todas as presas grávidas ou mães de crianças com até 12 anos. A Defensoria Pública da União quer que as mulheres nessa situação sejam transferidas para prisão domiciliar. A decisão pode definir a aplicação do dispositivo do Estatuto da Primeira Infância, aprovado em 2006, que alterou as regras do Código Penal relativas à concessão da prisão domiciliar nessas duas situações.

O tema ganhou repercussão no ano passado quando Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, teve a prisão preventiva substituída por prisão domiciliar por ter um filho com 12 anos incompletos.

Carlos Eduardo Paz, defensor público-geral federal, diz esperar o “reconhecimento inovador” de um habeas corpus coletivo para evitar “decisões esdrúxulas e contraditórias” por cada juiz ou coletivo e garantir a celeridade das análises. “Uma vez reconhecido o habeas corpus, esse direito se torna inquestionável e situações como a dessa moça não voltem a se repetir. O que está em jogo nesses casos é a proteção das crianças”, disse.

Segundo Paz, o caso de Jéssica e muitas outras mulheres serão apresentados ao STF. “Não devemos nos ater ao mérito do crime, porque é uma questão de dignidade humana, de respeito aos direitos da criança. Temos casos de mulheres que fizeram o parto algemadas, amamentaram seus bebês separados por grades. É humanamente constrangedor.”

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Nathalie Fragoso, advogada do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (Cadhu) e uma das peticionárias que subscrevem o habeas corpus coletivo, diz que, além da prisão domiciliar, é possível pensar também em outras medidas cautelares alternativas, como a liberdade provisória.

“Precisamos enxergar que essa situação traz graves repercussões para as crianças. Nesse caso, a mãe vivenciou o final da gestação, o trabalho de parto, o primeiro contato com o filho em situações degradantes”, disse Nathalie. “E, infelizmente, esse não é isolado. É representativo do sistema carcerário brasileiro.”

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