Monumento às Bandeiras é pichado, de novo
Pela segunda vez em menos de dois meses, obra no Ibirapuera foi alvo de pichadores
Conhecido pelos paulistanos como “deixa que eu empurro”, o Monumento às Bandeiras, um dos cartões-postais da cidade, bem poderia, neste momento, ser rebatizado de “deixa que eu picho”. Em menos de dois meses, a obra do escultor modernista Victor Brecheret plantada no Ibirapuera foi alvo por duas vezes da ação de delinqüentes. É impressionante a facilidade com que criminosos conseguiram cobri-la de rabiscos. Pichar é crime previsto na lei ambiental, com penas de multa e detenção de três meses a um ano. Mas a falta de fiscalização permitiu que na sexta-feira (27) o monumento amanhecesse “assinado” por um vândalo que se intitulou Vicente. No feriado de 7 de Setembro, a escultura já havia sofrido agressão semelhante. Em plena tarde, dois adolescentes escalaram a obra – de 43 metros de comprimento, 8 de largura e 5 de altura – e pintaram de vermelho os olhos de suas estátuas. Denunciada por um motorista que passava pelo local, a dupla acabou na delegacia, até ser liberada na presença dos pais. “Esse tipo de crime é comumente punido com serviços comunitários ou com a doação de cestas básicas por parte do infrator”, diz o promotor de Justiça do Meio Ambiente de São Paulo, Carlos Alberto de Salles. “Basta ver quanto a cidade está pichada para saber que a atuação da polícia é falha.”
Dos 440 monumentos da capital, sessenta necessitam de algum tipo de restauração. Sete foram tão danificados que precisaram ser retirados do local onde estavam fixados e aguardam pelo conserto em um depósito. Com orçamento de 170 000 reais em 2006, o Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) espera terminar a revitalização de pelo menos 25 dessas obras até o fim do ano. Sai caro. Recuperar um busto de bronze, por exemplo, custa cerca de 5 000 reais aos cofres públicos. Para apagar a inscrição feita com tinta spray no Monumento às Bandeiras serão gastos pelo menos 2 000 reais. “Como se trata de uma pedra porosa, sua limpeza é mais difícil”, explica a arquiteta Rafaela Calil Bernardes, chefe do laboratório de restauro do DPH. “Ainda estamos pesquisando que tipo de solvente usar.”
Desde janeiro, a Secretaria das Subprefeituras já repintou cerca de 750 000 metros quadrados de muros cobertos por garranchos. Quinze caminhões se dedicam a esse trabalho todos os dias, a um custo mensal de 150 000 reais. Segundo levantamento realizado pela prefeitura em 2003, pelo menos 5 000 pichadores atuam em São Paulo. Esses marginais fazem parte de gangues que, agrupadas, compõem o que os adeptos do crime de conspurcar o patrimônio público ou alheio costumam chamar de grifes. O mais correto seria utilizar a palavra quadrilha. Autor de uma tese de mestrado sobre o assunto, o antropólogo Alexandre Barbosa Pereira registrou mais de 100 desses grupos. Eles competem entre si distribuindo garatujas por muros, prédios e estátuas – ganha prestígio quem consegue deixar sua marca em lugares de difícil acesso. Indecifráveis para a maior parte da população, as inscrições são feitas num alfabeto próprio e obedecem a uma hierarquia: o nome da “grife” é seguido da assinatura da gangue e da do autor. Ou seja: caso se dispusesse a investigar e prender esses bandidos, a polícia teria uma infinidade de pistas a seu dispor. Neste ano, apenas 35 inquéritos do gênero foram registrados na Delegacia do Meio Ambiente. Em 2005 foram cinqüenta e em 2004, 74. É uma pena que a diminuição no número de registros não signifique, absolutamente, que a cidade esteja mais limpa. Significa apenas, olhando-se ao redor, que o poder público se tornou mais leniente com eles – em vez de mandar prendê-los.