A recuperação de Marco Antônio de Biaggi após enfrentar um câncer
O cabeleireiro das estrelas travou no hospital uma dura batalha contra um linfoma, além de enfrentar problemas pulmonares, cardíacos e renais
Após meses internado em um hospital, alternando períodos de coma absoluto com outros de alucinações devido ao excesso de remédios, o cabeleireiro Marco Antônio de Biaggi, de 50 anos, começou a recuperar a consciência em setembro do ano passado. Estava feliz em poder falar e reconhecer as pessoas, mas levou um choque com a transformação de seu corpo. Não eram os vinte pontos no peito, aberto em razão das pontes de mamária e de safena, que mais lhe chamavam a atenção.
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Nem a traqueostomia realizada para aliviar a dificuldade de respirar, ou cateteres instalados no pescoço e no tórax, pelos quais recebia os medicamentos. Quando puxou o lençol de lado para observar as pernas, não reconheceu o que viu. Estava com 72 quilos, 20 a menos do que o normal. Suas pernas, de tão finas, fizeram-no perguntar imediatamente ao médico: “Eu vou voltar a andar?”.
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Devido à perda de tônus e de massa muscular, Biaggi não possuía forças para fazer movimentos simples. Seis enfermeiros tiveram de carregar o paciente de 1,93 metro quando ele precisou ir ao banheiro pela primeira vez, depois de retirar as sondas. Ao ficar diante de um espelho, percebeu que o efeito mais visível da quimioterapia realizada no início de 2015 para debelar um linfoma havia acabado: estava com alguns cabelos, com 3 centímetros de comprimento, e seus cílios e sobrancelhas também haviam ressurgido. Uma surpresa para quem se lembrava de ter chegado ali completamente careca. “Meu Deus, quanto tempo fiquei deitado numa cama!”, pensou na hora.
Conhecido como o cabeleireiro das estrelas da Globo e das socialites, Biaggi deu entrada no Hospital São José, na Bela Vista, em 28 de maio. Foi quando sofreu uma crise de falta de ar em seu apartamento, no Alto de Pinheiros. Na ocasião, tinha encerrado havia pouco tempo os seis ciclos de quimioterapia para vencer um tumor no sistema linfático, doença que pode destruir o órgão responsável pelas defesas do organismo. “Eu me sentia aliviado, meu corpo havia respondido bem às drogas. Não via a hora de meu cabelo voltar a crescer”, conta. Mal sabia ele o que estava por vir.
Em menos de doze horas de internação, Biaggi precisou ser entubado, devido a uma infecção pulmonar severa. Nos primeiros dias do tratamento, os antibióticos não conseguiam surtir o efeito desejado. A bateria de exames revelou outro problema: uma lesão no início da coronária esquerda. A descoberta evitou o pior. “Existia o risco de o paciente sofrer uma arritmia ou infarto e morrer a qualquer momento”, diz a cardiologista Viviane Veiga. O cabeleireiro acabou sendo submetido às pressas a uma cirurgia cardíaca. Os sustos, no entanto, não pararam por aí.
Em determinado momento, seu sangue estava com baixo índice de oxigenação (70%, quando a taxa normal é de pelo menos 90%). Os médicos chamaram a família para falar da gravidade do quadro e propor uma única alternativa: recorrer a uma máquina chamada ECMO, que funciona como um pulmão externo ao corpo. Mesmo com seu uso, a taxa de sobrevivência é menor do que 50%. Biaggi utilizou o aparelho por onze dias. Como se não bastasse, durante esse período os rins deram sinais de fraqueza e foi preciso lançar mão da hemodiálise. “Eu não me lembro de nada disso, só depois fui informado de que duas máquinas me mantiveram vivo”, afirma.
Por mais estranho que possa parecer, a essa altura do tratamento, o câncer no sistema linfático era o menor dos problemas. “Ele acabou sendo fichinha quando nos vimos diante dessas outras questões”, diz Sônia, a irmã mais velha do cabeleireiro. Ela dormiu ao lado de Biaggi todas as 139 noites em que ele ficou internado — e durante o dia dava expediente como gerente do luxuoso salão do profissional, o MG Hair, na Rua Estados Unidos.
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A via-crúcis médica começou em 25 de dezembro de 2014, quando Biaggi notou uma inflamação debaixo do braço direito (“Parecia um ovo”). Ele achou aquilo estranho e se dirigiu rapidamente a um hospital. Ali, disseram-lhe que era uma inflamação corriqueira. Depois de idas e vindas e de uma biópsia, Biaggi recebeu o diagnóstico do tumor. Durante a quimioterapia, o profissional, acostumado a cuidar das madeixas de algumas das mulheres mais lindas do país, a exemplo das atrizes Juliana Paes e Giovanna Antonelli, decidiu esconder de todos o motivo real de haver raspado o cabelo.
Católico praticante, tentou despistar a todos dizendo que a careca recém- adquirida era uma promessa pela saúde do pai, que de fato se recuperava de uma cirurgia cardíaca. Ao ver entrar no seu salão a cantora Anitta, artista com milhões de seguidores nas redes sociais, teve uma ideia para espalhar essa versão. “Pedi a ela que postasse uma foto nossa. Assim todos saberiam do meu novo visual”, lembra.
Com o avanço dos efeitos da quimioterapia, a pele de Biaggi adquiriu a cor amarelada e o inchaço característicos do tratamento. Ele também perdeu as sobrancelhas e os cílios. “Sempre tem aqueles ‘espíritos de porco’ que perguntavam diretamente se eu estava com câncer”, recorda. “Mas as clientes, em sua maioria, falavam palavras carinhosas, davam imagem de Nossa Senhora de Fátima…
Era uma forma de dizer que estavam torcendo por mim.” Toda essa especulação em torno da saúde de Biaggi acontecia dentro de um salão de beleza, o habitat para o surgimento de fofocas. “Uma maluca chegou a espalhar que havia ido ao enterro do Marco, então foi aquela loucura de gente querendo saber o nome do cemitério e perguntando em qual igreja seria a missa de sétimo dia”, lembra Sônia.
O profissional hoje faz piada dessas situações. “Nunca achei que fosse morrer, e energia negativa não pega em mim.” Na porta de seu apartamento há um enorme olho grego, e, na sala, mais de trinta imagens de Buda. “A recuperação dele tem sido animadora e rápida”, conta o oncologista Phillip Scheinberg, chefe do Serviço de Hematologia do Hospital São José. “A expectativa era que fosse andar apenas daqui a dois meses, mas ele tem respondido bem às sessões de fisioterapia.”
Biaggi deixou o hospital de cadeira de rodas e, agora, locomove-se vagarosamente com a ajuda de uma muleta. Vem adquirindo independência aos poucos. Precisa ainda de alguém para acomodá-lo no sofá, deitá-lo na cama e trocar a sua roupa. Mas já consegue comer sozinho, colocar refrigerante no próprio copo e postar as suas fotos nas redes sociais.
A saída da reclusão, aliás, começou no mundo digital. Há duas semanas, no aniversário de 82 anos de seu pai, Aparecido, ele convidou amigos e médicos — além de Viviane e Scheinberg, o neurointensivista Salomón Rojas — para jantar no restaurante português A Bela Sintra, nos Jardins. Na ocasião, postou uma foto em seu perfil no Instagram com o novo visual. “Rolou uma comoção. Recebi mais de 800 comentários de pessoas que me desejam boa sorte e dizem que me amam”, conta.
Em casa, Biaggi tem sido mimado com todo tipo de comida. “Não há restrição alimentar para o meu filho. Pelo contrário, tenho a missão de fazê-lo engordar”, diz dona Alzira, que elabora pratos como estrogonofe de filé-mignon e panqueca de carne. Ela também faz vitaminas de whey protein. “Marco odeia o sabor, mas, nessas horas, não pode escolher muito.” Bem mais agradáveis de comer são os sonhos que recebe da confeitaria do Copacabana Palace. “A Andrea Natal, diretora do hotel, venceu um câncer de mama no passado. É ela quem despacha os doces do Rio de Janeiro aqui para São Paulo.”
Ficar no apartamento tem seus momentos de tédio, ainda mais para alguém acostumado a trabalhar das 10 da manhã às 10 da noite. No fim do ano, Biaggi quis sair para ver a decoração de Natal pela cidade (“Que estava bem mixuruca por causa da crise econômica”). Ao passar pela região dos Jardins, não conteve a vontade e pediu à irmã para estacionar o carro em frente ao seu salão. Foi uma choradeira. Clientes deixaram a cadeira com o cabelo molhado e a tintura por fazer para poder vê-lo. “Não pude beijar ninguém porque os médicos pedem pouco contato neste momento de recuperação.”
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Como toda empresa ancorada na imagem de uma única pessoa, o endereço sofreu com a ausência do fundador. Ele tem 140 profissionais, entre os quais o colorista Juha Antero, que o visitou todas as manhãs no hospital. O faturamento é de aproximadamente 1 milhão de reais por mês. Mesmo que todos os funcionários dali sejam qualificados, parte da freguesia vai ao endereço para ver a estrela principal em ação. É como ir ao restaurante D.O.M. e admirar Alex Atala dando as coordenadas dentro da cozinha — faz parte do show. Biaggi admite que o salão perdeu 5% do movimento, mas alguns empregados dizem que 30% das frequentadoras teriam migrado para outros locais.
No período de internação, ocorreu uma trégua na constante batalha de egos e troca de alfinetadas entre os concorrentes. O cabeleireiro recebeu mensagens de carinho de quase todos os colegas, como Wanderley Nunes e Marcos Proença. A exceção foi Celso Kamura. Os dois não se falam desde 2005, quando Biaggi ironizou o rival em uma reportagem de VEJA SÃO PAULO. “O ‘outro’ cuida do cabelo da Angélica, mas quem a deixa linda nas revistas sou eu”, declarou.
Parte do magnetismo exercido pela personalidade de Biaggi é explicada pela amiga e cliente Marina Ruy Barbosa. “Tinha o sonho de ser arrumada por ele”, conta a atriz de 20 anos. “Eu o conheci aos 15, e ele marcou minha transição de menina para mulher. Aliás, ninguém deixa alguém tão seguro de si quanto ele.” No extenso currículo do profissional consta a produção de mais de 1 000 capas de revista.
Desses trabalhos, nasceram relações íntimas de amizade. Em 1995, virou unha e cutícula com Adriane Galisteu. Na ocasião, cuidou do visual da apresentadora antes de um ensaio para a capa de PLAYBOY. “Com a tesoura na mão, Marco é perfeccionista e rápido”, elogia a loira. “Como amigo, escuta, guarda segredo e está presente nas horas em que mais precisamos.”
Ela foi a única celebridade a visitá-lo no hospital — a contragosto dele e de sua família.“Estava angustiada e queria vê-lo, então decidi ir de qualquer jeito. Por sorte, não fui barrada”, brinca. Adriane apareceu por lá em duas ocasiões. Em uma delas, encontrou o amigo entubado. “Mas em nenhum momento pensei que não nos veríamos mais”, conta Adriane.
A expectativa de Biaggi é retomar o trabalho no fim de fevereiro. Para que isso seja possível, tem feito duas sessões de fisioterapia por dia. Não tem namorado fixo, mas vive uma espécie de bigamia: é casado com o trabalho e com a fama. “Abro o salão no fim de semana e já atendi clientes no meio da madrugada. Posto no Instagram fotos com as musas, sempre mostrando minha gola levantada. Faço o m-a-i-o-r sucesso, ganho muitos likes. Aliás, avisa aí na revista: quando voltar, ninguém vai me segurar.”