Lucélia Santos inspira escultura exibida no Masp
Obra, feita pelo artista pernambucano Tunga (1952 – 2016), nunca havia sido vista pela atriz carioca
A atriz Lucélia Santos, 60 anos, visitou o Masp no último dia 16 por um motivo especial: conhecer uma escultura inspirada em seus contornos e que está em exibição na instituição paulista. A obra é parte de uma mostra com trabalhos do artista Tunga (1952 – 2016).
“Conheci ele no Rio. Tínhamos a mesma turma. Eu, o John Neschling (meu ex-marido), Geraldo Carneiro, Bráulio Pedroso e Tunga. Éramos amigos, mas não éramos íntimos. Ele sempre foi um mega artista. Me apaixonei pelo seu trabalho quando vi as Xifópagas Capilares (1984). Achei muito louco e me rendi”.
A proximidade, tempos depois, renderia um convite. “Ele disse que estava fazendo um novo trabalho e me perguntou se posaria para ele. Não hesitei e aceitei’’. Lucélia não se lembra a data nem o dia da semana da sessão, mas consegue ainda esboçar o clima em que se deu a parceria.
“Foi à noite. O Tunga morava em uma rua perto da Pedra da Gávea. O John foi comigo, demorou algumas horas. Me lembro até que me senti meio cansada, porque tinha gravação no dia seguinte. Pensei que era uma coisa mais curta, mas é coisa de artista. Chegamos umas cinco, seis da tarde. Ficamos lá por umas sete horas. Fiquei posando e ele ficou desenhando meu perfil. Foi uma sessão longa, mas única. Não sabia no que ia dar”.
O encontro entre Lucélia e Tunga renderia também um desenho que tempos depois seria entregue à atriz. “Eu coloquei entre dois vidros grandes e pesados, mas quebrou. Deve estar em algum canto, quero refazer”. A escultura, no entanto, era desconhecida pela atriz até a visita ao Masp. “Ele explodiu, virou um artista importante no mundo, mas não mantivemos contato”.
Diante da obra, a atriz ficou encantada. A uma funcionária do museu, disse: “Olha lá, aquela sou eu”. Ao fascínio, seguiu a análise: “A taça é o limite do nosso corpo. Nela, você vê a testa, o nariz e a boca. Depois, na madeira, meus seios, minha barriguinha, meu corpo. Que incrível”.
Perguntada se o artista havia conseguido captar sua essência ali, emendou com um comentário sobre os tempos atuais: “Me sinto consagrada de me ver nua ali. Isso é a essência das mulheres, me sinto essencial. Tive o privilégio de posar para um grande artista, não sei como seria hoje, com essa sociedade careta, obscurecida pela falta de contato humano”.
Ao final da visita, ainda extasiada, questionou: “Mas aqui, tem três na exposição, cadê as outras quatro?”. Lucélia se referia às outras esculturas. A série, a qual elas pertencem, chamada Eixos Exógenos, foi desenvolvida nos anos 1980 e 2000. Da primeira época, segundo informações de Clara Gerchman, gestora do acervo do Instituto Tunga, há conhecimento de sete esculturas e um número ainda não determinado de desenhos. Da segunda, não há ainda uma estimativa conclusiva sobre as obras produzidas.
Cada uma das esculturas foi inspirada em personagens diferentes. Cinco delas, foram reveladas em uma matéria de Iúri Totti no Caderno 2, do jornal O Globo, em 1997. “Ele tomou como inspiração sua mulher, Cordélia Mourão, a modelo Shirley Mallmann, a atriz Lucélia Santos, a fotógrafa Nan Goldin e a jogadora de vôlei Jaqueline Silva. ‘As duas outras silhuetas têm musas que Tunga não prefere revelar’”, afirmava a reportagem.
Vinte anos depois, no entanto, o mistério se desfaz. Conforme informações de Gerchman, as duas últimas musas eram Beth Jobim e Betsy Monteiro de Carvalho. Sobre outros nomes e informações que por vezes aparecem sobre as outras peças, a gestora afirma: “Há muitas informações sobre os Eixos e muitas delas são contraditórias. Por isso, entendemos que nesse momento, o ideal é passar apenas as informações das quais temos certeza. Por ora, acreditamos ser por bem informar apenas os nomes das 7 mulheres que deram origem às primeiras esculturas”.
Investigações à parte, histórias e personagens tornam ainda mais fascinante e rico o trabalho de Tunga. Lucélia, antes de sair do museu, não disfarçava o entusiasmo. Com um catálogo da exposição nas mãos, disse ao se despedir: “Quero voltar aqui com mais tempo”.