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Jovens fazem propostas para reduzir violência policial em São Paulo

"Menos preconceito com a minha cor", traz o documento divulgado pelo Instituto Sou da Paz

Por Agência Brasil
Atualizado em 17 Maio 2023, 11h15 - Publicado em 17 Maio 2023, 11h14
Viaturas da Polícia Militar de São Paulo
Viaturas da Polícia Militar de São Paulo (Alesp/Divulgação)
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“Menos preconceito com a minha cor. Acho que você não sabe, mas negro também sente dor.” A reflexão, em forma de poesia, ilustra o documento Agenda Juvenil de Prevenção à Violência Letal contra a Juventude Negra, divulgado na semana passada pelo Instituto Sou da Paz.

relatório, que foi feito por jovens de várias regiões e situações de maior vulnerabilidade de São Paulo, apresenta propostas para diminuir a violência contra a juventude.

+Uso de câmeras corporais reduz mortalidade de adolescentes por PMs

Os jovens que elaboraram o documento tinham entre 16 e 21 anos de idade e foram divididos em três turmas, com cerca de 20 pessoas cada. Eles foram ouvidos em rodas de conversa e outras atividades, onde puderam compartilhar vivências e criar poesias e músicas sobre esses temas.

O projeto foi executado desde março do ano passado e finalizado agora em maio. Ele foi desenvolvido com três turmas, em média com 20 jovens de territórios de São Paulo – na zona leste, em São Mateus, e na zona norte, na Brasilândia -, escolhidos pela alta taxa de letalidade da juventude negra. “Além desses territórios, também escolhemos uma unidade da Fundação Casa, porque entendemos que o público das medidas socioeducativas de internação teria muito a contribuir no projeto”, explicou Vanessa Alves, psicóloga e supervisora socioeducativa do Instituto Sou da Paz, em entrevista à Agência Brasil.

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Um dos jovens que participou da agenda foi Gabriel Souza, 19 anos, conhecido como MC GS e que atualmente é segurança de eventos. Ele disse que estava cumprindo medida socioeducativa na Fundação Casa [de onde saiu em 2022] quando decidiu participar do projeto. “Todas as propostas retratavam tudo aquilo que eu passava na minha realidade dentro das periferias e também dentro do perfil em que eu me enquadro, em ser um jovem negro”, acrescentou.

“No começo, [o projeto] chegou a abranger várias perspectivas diferentes. Eles relatavam o que a gente passava lá dentro, mas não era novidade, todo mundo já havia visto isso [a violência] de perto. A maioria dos moleques que estava lá internada já tinha presenciado essas coisas. Então, o que fizemos? Fomos além na proposta. A gente não só fez uma roda de debates sobre o que acontecia dentro das comunidades, mas também montamos um plano para criar formas de que essas coisas que aconteciam dentro das comunidades não voltassem a acontecer”, afirmou.

Para Gabriel, participar do projeto lhe deu responsabilidades e nova perspectiva de vida. “Ter a oportunidade de participar de um projeto, evitando que amanhã outras pessoas sejam vítimas da mesma violência que sofri, foi muito satisfatório”.

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Violência

Jovens negros como Gabriel são as maiores vítimas de homicídios no país. Segundo o Atlas da Violência, mais da metade (51,3%) dos 45.503 homicídios que ocorreram no Brasil em 2019 afetaram jovens de 15 a 29 anos, sendo esses em sua maioria negros. No estado de São Paulo, dados compilados pelo Comitê Paulista pela Prevenção de Homicídios na Adolescência, no relatório Vidas Protegidas, de 2022, já mostravam que 53,81% das crianças e adolescentes vítimas de homicídio, latrocínio e lesão corporal seguida de morte eram negros.

Para discutir o tema da violência com os jovens e construir as propostas de enfrentamento, o Instituto Sou da Paz fez uso de duas estratégias: oficinas artísticas e pontos formativos, com participação de especialistas em assuntos relacionados à segurança pública. “Usamos como expressões artísticas a rima, o grafite e a percussão. Nessas oficinas construímos propostas de enfrentamento à letalidade da juventude negra. Por meio dessas ofertas, eles iam conseguindo nos dizer como achavam que seria possível diminuir os índices [de letalidade]”, explicou Vanessa. “Eles conseguiam nos dizer, por meio de suas próprias experiências de vida, quais seriam as melhores formas de enfrentamento”.

Foi assim que Gabriel Souza participou da cypher [música gravada por vários MCs, que se alternam nas rimas] Paz na Favela, que está disponível em plataformas de música, como Spotify e Youtube. Isso agora está impulsionando sua carreira de MC. “Como eu ficava com a mente vazia, muito angustiado, a rima foi um meio, uma válvula de escape para passar meu tempo, expor meus sentimentos e desabafar. Na minha segunda internação, encontrei esse projeto do Sou da Paz e eles viram em mim um potencial, minha facilidade com rimas e de me expressar por meio da música. E fizeram a proposta de fazermos uma cypher, a produção de uma música com vários MCs”.

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Propostas

Entre as propostas apresentadas por esses jovens para prevenir a violência está o aumento dos canais de denúncia contra a violência policial, a implementação de terminais de identificação digital nas viaturas e a ampliação do uso de câmeras corporais em uniformes de policiais militares. Essa proposta feita por jovens, inclusive, vai ao encontro dos resultados de um relatório elaborado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), divulgado ontem. O relatório demonstra que, após a adoção das câmeras corporais pela Polícia Militar de São Paulo, o número de crianças e adolescentes mortos em intervenções de policiais em serviço caiu 66,3% em 2022 na comparação com 2019, passando de 102 para 34 mortes.

“Um tema recorrente nas três turmas e que chamou muito a atenção foi que eles escolheram, já no início do projeto, falar sobre a violência das abordagens policiais. Independentemente do território em que estavam, esses jovens disseram que queriam discutir a temática porque tinham muitas dúvidas e muito receio de como poderiam lidar ou enfrentar a violência decorrente das abordagens policiais”, explicou Vanessa.

Os jovens consultados pelo Instituto Sou da Paz também citaram, entre as propostas, a ampliação das oportunidades de emprego formal e de acesso à cultura e a transformação das escolas em ambientes mais acolhedores. “Nas três turmas foram apresentadas ideias que diziam muito sobre a prevenção à violência. Eles falaram sobre a importância de uma escola mais acolhedora e que trabalhe, em seus conteúdos, temáticas de diversidade, racismo, violências de gênero e direitos humanos. Também destacaram a importância de jovens negros e periféricos acessarem espaços de cultura e de lazer que abordem essas temáticas”, acrescentou.

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Para que o documento não se tornasse apenas um conjunto de ideias, as propostas apresentadas pelos jovens foram analisadas por especialistas. “A gente entendeu que só a apresentação das propostas nesse documento talvez não trouxesse uma confiabilidade. Então, incluímos também dois pareceres técnicos de especialistas falando sobre a importância das sugestões e a viabilidade delas”, disse a psicóloga.

O objetivo é que o documento amplie as discussões na sociedade sobre o tema, possa ser encaminhado a diversas autoridades do país e ajude na criação de políticas públicas de juventude e de segurança pública. “A ideia é que esse material possa amplificar a voz da juventude para que chegue a pessoas que têm poder de decisão”, afirmou Vanessa.

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