“Polícia se sente acima da lei”, diz primo de Jean Charles
Corte Europeia de Direitos Humanos rejeitou recurso de família de brasileiro morto no metrô de Londres de processar policiais envolvidos no caso

A Corte Europeia de Direitos Humanos ratificou a decisão da Justiça do Reino Unido de não processar os policiais que mataram o mineiro Jean Charles de Menezes dentro de uma estação de metrô em Londres em julho de 2005.
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Segundo decisão da corte, publicada em seu site nesta quarta-feira (30), não havia evidências suficientes contra qualquer policial para uma acusação individualizada. A Scotland Yard, polícia britânica, foi considerada culpada na época, pagou uma multa, mas ninguém nunca foi processado pelo caso. Em 2015, a família decidiu recorrer à corte, última instância.
O eletricista Jean Charles morreu aos 27 anos de idade com sete tiros ao ser confundido com terroristas que praticaram uma série de atentados semanas antes no sistema de transportes de Londres. A família foi indenizada, mas não revelaram o valor (na época, a estimativa era de 300 000 reais).

“Esperava outra atitude da corte. Está muito claro que os policiais não agiram como profissionais, mas por pessoas que se sentem acima da lei, protegidos por um país que é respeitado pela sua história”, disse a VEJA SÃO PAULO Alex Pereira, que morou com o primo Jean Charles em Londres e hoje reside em Virginópolis, a 26 km de Gonzaga, Minas Gerais, a terra dele. Atualmente, Alex é dono de uma oficina de moto.
“Às vezes, sonho que foi tudo um engano, como acontece em novelas, que ele estará de volta. Acredito que o Jean morreu para mostrar ao mundo que nossos preconceitos podem matar. Se ele fosse um árabe, todo mundo acreditaria que ele era culpado.”

Foi com a ajuda financeira de Alex que Jean Charles chegou a Londres em 14 de março de 2002, alguns meses depois era ele que aportava na ilha.
No dia 22 de julho de 2005, Alex estava estudando numa escola de inglês quando a professora ligou a televisão e os apresentadores de um canal de notícias noticiaram a morte de um suposto homem-bomba na estação de Stockwell.
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No dia seguinte, às 13h, ele recebeu ligações de que Jean estava desaparecido. Ao se encontrar com familiares foi informado de que seu primo estava preso por terrorismo. Incrédulo por se tratar de um homem trabalhador e honesto, relembra, Alex imaginou que tudo não passava de um mal entendido e iria solucionar a situação. Porém, foi informado pela polícia que seu primo estava morto.

Foi no necrotério de Greenwich, no sudeste de Londres, que Alex viu por uma janela o corpo de Jean estirado em uma cama, coberto por um lençol fino e branco. Ele invadiu a sala e descobriu o corpo a ponto de notar que não havia tiros no peito, mas que eles haviam sido disparados por trás, impossibilitando a defesa de Jean.
Nos meses seguintes, ele e os familiares lutaram na Justiça para provar a inocência de Jean e que inverdades haviam sido notificadas pela polícia, como ele estar ilegal no país e ter pulado a catraca do metrô para fugir dos agentes.
“Valeu a pena lutar, eles iriam dizer o que lhes fosse conveniente caso a família não contestasse, agora a Justiça não esta em nossas mãos, mas a verdade nós buscamos”, afirmou Alex. “A decisão da corte é revoltante por se tratar de uma série de erros cometidos pela polícia. Hoje é a saudade que fica dos momentos mais felizes juntos. Ele tinha até me prometido que quando voltasse de Londres cruzaríamos São Paulo a Minas Gerais numa moto. Adorávamos dirigir juntos”, lembra a prima empresária Kátia Armani Rodrigues, que mora na capital paulista.