Ícone nos anos 80, Arrigo Barnabé lança DVD
Pianista paranaense autor de "Office-Boy" canta canções de Lupicínio Rodrigues
Os versos da música “Office-Boy” narram o fim de semana de um paulistano sem dinheiro para se divertir que se lembra de uma vedete morena do Áurea Strip Show. Tal lugar, no centro, deu espaço ao Cine Áurea. Esse cinema só exibe filmes pornográficos, mas abriu uma exceção para receber o compositor e pianista paranaense Arrigo Barnabé, o autor da letra e um dos importantes nomes da MPB, que vive na cidade há mais de quarenta anos. Na quarta (16), ele usa a tela e o palco da sala para lançar o DVD do antológico show “Caixa de Ódio”, no qual presta um tributo às canções de amor e traição do gaúcho Lupicínio Rodrigues (1914-1974) ao lado de Paulo Braga (piano) e Sergio Espíndola (baixo e violão). O show, desde 2009 em cartaz na pequenina Casa de Francisca, no Jardim Paulista, é o primeiro em que o músico interpreta, com sua intensidade teatral melodramática costumeira, apenas canções de outro artista.
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Embora esta seja uma fase, digamos, mais popular, Arrigo pertence ao grupo de artistas que sempre estiveram à margem do grande público. Em 1980, ele lançou de forma independente o disco “Clara Crocodilo”, trabalho que misturava elementos da cultura pop, como histórias em quadrinhos, do teatro e da música erudita. “Na época, a MPB seguia um padrão e tínhamos a esperança de deixar alguma marca ao romper com a tradição”, diz. No ano anterior, Arrigo havia sido, ao lado de Itamar Assumpção (1949-2003), o precursor do movimento chamado Vanguarda Paulistana, ímã de um público alternativo, como universitários e gente ligada ao teatro e ao cinema. Shows baratos no Teatro Lira Paulistana, em Pinheiros, e no SESC Pompeia lotavam. Ali, despontaram nomes como as cantoras Cida Moreira, Vânia Bastos e Tetê Espíndola, além dos grupos Rumo e Premeditando o Breque. “Era um ambiente extraordinário”, lembra a cantora e pianista Cida Moreira. “A inovação foi estética, instrumental e de comportamento, e o público ia sedento por conhecer.”
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Também respeitado na seara da música erudita, Arrigo criou para a Orquestra Sinfônica Jovem Municipal “A Saga de Clara Crocodilo”. Sob a regência do maestro Jamil Maluf, a peça teve execução em 1983, em uma noite memorável no Teatro Cultura Artística. “Mais do que um compositor, ele é um pensador criativo, responsável pela revolução da música popular dos anos 80”, define Maluf. “Mesmo transgressor, ele respeita o passado, uma característica do verdadeiro inovador.”
Como seu personagem de “Office-Boy”, em 1987 Arrigo precisava de dinheiro e teve de fazer algo diferente para sobreviver. Assim nasceu “Suspeito”, sucessor de “Tubarões Voadores” (1984), seu segundo LP, e da trilha de “Cidade Oculta” (1986), filme dirigido por Chico Botelho no qual também atuou, junto de Carla Camurati. Ele acrescentou ao seu trabalho elementos do pop oitentista, como o sampler e a bateria eletrônica, para soar como um produto mais comercial. E recebeu convites para participar de atrações do rádio e da TV. “Só me arrependo nesse disco da faixa ‘Uga Uga’”, diz. “Era uma tortura ter de apresentá-la em programas como o do Chacrinha, mas a gravadora pedia.”
Do início dos anos 90 até 2008, ele só se dedicou à música erudita, compondo para conjuntos como a Banda Sinfônica do Estado de São Paulo e um quinteto de percussão do Teatro Nacional São João, no Porto, em Portugal. Agora, além de se dedicar a Lupicínio, o músico planeja um espetáculo dividido em três partes, com canções de outros artistas, composições suas e uma etapa dedicada ao LP “Clara Crocodilo”. Como se vê, o incansável crocodilo, que acorda todos os dias às 4 da manhã e vai para o piano, prepara novos botes.