Designers paulistanos dão cara à cidade e a marcas conhecidas
Conheça alguns dos profissionais mais importantes da cidade, seus trabalhos e como começaram a carreira
Da prancheta dessa turma saíram alguns dos principais símbolos da paisagem paulistana, como a setinha vertical nas estações do Metrô, o grafismo dos carros da Polícia Militar e as letras das agências bancárias 24 horas. São desses profissionais também desenhos de logotipos de cinemas, museus, livrarias, hospitais, lojas, bancos, hotéis, restaurantes e supermercados.
Nem todos se formaram em design. Entre eles há arquitetos, publicitários, engenheiros e comunicadores. Além de autores de logos – pelos quais cobram, em média, 15.000 reais -, tornaram-se, nos últimos tempos, consultores de diversas empresas. Dão palpites sobre o lançamento de produtos e o posicionamento de marcas. Por esse trabalho, conhecido como branding, fecham contratos bem mais polpudos. Estima-se, por exemplo, que a empresa Landor, gigante americano do setor, tenha recebido 3 milhões de dólares para desenhar o novo logo e comandar o reposicionamento do banco Bradesco. Ao contrário do que possa parecer, a Lei Cidade Limpa, que entrou em vigor em janeiro de 2007, movimentou o mercado. ‘ Precisamos repensar o planejamento visual das empresas ‘, afirma Luciano Deos, presidente da Associação Brasileira de Empresas de Design (Abedesign). A mudança fez com que os criadores fossem chamados para bolar novas maneiras de os clientes aparecerem. A seguir, nove profissionais que, apesar de pouco conhecidos, ajudam São Paulo a ter sua cara.
Inspiração Hollywoodiana
O nome do escritório deste trio foi inspirado no filme O Mágico de Oz, de 1939. Explica-se: segundo o italiano Giovanni Vannucchi (à esq.), de 52 anos, assim como na história de Victor Fleming, sua missão é ajudar os outros a descobrir e mostrar seus valores. Formado na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP ao lado dos sócios Ronald Kapaz (no centro) e André Poppovic (à dir.), também na faixa dos 50 anos, ele criou a Oz Design em 1979. Segundo eles, cada empresa deve encontrar seu ‘ segredo ‘ antes de tentar transmiti-lo ao cliente. ‘ O logo está aí para ajudar, mas antes de defini-lo é preciso saber quem são seus consumidores, pensar no posicionamento da companhia e só depois fazer um planejamento visual’ , diz Poppovic. Entre os trabalhos mais recentes da Oz estão os redesenhos das marcas Porto Seguro e Sírio-Libanês. ‘ Um hospital, além de seriedade e qualidade, precisa mostrar renovação e passar valores humanos como acolhimento, carinho e relação olho no olho ‘, ensina Vannucchi. ‘ Ao escolhermos formas orgânicas e mais leves, mostramos isso. É nossa mágica. ‘
Uma escola como obra-prima
Dias depois de se formar arquiteto, em 1976, sem saber se queria mesmo levar a profissão adiante, Rafic Farah foi passar quatro meses na casa de um pescador em Ubatuba. Seus maiores ídolos – Vilanova Artigas, Oscar Niemeyer, Lucio Costa e Paulo Mendes da Rocha – estavam acuados pelo governo militar. Ao sair de sua reclusão, pensou em ser cineasta. Mas caiu no seu colo o pedido para criar a identidade da loja do irmão de um amigo. Num piscar de olhos, passou a ganhar a vida elaborando marcas. É autor de logos que contam um pouco da história de restaurantes, lojas e espaços culturais da cidade. Desenhou as marcas do America, do Spot, da Cristal… Fez ainda as da Fit, Zoomp, Side Walk… É dele também o símbolo do Museu da Língua Portuguesa. Nos anos 90, produziu catálogos para o fechado círculo da Daslu, butique de luxo onde nunca antes havia pisado. Aos 61 anos, Rafic orgulha-se de suas criações para o mundo fashion, mas faz questão de realçar que sua obra-prima é a Escola da Cidade, faculdade criada há oito anos e cuja principal ideia é formar arquitetos humanistas. ‘ Os arquitetos de hoje não têm projeto para a cidade ‘, diz. ‘ Viraram decoradores de ambientes. ‘ Dono do escritório São Paulo Criação, Farah acredita que um logo é melhor quando ele se integra à realidade que o rodeia.
Coragem e novela
Em 2000, ao ser chamado para fazer um trabalho para a Petrobras, Norberto Chamma, o Lelé, dono da Und Design, pensou grande. Sugeriu não apenas um novo logo. ‘ Recomendei a mudança do nome para Petrobrax ‘, conta. O motivo da ousada sugestão era tirar o componente nacional da marca, já que, segundo pesquisas da época, a empresa era vista como imperialista pelos latino-americanos.
A ideia colou e a maior empresa brasileira trocou o ‘ s ‘ pelo ‘ x ‘. Mas só por alguns dias. ‘ O Senado bateu o pé e o ‘ s ‘ voltou. ‘ Lelé – segundo ele, um apelido carinhoso entre os árabes – ficou marcado pelo imbróglio. ‘ Até hoje, preciso explicar essa história. ‘ Na semana passada, no entanto, ele virou assunto ao ver uma de suas obras, o símbolo da Amil, desfilar no merchandising da novela das 8 da Rede Globo. ‘ Minha mãe me ligou na hora para avisar. ‘ O logo apareceu no avião e no helicóptero usados para resgatar a personagem da atriz Alinne Moraes, que sofrera um acidente.
Som e design dançando juntos
Quando senta para traçar um logo, João Carlos Cauduro gosta de ouvir música. Bach, de preferência. Mas pode ser Beethoven. Para ele, som e design dançam juntos. ‘ Assim como uma música, um logo tem ritmo, harmonia e emoção. Pode passar ordem ou desordem ‘, diz ele, tido como o maior expoente no universo da criação de marcas no Brasil. Desde 1964, quando abriu seu escritório ao lado do amigo Ludovico Martino, já desenhou mais de três centenas de logos, muitos com lugar cativo na memória do paulistano. A seta do Metrô talvez seja sua criação mais conhecida, mas ele desenhou o símbolo do Banespa, do Playcenter, da TV Cultura, da USTop, do Espaço Unibanco de Cinema… Quando o branding ainda era um ilustre desconhecido por aqui, Cauduro já vendia a ideia do ‘ design total ‘ e pregava uma identidade visual para seus clientes. Segredo para um logo certeiro ele diz não existir. Mas dá algumas dicas: ‘ Uma marca precisa ter legibilidade, impacto visual, fácil memorização e transmitir um valor ‘. Cauduro está à frente, por exemplo, da mudança de imagem da Companhia Vale do Rio Doce. Sua atuação é tão longeva que ele já precisou redesenhar diversas de suas criações. A do Playcenter, por exemplo, feita em 1973, ficou mais ‘ alegre e luminosa ‘ em 2003. No momento, ele negocia o redesenho do simpático boneco que dá cara à TV Cultura.
10.000 embalagens
Pouca gente se dá conta, mas a logomarca do supermercado Pão de Açúcar, criada por Lincoln Seragini em 1995, é formada pelas letras P e A. ‘ Eu as transformei nas duas montanhas, como o próprio Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro ‘, revela Seragini. Recentemente, o desenho passou por uma remodelação. ‘ Ficou mais dinâmico, mas perdeu essa característica ‘, diz o engenheiro especializado em embalagens – foram mais de 10.000 projetos. ‘ Antes, os designers chegavam e diziam à empresa: ‘ Este é o seu logo ‘, conta. ‘ Isso não existe mais, pois agora é preciso buscar a essência da marca. ‘ Seu escritório, o Seragini Farné Guardado, desenhou, entre outros, o logo do Colégio Rio Branco, da Perdigão, dos sucos Del Valle, do Octávio Café e fez o redesenho da Casa do Pão de Queijo.
Pioneiro incansável
Édifícil encontrar Alexandre Wollner por aqui. Ele voltou de Singapura no último dia 13 e embarcou para a Suíça dois dias depois. Aos 81 anos, sua agenda continua cheia. Aulas, palestras, debates e clientes pelo mundo. Entre as duas viagens, teve uma reunião de trabalho no centro da cidade. Foi de ônibus. ‘Não dá mais para andar de carro em São Paulo. ‘ Parece um moleque ao falar da carreira. Ri e brinca como se tivesse 18 anos, época na qual já acumulava quatro repetências no Colégio Oswaldo Cruz e uma expulsão do Mackenzie. Antes de ser convidado a se retirar, no entanto, ficou famoso ao desenhar no quadro-negro, a pedido da professora, crânios, globos oculares e outros elementos relacionados à aula de ciências. Não foi muito longe nos estudos. Mas a carreira decolou quando se inscreveu, em 1951, na primeira turma do Instituto de Arte Contemporânea, idealizado por Pietro Maria Bardi (1900-1999), então diretor do Masp. ‘ Aprendi a unir arte e conteúdo e os trabalhos começaram a aparecer ‘, conta. Alistou-se no movimento de arte concreta, desenhou cartazes de exposições, foi pintor revelação da II Bienal de São Paulo, em 1953, e conseguiu uma bolsa para estudar em Ulm, na Alemanha, onde acabava de ser criada uma escola de design com os princípios do movimento Bauhaus. Atraído pelas ideias de Juscelino Kubitschek, voltou ao Brasil e fez história: criou o primeiro escritório e a primeira escola de design no país. Fez a identidade visual de dezenas de marcas, foi consultor da agência de publicidade DPZ e hoje é a principal referência histórica do design brasileiro. Quando voltar da Suíça, Wollner precisa finalizar a nova identificação visual do Colégio Vera Cruz.
Rapidez como marca
Hugo Kovadloff já tinha uma longa história quando levou um senhor susto. Era o ano de 1983 e ele trabalhava na SAO, divisão de design da agência de publicidade DPZ. A pedido da família Bloch, desenhou a marca da TV Manchete, com lançamento previsto para os meses seguintes. ‘ Quando Adolpho Bloch viu nossa sugestão, ficou vermelho de raiva ‘, lembra. ‘ Disse que era judeu e que o logo lembrava um símbolo palestino. Largou o desenho e saiu da sala.’ Desde então, ele passou a estudar ainda mais seus clientes antes de pegar no lápis e esboçar qualquer coisa.
Nascido em Buenos Aires em 1944, veio para o Brasil aos 13 anos. Era para ter seguido na carreira de fotógrafo, mas conheceu a sobrinha de Roberto Duailibi, sócio da DPZ, na festa da amiga de uma amiga. Formou-se em design no Mackenzie e na agência encontrou Alexandre Wollner, o maior expoente do design na época. Atualmente, é diretor de criação da Gad e orgulha-se do lançamento da Claro no mercado brasileiro. ‘ Do pedido à entrega do logo e do branding, tivemos quinze dias. ‘ A propósito, depois da negativa de Adolpho Bloch, Kovadloff sentou novamente diante da prancheta e desenhou o ‘ M ‘ que viria a ser a marca da emissora até seu fim, em 1999.