Fugindo da crise, descendentes buscam emprego no Japão
Em 2016, 11 200 paulistas foram para lá a trabalho, um aumento de mais de 200% em relação ao movimento de quatro anos atrás
Formado há um ano em administração de empresas pela Universidade Metodista de São Paulo, Allysson Teixeira Takebayashi, 22, largou o emprego de analista de produtos e serviços no Banco Safra para trabalhar como operário de máquinas em uma fábrica de componentes eletrônicos na cidade de Izumo, a 160 quilômetros de Hiroshima, no Japão.
Aqui, ele ganhava 3 500 reais por mês. Lá, conseguirá receber até 10 000 reais. Seu embarque está previsto para o próximo dia 5. Irá sozinho e deve morar em um apartamento alugado, a cinco minutos de bicicleta do trabalho. “Não é só pelo dinheiro”, explica. “Estou muito decepcionado com o Brasil, não vejo perspectivas de crescimento.”
A preparação para a sua partida começou em junho, quando ele iniciou um curso para aprender o básico de japonês. “Quero aproveitar a mudança para ficar fluente nessa língua e conhecer a cultura do país”, completa.
Neto de japoneses, Takebayashi é um dos milhares de descendentes que estão migrando para a nação asiática. Segundo dados do Consulado-Geral do Japão em São Paulo, 11 200 paulistas foram para lá em 2016 a trabalho, um aumento de mais de 200% em relação ao movimento de quatro anos atrás.
Em 2017, estima-se que o número ultrapasse 20 000. Pelo menos metade dos que embarcam sai daqui da capital. Ainda é uma quantidade baixa se comparada ao fluxo de migrantes para os Estados Unidos (cerca de 80 000 pedidos de visto de trabalho por ano). Mas é um volume bem mais alto que o da debandada para Portugal (previsão de 5 000 solicitações de visto de residente em 2017).
No Japão há vagas para cargos como engenheiros, arquitetos e diretores executivos de multinacionais, mas essas têm baixa procura, pois exigem fluência no idioma. As mais solicitadas são para os decasséguis, os descendentes de japoneses que ocupam funções braçais nas indústrias e não precisam de qualificação profissional nem falar a língua.
O auge foi entre os anos 1990 e 2000, quando o número de operários brasileiros passou de 320 000 naquele país. O movimento, no entanto, começou a minguar a partir de 2008, fase em que as indústrias do país entraram em decadência devido à crise econômica global e pararam de contratar.
Em 2015, porém, o mercado voltou a ficar aquecido. Hoje, o número de decasséguis é estimado em 180 000. A tendência é que continue aumentando nos próximos anos.
“De um lado, as companhias de autopeças necessitam de mão de obra em massa para fabricar carros e outros itens para exportação. De outro, há os brasileiros insatisfeitos com a corrupção, o desemprego e a violência nas metrópoles”, revela Isamu Otake, diretor da Gema Turismo, no Jabaquara, especializada em embarcar decasséguis. A empresa atende cerca de trinta clientes por mês, o triplo do registrado há dois anos.
As montadoras abrem espaço para estrangeiros porque precisam de mão de obra em funções como as de soldador, operador de empilhadeiras e auxiliar de produção, cargos considerados “baixos”, que não interessam à população local. “Os brasileiros ocupam mais de 90% deles”, afirma Massaki Ebihara, dono da agência Marv, uma das cerca de dez empresas que fazem esse tipo de intermediação.
No caso da Marv, a especialidade é captar por aqui profissionais para a empreiteira nipônica Suri-emu, sediada na província de Aichi, a 130 quilômetros de Kyoto. Para se candidatar a uma vaga de operário (salário de 8 500 reais por mês, em média), é preciso ter ascendência nipônica e ser da segunda geração (nissei) ou, no máximo, da terceira (sansei). Cônjuges, mesmo não orientais, também são considerados aptos. Para quem tem todos esses requisitos, mais a comprovação de que não há antecedentes criminais, existem grandes chances de sucesso.
Algumas multinacionais também mantêm representantes próprios no Brasil, que recrutam os candidatos diretamente. Aqui, fazem todo o processo de seleção em português. Um dos aprovados nesse esquema foi o auxiliar administrativo Marcelo Amano, 43, morador da Mooca, que embarca no início deste mês para Aichi com a esposa, a bacharel em direito Virginia Videira Amano, 42. Os dois vão trabalhar como operários em uma fábrica de autopeças. “Vamos ficar lá por no mínimo quatro anos”, planeja Amano.