Cresce a venda de carros luxuosos no Brasil
Grifes estreladas conquistam público paulistano - Aston Martin, Bugatti e Bentley estão a caminho
Uma canção de Caetano Veloso retrata com perfeição o espanto de quem se inteira dos números da indústria automobilística no Brasil. “Alguma coisa está fora da ordem”, diz a letra. É mais ou menos essa a impressão que se tem ao saber que, de 2008 para cá, as vendas de Mercedes-Benz, Audi, Volvo e BMW cresceram 50% no mercado nacional — as das categorias populares, que, graças à redução de IPI, aumentaram 21% até setembro último, têm previsão de subir outros 5% em 2010. Alguma coisa estaria mesmo fora da ordem? Não, Caetano. Ao que parece, ingressamos em alto estilo no clube de países relevantes para as montadoras de luxo. Uma série delas tem previsão de chegada à cidade até o fim do ano que vem: da holandesa (e menos conhecida) Spyker à Aston Martin, fabricante britânica lembrada sempre por ser a escolhida de James Bond, o 007 do cinema, para suas missões mundo afora. A italiana Lamborghini investiu 2 milhões de reais só nas instalações de seu showroom, em operação na Avenida Europa desde outubro. Espera vender, no ano que vem, pelo menos vinte Gallardos, sua principal aposta para o mercado nacional, que custa 1,5 milhão de reais. Parece otimismo demais. Mas, já nas primeiras semanas de funcionamento, seis desses carrões ganharam novos donos — quatro deles, paulistanos.
Fundada em 1898, a marca Spyker ainda não significa muita coisa para o consumidor brasileiro. Pudera. A montadora, que originalmente também produzia aviões, deixou de existir por 75 anos e, em 2000, foi relançada mundialmente. Acaba de aterrissar seu primeiro bólido no Brasil: o C8 Laviolette (1,25 milhão de reais). Literalmente. Fazendo jus à tradição aeronáutica da grife, o carro veio de avião — normalmente o transporte é feito de navio. Aliás, mal havia chegado a São Paulo e lá foi o Laviolette rumo a São José dos Campos, onde ficou em exposição num lançamento de jatinhos da Embraer. Quem cuida da operação da empresa holandesa por aqui é a Platinuss, embaixadora oficial da Pagani. Assim, o showroom que mantém na Avenida Europa (sempre ela) exibe o Zonda, único no país, que custa 4 milhões de reais. Detalhe: trata-se de uma estimativa de preço, pois nunca se vendeu nenhuma unidade dele. A Platinuss, tudo indica, deve passar a representar também as inglesas Caterham e Lotus.
Uma interessante briga de cachorro grande se alinha no horizonte. A Bentley, que reivindica o título de carro do 007 — normalmente associado à Aston Martin —, também está a caminho. Embora atendam públicos diferentes, podem protagonizar novos rounds dessa disputa na cidade. “Nos romances originais de Ian Flemming, James Bond dirigia modelos nossos”, defende Mauro Saddi, um dos empresários a cargo da vinda da Bentley. A concessionária de São Paulo receberá o Continental Flying Spur (900 000 reais), o Continental GT (950.000 reais) e sua versão conversível, o GTC (1 milhão de reais). A Aston trará o V8 Vantage (700 000 reais). “Vamos vender uns vinte por ano”, ambiciona o empresário Sérgio Habib, responsável pela operação no Brasil. Também chegam o V8 conversível, o DBS e o DB9.
Nada, no entanto, causa mais ansiedade entre os paulistanos maníacos por velocidade que a menção do Veyron. Trata-se do modelo com que outra importante montadora, a Bugatti, estreia suas atividades no país. Preço: 8 milhões de reais. Você leu certo. Considerado o carro com o melhor desempenho do mundo — chega a atingir 400 quilômetros por hora! —, será exposto no showroom da Bentley (ambas são representadas pelo mesmo grupo). Mas por apenas dois meses. Sua produção é limitada a 300 unidades, das quais 226 já foram fabricadas. “Se conseguirmos vender um desses por ano, está de excelente tamanho”, sonha Mauro Saddi.
Trazer estrelas sobre rodas para conquistar o consumidor brasileiro custa, naturalmente, bem caro. Para a infraestrutura da loja, são necessários de 2 milhões a 5 milhões de reais. O que não é nada perto do investimento na compra da primeira leva de veículos, importantíssima para compor o showroom. Como todos os grandes nomes do luxo, as grifes de automóveis têm suas idiossincrasias — que sempre se traduzem em gastos. A decoração do estande do Spyker Laviolette tinha, necessariamente, de usar uma fuselagem que foi encontrada em um cemitério de aviões nos Estados Unidos e, em seguida, restaurada. As luminárias no espaço da Aston Martin precisaram ser trazidas da Inglaterra e o mármore no salão da Lamborghini, da Itália.
Apesar da euforia, ainda são modestos os números envolvendo os superesportivos, categoria que engloba esses bólidos que estão para chegar. “É uma fatia de mercado que deverá ter, no máximo, 200 vendas por ano”, estima Sérgio Habib. Mas ela tem crescido. Peguemos, por exemplo, as três clássicas italianas: Ferrari, Lamborghini e Maserati. De janeiro a setembro de 2007, foram vendidas 47 unidades. No mesmo período do ano seguinte, 52, e, em 2009, 61. Os dados foram levantados pela consultoria Jato, especializada no setor automotivo. O que engorda o caixa das empresas, na verdade, são os chamados luxuosos de entrada, com preços que começam em 150 000 reais (em alguns casos, até menos). A sueca Volvo vem quase dobrando suas vendas no Brasil desde 2006. Juntas, Audi, BMW, Mercedes-Benz e Volvo viram suas vendas aumentar 47% desde 2008. “Esse crescimento indica que estamos abocanhando clientes de outras categorias”, diz Carlos Augusto, diretor da Jato. “É comum os clientes trazerem um Toyota Corolla ou um Honda Civic para trocar por um dos nossos carros”, diz Paulo Kakinoff, presidente da Audi Brasil.
Apesar da pujança do crescimento, o volume de vendas ainda é pequeno em relação a parâmetros de países europeus, Estados Unidos e China — a exemplo do que também acontece com os superesportivos acima de 1 milhão de reais. “Não dá pra vender 100 000 veículos por ano. Mas o Brasil é onde mais crescemos em números relativos”, afi rma Jörg Henning Dornbusch, presidente da BMW Brasil e da Associação Brasileira das Empresas Importadoras de Veículos Automotores. Para Sérgio Habib, o status conquistado pelos consumidores paulistanos é irreversível: “Por que apostar em São Paulo? Não dá mais para deixá-la de fora do circuito mundial de grandes marcas”.