CASACOR abre edição no Parque da Água Branca com vegetação exuberante
Em novo endereço, maior evento de arquitetura, decoração e paisagismo das Américas ocupa, de 27 de maio a 3 de agosto, dois casarões do local

Debaixo das copas de pau-brasil e embalada pelos cantos dos sabiás, a cena arquitetônica chega ao Parque da Água Branca. O local dominado pelo verde e repleto de construções históricas é o palco da CASACOR deste ano.
Em sua 38ª edição, o maior evento de arquitetura, decoração e paisagismo das Américas ocupa, de 27 de maio a 3 de agosto, dois casarões e seus entornos, somando uma área total de 10 161 metros quadrados. Edifícios e jardins serão transformados nesse período por 72 projetos, entre ambientes residenciais, bar, restaurante, loja e galeria de arte.
“A ocupação do Água Branca faz parte do nosso movimento de itinerância”, afirma André Secchin, diretor-geral da CASACOR. “Queremos resgatar a memória de edificações históricas, que são de interesse do público. Isso também está relacionado com a regeneração da área verde do parque, prevista no projeto”, enfatiza.

Para acompanhar a mudança de endereço, os projetos foram pautados pela conexão com o meio ambiente. “A palavra-chave do ano é simbiose. Ela veio de uma pesquisa que pontuou o resgate da natureza como fonte de respostas para o futuro”, acrescenta Secchin. Esta será a primeira edição desde 2019, que aconteceu no Jockey Club, em que haverá jardins a céu aberto.
O tema do ano é Semear Sonhos e tem base em três eixos: sonhos coletivos, ecossistemas em cooperação e confluência de saberes.
“É um convite para estender a visão sobre arquitetura, em geral tão racional e cartesiana, e pensar em novas maneiras de habitar a cidade a partir de uma biomimética”, explica Livia Pedreira, curadora do evento ao lado de Pedro Ariel Santana, Cristina Ferraz e Ana Clara Escuciato. “A discussão mostra que, neste momento, talvez o grande desafio seja se apropriar do existente, transformar edifícios e estruturas na cidade.”

Logo na entrada, a instalação Ninho, do arquiteto e designer croata-brasileiro Marko Brajovic, sintetiza essa ideia. A obra é composta por uma grande estrutura de madeira, com blocos retangulares intercalados como galhos de um lar de pássaros.
Em volta, estão reproduções de construções feitas por animais, como ninhos de vespas, abelhas solitárias e beija-flores-tesoura, com explicações e reflexões sobre a arquitetura primitiva. O espaço vai receber palestras com botânicos, paisagistas, ambientalistas e biomimeticistas ao longo do evento.
O elenco com 74 escritórios, incluindo o light designer da fachada, Carlos Fortes, conta com estreantes, como Yara Elias, Felipe Carolo e Alexandre Pasquotto, e o retorno de consagrados em edições passadas, como Leo Shehtman, Gabriel Rosa e Gabriel Fernandes. A volta de grandes nomes do paisagismo é um chamariz.

Entre os mais aguardados está Gilberto Elkis, que traz um projeto com a filha, Caroline, mas o elenco tem ainda Roberto Riscala, Mônica Costa, Catê Poli e João Jadão, Luciano Zanardo, Simone Campos e Denis Bessa.
O espaço pensado por pai e filha recebe o visitante logo depois da bilheteria. O jardim da dupla tem um percurso sinuoso e três lounges para um passeio contemplativo pela mata. “Durante a montagem, vimos vários miquinhos e sabiás vindos até aqui”, comenta Caroline.
“A intenção é agregar e trazer vida.” A relação da família com o parque é antiga. “Meu avô comprava gado nos leilões daqui e meu pai fez um projeto para um jardim no governo (de Geraldo) Alckmin.”

O local, fundado em 1929, teve boa parte da história atrelada à agricultura. Antes da inauguração do parque, abrigou a Escola de Pomologia e Horticultura, fundada pelo então prefeito de São Paulo, Antonio da Silva Prado, de 1904 a 1911, a Diretoria de Indústria Animal e o Pavilhão de Exposições de Animais, ambos em 1928, por iniciativa do ex-secretário de Agricultura Fernando Costa.
No ano seguinte, o imóvel, pertencente à então Secretaria de Agricultura e Abastecimento, virou o Parque da Água Branca, idealizado como área de incentivo às atividades agropecuárias e de fácil acesso ao público interessado.
Em vista de seu valor histórico, arquitetônico e paisagístico-ambiental, foi tombado como patrimônio pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat), em 1996, e pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental (Conpresp), em 2004.

Atualmente, abriga mais de trinta prédios e pavilhões de diversos formatos, como a Casa do Caboclo (réplica de uma residência rural), um coreto e arenas de equitação. Ficou conhecido pela presença das galinhas criadas livremente, pela biblioteca infantil e pelo baile da terceira idade.
Antes de se instalar no Parque da Água Branca, a CASACOR consultou os órgãos de patrimônio e obteve todas as autorizações necessárias para sua montagem. Em nota à reportagem, a Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa informou que o Conpresp “autorizou as intervenções físicas nos prédios 22 e 23 e o uso das edificações 12, 13, 14 e 30, além de áreas livres no entorno”.
A Secretaria Estadual de Cultura atestou que “foram aprovadas pelo Condephaat intervenções externas e internas (elevador e escada) nos prédios 22 e 23 e parcialmente no prédio 12, além dos arruamentos e jardins do entorno desses prédios”.

A organização acrescenta que os prédios 14, 30, 63 e 74 foram cedidos pela concessionária para uso exclusivamente operacional e que não houve intervenções estruturais neles. “Todos os espaços utilizados pela CASACOR foram devidamente aprovados pelos órgãos responsáveis pelo tombamento histórico”, reafirma a concessionária Reserva Parques.
No caso dos jardins, as plantas nativas usadas nos projetos serão doadas ao local, enquanto as exóticas foram instaladas em vasos e serão retiradas após o evento.
A vegetação do Água Branca formou-se por meio da introdução dispersa de plantas ao longo dos anos, sem planejamento de distribuição ou projeto de paisagismo. Entre os dois lagos artificiais, há poucos remanescentes de Mata Atlântica. “O resquício de mata nativa é mínimo e encontramos até exóticas plantadas”, diz o diretor de operações da CASACOR, Darlan Firmato.

A maioria das mudanças tem caráter efêmero. Há estruturas externas que não usam fundação: a casa desmontável de João Panaggio, cuja estrutura metálica é utilizada pela terceira vez, após duas edições de CASACOR Rio, será reaproveitada novamente depois; o espaço patrocinado pela Peugeot, projetado por Gisele Taranto com blocos de plástico reciclado — que chamou a atenção dos frequentadores e da associação de moradores do bairro; e a Casa Viva, de Henrique Freneda, tiny house totalmente sustentável.
As alterações definitivas visaram às melhorias no patrimônio e incluem reforma hidráulica, retirada de materiais que não eram da estrutura original, como camadas de tinta e fezes de pombo, instalação de elevadores para fins de acessibilidade e recuperação de pisos (pelos próprios arquitetos que assinam os ambientes).

É o caso do taco na suíte da arquiteta Beatriz Quinelato, o granilite na sala projetada por Daniela Funari e as pastilhas brancas e azuis no banheiro assinado por Fernanda Zulzke. Os profissionais usaram da criatividade para criar diálogos com o tema e incorporar elementos da natureza local nos projetos.
Pode passar despercebido ao olhar desatento, mas as cores na casa de Mauricio Arruda tiveram um grande estudo prévio. A pesquisadora e artista, dedicada à investigação da flora tintorial brasileira, Maibe Maroccolo, coletou materiais de árvores para encontrar as tonalidades dos pigmentos e os tons cor respondentes na cartela da Coral, marca de tintas patrocinadora.
No jardim do escritório Kawai, há a obra Agglomerations, da artista Bruna Mayer, que cria um ecossistema dentro de cápsulas de vidro a partir de microrganismos obtidos no local, em constante transmutação até o fim da mostra.
O time de artistas apresenta mais duas convidadas: Juliana dos Santos, com uma série de cinco painéis feitos com pétalas em pó, aplicadas em um tecido por meio do sopro, que também sofrem ação da oxidação e mudam de aparência com o passar do tempo; e a renomada Regina Parra, que tem obra na coleção do Masp e chega ao evento com a instalação A Aterradora Liberdade.

A presença da arte, que se reforça a cada ano, também pode ser observada nos projetos. Uma novidade é a atuação próxima de curadores de arte junto dos arquitetos para elaborar a seleção de peças expostas. João Panaggio contou com a colaboração de Lurdinha Piquet para empregar obras de Artur Lescher, Lúcia Koch, Marcelo Silveira, Laura Vinci e mais.
Romário Rodrigues trabalhou com Cadeh Juaçaba para trazer criações de nomes como Vik Muniz, Ernesto Neto e Frans Krajcberg. A arte de Ivald Granato também está em pauta, com peças em dois ambientes, de Daniela Funari e João Armentano.
A operação da seção de arte é da Luciana Brito Galeria. A Forneria San Paolo e o Guilhotina Bar assinam a gastronomia do evento, junto das marcas Mesa Viva, Café Crema e Doce Arte, de alimentação e bebidas. As compras ficam por conta da Gustavo Eyewear, da Livraria Unisaber e da Feira na Rosenbaum.

Neste ano, a CASACOR abre e fecha mais cedo, na intenção de aproveitar o banho privilegiado de luz natural e respeitar as regras da vizinhança. A entrada acontece pela Rua Dona Ana Pimentel.
Pela primeira vez na história do evento, serão oferecidos ingressos gratuitos, às terças e quartas-feiras, a partir das 18h, por meio do site da mostra (sujeitos à disponibilidade na plataforma). A expectativa de público é de 115 000 visitantes.
O que fica pós-evento

A CASACOR realizou nos prédios 22 e 23 uma série de melhorias que vão ficar para o parque após o evento. São elas: limpeza interna, higienização das fachadas, implantação de acessibilidade por meio da instalação de elevadores, instalação de sistemas de proteção contra descargas atmosféricas, manutenção integral das coberturas e remoção de divisórias antigas danificadas por cupins.
O edifício 12 se insere no perímetro da mostra, mas não recebeu intervenções arquitetônicas, dispensando autorização específica. As construções 14, 30, 63 e 74, usadas apenas para apoio técnico e administrativo, não terão mudanças.

Nos jardins, as ações limitam-se à vegetação rasteira, com até 1,20 metro de altura, seguindo o plano de orientação do parque. As plantas existentes serão replantadas após o evento. As espécies nativas introduzidas pelos paisagistas poderão permanecer como doações ao espaço público, enquanto as não nativas são dispostas somente em vasos para fácil remoção após a mostra.
“Todas as construções realizadas são temporárias, totalmente reversíveis e seguem rigorosamente as diretrizes de tombamento. As árvores, também tombadas, não sofreram nenhum tipo de poda ou intervenção”, diz comunicado do diretor de operações da CASACOR, Darlan Firmato.
CASACOR 2025 — Parque da Água Branca. Rua Dona Ana Pimentel, 37. Ter. a dom., 11h/20h. R$ 121,00 e R$ 200,00 (visita guiada). Grátis ter. e qua., a partir das 18h. appcasacor.com.br.
Publicado em VEJA São Paulo de 23 de maio de 2025, edição nº 2945