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Avenida do Estado sofre à espera de projeto de reurbanização

Imóveis vazios e abandonados, terrenos sem uso, lixo, enchente e falta de circulação de pessoas são alguns dos problemas

Por Sérgio Quintella Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 1 nov 2019, 10h45 - Publicado em 1 nov 2019, 06h00

Com cerca de 11 quilômetros de extensão, a Avenida do Estado foi construída nos anos 30 para ser uma das principais ligações da capital com o ABC paulista. Da Marginal Tietê ao Viaduto Grande São Paulo, no Ipiranga, a via se deteriora a olhos vistos. Nessa região, galpões abandonados e terrenos vazios dão o tom do lugar. Na área central, a degradação se estende por todo o Parque Dom Pedro II até o acesso à Avenida Santos Dumont, passando pelo Mercado Municipal. As edificações que chegaram a ter sua importância, caso da antiga Mesbla, hoje se resumem a prédios em péssimo estado. Números da plataforma Urbit, que compila dados urbanos, mostram que a via possui 37 terrenos vazios, ou 34 000 metros quadrados, o equivalente a mais de cinco vezes a área que abriga o monumental Copan, no centro. Isso sem falar nas dezenas de imóveis construídos e largados ao léu.

Todo o cenário é acompanhado de cima por 8 quilômetros de via elevada do Expresso Tiradentes (o eterno Fura-Fila), que serpenteia o Rio Tamanduateí por grande parte de seu trecho paulistano e altera para pior a paisagem urbana. Embaixo, na região do Ipiranga, o canteiro é cercado por mato alto e muito lixo. Ali, moradores de rua armam suas barracas de lona e madeira.

É um local sem vida, que serve como mera passagem. A falta de atrativos da região, por onde trafegam 40 000 veículos diariamente e onde é raro ver pessoas caminhando ou comércio aberto em boa parte do trajeto, jogou para baixo o potencial de lançamento de empreendimentos imobiliários. Dados do Grupo Zap mostram que nenhum prédio residencial foi erguido na via (ou a até 200 metros dela) entre agosto de 2018 e julho de 2019, apesar de tantos espaços disponíveis. No período anterior, foram apenas 220 apartamentos, enquanto entre a metade de 2016 e a de 2017 foram 246. Como comparação, a Avenida Rebouças, que tem pouco mais de um terço do tamanho, registrou em dois anos mais de 2 000 unidades novas.

Na altura do número 5533, o cenário destoa. Trata-se do entorno da Rua Dona Ana Neri, na Mooca, onde há uma agência do Banco Itaú em área de 90 000 metros quadrados. Perto ficam pelo menos trinta restaurantes e comércio que giram ao redor dos 6 000 funcionários. A mesma movimentação positiva deve acontecer depois de iniciativas que vão ocupar áreas. Caso de um shopping popular próximo à Rua São Caetano, no centro, que substituirá a antiga Feira da Madrugada. Serão 4 000 boxes, 1 000 lojas, praça de alimentação e estacionamento.

Também foi um sopro de esperança o lançamento, em 2015, da Operação Urbana Bairros do Tamanduateí, que engloba áreas que margeiam o rio, como Mooca, Ipiranga e Cambuci. A então gestão Haddad pretendia vender a permissão para a construção de 6 milhões de metros quadrados nos arredores, e arrecadar com isso 6,5 bilhões de reais. Com a dinheirama, o projeto prevê 955 000 metros quadrados de área verde (equivalentes aos parques da Aclimação e Villa-Lobos juntos) e a construção de 20 000 apartamentos para famílias de baixa renda. “A região desperta grande interesse no mercado imobiliário”, acredita o secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando Chucre. Mas a empreitada ainda não saiu do papel. Em banho-maria na Câmara Municipal, poderá entrar na pauta de votação no ano (eleitoral) que vem, quando as atenções por lá se voltarão mais para a reeleição dos vereadores.

A relação da cidade com um dos seus principais rios, seus 43 afluentes e, claro, com a Avenida do Estado nunca foi fácil. Porta de entrada da metrópole no fim do século XIX, quando eram usadas como área de lazer e contavam até com a Ilha dos Amores, uma ilhota com quiosques, as águas antes sinuosas e já poluídas do Tamanduateí historicamente se voltaram contra sua várzea (mal) habitada. Em 1919, uma enchente no Ipiranga fechou por vários dias 2 quilômetros da linha do trem que ligava a capital a Santos. Cem anos depois, em março de 2019, no mesmo bairro, as águas subiram e inundaram dezenas de ruas próximas ao rio. Em uma delas, um condomínio com mais de 100 apartamentos teve de ser evacuado por dois meses. A criação dos parques, entre outras medidas ambientais previstas na operação urbana, ajuda a melhorar a drenagem da água das chuvas e a evitar que tudo se repita daqui a 100 anos. Enquanto isso, a Avenida do Estado ainda espera.

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Altos e baixos

Histórias do passado e planos para o futuro da Avenida do Estado

Vila operária construída em 1908: reforma necessária (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Vila Economizadora

Construída em 1908 na esquina da Avenida do Estado com a Rua São Caetano, a vila operária passou por anos de degradação até ser reformada, em 2014. Tombado pelos conselhos estadual e municipal de defesa do patrimônio, o local possui 134 casas e deverá ser objeto de uma nova intervenção. O projeto do arquiteto Dimitre Gallego, custeado por emenda parlamentar do vereador José Police Neto (PSD), prevê reforma da única quadra esportiva do pedaço, que também é usada por vizinhos da vila.

Antigo posto da Avenida do Estado foi ‘engolido’ por novas construções (Reprodução/Alexandre Battibugli/Veja SP)

Pergunta no posto

“Sua moderníssima, linda e impressionante instalação constitui em um novo melhoramento urbano”, diz o convite para a inauguração do Auto Posto S. Paulo, de 1933. A situação do local difere muito da atual condição em que a antiga estrutura, vizinha ao Mercado Municipal, se encontra. “Engolida” por um puxadinho utilizado por empresas varejistas, a edificação circular era um dos chamarizes da propaganda.

Projeto da construção do Sesc Parque Dom Pedro, para 2024 (SESC/Divulgação)

Um novo Sesc, mas apenas em 2024

No lugar do Edifício São Vito, demolido em 2010, a nova unidade do Sesc Parque Dom Pedro, em frente ao Mercado Municipal, deverá ficar pronta apenas em 2024. O terreno foi cedido ao Sesc em 2015, mas as obras só começam no ano que vem. Serão 29 800 metros quadrados divididos em seis pavimentos. Haverá três piscinas, ginásio, área de exposições e café. “Nossa expectativa é atrair 5 000 pessoas por dia”, afirma Danilo Miranda, diretor do Sesc São Paulo, que calcula o valor da obra em 150 milhões de reais.

Fechado por tijolos, edifício abandonado tenta evitar ocupação irregular (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Só o esqueleto

Com quase 1 000 metros quadrados de área construída, o prédio localizado no número 3003 está com as portas fechadas com tijolos para evitar invasões. Tem potencial para ser utilizado tanto como residência quanto como comércio.

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Segundo Batalhão de Guardas, no Parque Dom Pedro: abandono desde 1997 (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Abandono da São Paulo colonial

De fora, a cena até engana, mas é só dar uma espiada mais atenta para ver a situação de abandono do antigo quartel do Segundo Batalhão de Guardas, no Parque Dom Pedro. Rara construção do século XVIII na cidade, o espaço tombado de 15 000 metros quadrados está fechado desde 1997, quando deixou de abrigar o 3º Batalhão de Choque da PM. Viaturas velhas ocupam seu pátio, e ninguém trabalha lá.

Produtor cultural Alex Tessitore, tem novos projeto para a Praça Cívica Ulysses (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Shows na Ulysses Guimarães

A ideia de transformar uma área degradada em um espaço descolado de lazer e cultura foi um dos motivos que levaram o produtor cultural Alex Tessitore, 45, a iniciar um projeto de qualificação da Praça Cívica Ulysses Guimarães, entre a estação Pedro II do metrô e o Museu Catavento. Após vencer um chamamento público, ele arregaçou as mangas, levantou 300 000 reais via lei de incentivo e começou a ocupar uma área de 2 700 metros quadrados. Lá haverá estruturas itinerantes que serão usadas em shows e apresentações musicais. Até um palco será montado. “Só falta convencer as pessoas a vir para cá”, diz Tessitore, que planeja uma festa de réveillon no espaço.

Nova construção, na altura do Cambuci, dá as costas para a Avenida do Estado (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Muralha, de costas

Os (poucos) prédios erguidos no entorno nos últimos três anos começam a lançar mão das diretrizes do Plano Diretor, aprovado em 2014, como a utilização do térreo das edificações por comércios, a chamada fachada ativa. Neste caso, no entanto, o empreendimento na altura do Cambuci dá as costas à avenida, com andares de garagem e entrada por outro lado.

Canteiro que separa a via do Rio Tamanduateí serve de abrigo para pessoas em situação de rua (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Morando na beira do rio

No trecho do Ipiranga da Avenida do Estado, no sentido ABC, o canteiro que separa a via do Rio Tamanduateí serve de abrigo para dezenas de moradores de rua. No caso acima, o morador sai da cabana improvisada com madeira e lona para vender chocolates aos motoristas que trafegam pela avenida.

Sem vazão suficiente, o Rio Tamanduateí enche a avenida e as casas em dias de chuva (Reprodução/Veja SP)

Choveu, encheu

Em março deste ano, a Rua do Manifesto (ao lado), no Ipiranga, encheu-se de água após chuvas torrenciais. Em bairros vizinhos, o Rio Tamanduateí também deixou sua marca. Um shopping na Vila Prudente ficou alagado e vários carros foram danificados. O rastro de destruição chegou ainda ao ABC paulista.

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Publicado em VEJA SÃO PAULO de 06 de novembro de 2019, edição nº 2659.

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