Cade multa o Iguatemi e esquenta a disputa entre os gigantes do consumo
Punição se deve a contratos de exclusividade com lojas; shopping vai recorrer
Uma decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) jogou mais lenha na fogueira da já inflamada briga entre os shoppings paulistanos. Na última terça-feira, o órgão multou o Iguatemi em 2% de seu faturamento de 1996 – cerca de 1 milhão de reais – pelo fato de este não permitir que seus lojistas se instalem em centros de compras concorrentes. A determinação libera agora 280 das 330 lojas do Iguatemi a abrir filiais em outros locais e acirra a disputa entre os gigantes do consumo. Essas marcas têm em seu contrato com o shopping a chamada cláusula de raio, que as impede de ter unidades num raio que varia de 1 a 5 quilômetros a partir do Iguatemi. “Consideramos a prática abusiva porque ela limita demais a concorrência”, afirma Luís Fernando Rigato Vasconcellos, conselheiro relator do Cade.
Primeiro shopping de São Paulo, inaugurado em 1966, o Iguatemi deve recorrer da decisão na Justiça. “Acho que o Cade julgou o assunto de maneira equivocada, já que essa cláusula é amplamente usada por outros shoppings do mundo”, diz o presidente do grupo, Carlos Jereissati Filho. Segundo seu advogado, Carlos Francisco de Magalhães, o órgão baseou seu parecer num dado que não corresponde à realidade. “O Cade diz que o Iguatemi tem ampla vantagem no comércio, por deter 20% do mercado de shoppings da cidade”, diz. “Mas a verdade é que o grupo responde hoje por menos de 8% desse mercado.” Em troca da garantia de exclusividade, algumas marcas-chave ganhariam benefícios como desconto no aluguel ou no condomínio e ajuda na criação de campanhas promocionais ou reformas.
Os assédios são constantes. Quando o Shopping Pátio Higienópolis foi inaugurado, em 1999, o restaurante Gero Caffè recebeu um convite para montar ali uma filial. Não pôde ir por causa de seu compromisso com o Iguatemi. No início de 2006, a grife Siberian abriu uma unidade no vizinho Eldorado, desrespeitando a tal cláusula de raio. O Iguatemi, então, reagiu com uma ação de despejo contra a loja, ainda não julgada. Essa medida motivou o Eldorado a entrar com uma representação no Cade há quatro meses. “É o empreendedor que tem de decidir se quer ou não abrir franquia em outro shopping, não o Iguatemi”, afirma o advogado do Eldorado, José Del Chiaro. “A prática torna o lojista refém e limita as opções do consumidor.”
Não é a primeira vez que o Iguatemi vai parar no banco dos réus do Cade. Em 1997, a Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop) já se incomodava com as cláusulas de raio e as denunciou. O processo foi arquivado, mas o Jardim Sul retomou a batalha três anos depois. Em 2004, o Cade julgou que 97 contratos de locação faziam restrição ao Jardim Sul e condenou o Iguatemi. Mas o grupo Jereissati levou a batalha à Justiça e conseguiu uma liminar que manteve os contratos de exclusividade.
O Iguatemi é o segundo shopping da cidade a ser condenado pelo Cade. Em 2002, o Center Norte foi obrigado a retirar a cláusula de raio que impedia alguns lojistas de abrir franquias no vizinho Shopping D. Agora, está às voltas com um processo de indenização por perdas e danos movido pelo concorrente. “A condenação do Iguatemi deve abrir caminho para que contratos de outros shoppings sejam esquadrinhados”, diz o advogado especialista na relação lojistas-shopping centers Mário Cerveira Filho. O Cade já recomendou que a Secretaria de Direito Econômico (SDE) investigue cinco centros de compras paulistanos – Pátio Higienópolis, Morumbi, West Plaza, Paulista e Vila Olímpia – que teriam incluído em seus contratos a cláusula de raio. Tudo indica que outros rounds virão.