Ganhei uma camiseta. Não tem bolso. Uma camiseta sem bolso tem sua utilidade limitada à função de vestir – desculpe se pareço mal-agradecido. Com o bolsinho, ela serve mais, acrescenta ao vestir o levar alguma coisa: óculos, cartão, anotação, caneta, talão de cheques, palpite da Mega-sena.
Bolsos das calças não servem para essas coisas, quebram ou entortam os óculos, deformam ou racham cartões de plástico, partem canetas ou elas nos espetam, amarrotam o volante da loteria, são difíceis de alcançar enquanto estamos dirigindo um automóvel. No bolsinho da camiseta essas coisas se acomodam bem. Sentado no carro, onde enfiar rapidinho o tíquete do estacionamento do shopping para procurar a vaga? Li no jornal que um homem escapou da morte porque uma caneta no bolso da camisa desviou a bala destinada ao coração. Não digo que bolsinhos e seu conteúdo sejam um bom escudo, estou só lembrando o caso, de passagem.
Gosto de bolsos. O homem que inventou as calças jeans no século XIX, Levi Strauss, foi previdente. Imaginou que os homens do futuro, nós, sem paletós nem coletes, iríamos ficar com a vida complicada se não tivéssemos bolsos suficientes, pois iríamos ter muita miudeza para levar conosco, e bolou logo cinco bolsos. Imaginem os jeans sem eles: não teriam pegado.
Houve um tempo, sim, em que os homens citadinos tinham, na soma das roupas que vestiam, muito mais bolsos, e curiosamente era um tempo em que talvez carregassem menos coisas consigo. Bolsos tinham um sinônimo até mais usado: algibeiras. As roupas masculinas somavam uma dezena deles, ou mais. Vamos contar. Nas calças, pelo menos dois laterais e dois traseiros. São quatro. Usavam coletes: estes tinham dois bolsinhos na barriga e um do lado esquerdo do peito. São sete. Usavam paletós: duas algibeiras maiores dos lados, um bolsinho no lado esquerdo do peito, onde ia o lencinho fino, mero detalhe elegante, e pelo menos dois maiores internos, no forro, um de cada lado. São mais cinco, com sete: doze. Doze bolsos.
E que levavam esses homens, na época dos coletes? Relógio de bolso, caixinha de rapé, um ou dois charutos, moedas, eventualmente óculos, lenço, lápis ou caneta-tinteiro, algum papel… – algo mais? Consta na cultura geral da língua que nos bolsos dos coletes se levavam soluções mágicas para os problemas, sacadas criativas em que ninguém tinha pensado. Dizia-se com alguma admiração para alguém que apresentava uma solução inesperada: “Essa você tirou do bolso do colete”. Também se tirava desse bolsinho algum nome salvador para resolver um impasse político. Donde se conclui que os coletes tinham bolsos para neles se levarem surpresas.
Para que mesmo os antigos precisariam de tantos bolsos? Não havia talão de cheques, cartão do banco, cartão de crédito, cartão do convênio médico, cartão de refeição, passe do ônibus, Carteira Nacional de Habilitação, cartão do seguro, RG, CPF, telefone celular, chaveiro cheio, iPod, pen drive, boletos bancários, óculos de sol… Livros de bolso só foram inventados mais tarde, e nunca ouvi dizer que alguém levasse livro no bolso.
Houve uma época, recente, em que tentaram habituar os homens a usar bolsas a tiracolo. Não deu certo. As fotos da época, anos da década de 1970, mostram homens desajeitados com aquela tira de couro atravessada no peito, senhores de paletó e gravata com aquele sacolão pendurado do lado. A bolsa prejudica a agilidade do homem, atrapalha a corrida, estorva a reação dos muito machos a provocações, tchê.
Por que fizeram as roupas das mulheres sem bolsos? Desde o começo os inventores da moda pensaram na mulher para vender bolsas. Só a mulher teria coragem de pagar mais de 20 000 reais por uma delas.