Jorge Forbes dá dicas para ter paz dentro e fora das redes sociais
Confira as dicas da seção 'A Tal Felicidade' desta semana

VÍCIO CONECTADO
A maneira como construímos nossa identidade passou de uma estrutura vertical, baseada em modelos exemplares de grandes homens e mulheres maravilhosas, para uma estrutura horizontal, na qual a identidade de cada pessoa vai se construindo e se refazendo a todo instante. A vida não tem mais piloto automático, nós nos transformamos em GPS ambulantes. Nisso, o contato com o outro é fundamental, e as redes sociais são a plataforma desse exercício. O problema se dá quando as pessoas ficam vidradas no celular, renovando a esperança de um “agora vai”, “agora acertei”, “era isso que me faltava”.
DESCOMPASSO PLANETÁRIO
Vivemos por 2 500 anos em culturas de laços sociais verticais que nos davam padrões de bom e de mau comportamento, de disciplina, de hierarquia, de método. Este novo momento da humanidade, que chamo de TerraDois, é um verdadeiro tsunami que traz flexibilidade, criatividade, multiplicidade, mas também uma grande angústia diante da responsabilidade subjetiva que exige. Enquanto não aprendermos a viver o momento atual, a raiva, a queixa, a violência inusitada ficarão nos alertando sobre o nosso descompasso.
PAVOR DE FAZER ESCOLHAS
Quando há dez possibilidades e escolhemos uma, a única certeza que temos é que perdemos nove. Isso apavora. As pessoas se sentem estressadas por querer ficar com todas as dez.
LUTA VIRTUAL
A agressividade está à solta. Vivemos uma mudança de época. Temos novos sintomas e tentamos tratá-los com velhos remédios. Não funciona, e abre-se o caminho para a agressão. As redes sociais são um ótimo ringue no qual as pessoas expressam sua violência na certeza irresponsável da inconsequência.
DISPUTAS OFF-LINE
Quando as discussões virtuais são transferidas para a realidade de “carne e osso”, elas tendem a se acalmar. O olho no olho é mais sensível e comprometido que a tecla na tecla. Deletar uma pessoa da vida, sem uma palavra, é expressão de uma nova covardia.
BANDEIRA BRANCA
Temos de sair do perverso jogo sadomasoquista do “ataco — sou atacado — revido”, e assim por diante. Não parece, mas isso é um gozo mortífero. Há que dar um basta e ter capacidade de conquistar uma satisfação mais implicada e consequente.
O FUTURO TEM JEITO?
Estamos em um mundo no qual tudo é novo. Não sabendo ainda encontrar o seu lugar nessa nova configuração da civilização humana, a pessoa se defende em sua concha raivosa, narcísica. Isso vai se modificar à medida que aprendermos a viver e a usufruir essa nova TerraDois.
CELULAR EM CINCO BREVES DICAS
Não fale nem escreva ao léu. Por mais incrível que uma pessoa se ache, é sempre bom respeitar o interlocutor e a si mesma.
Diga tudo claramente, sem rodeios. Sua singularidade é sempre mais atraente que lantejoulas verbais e qualquer lugar-comum.
Desligue alarmes inúteis de chegada de mensagens. Não viva em um estado de prontidão alarmada.
Só fique em grupos que realmente lhe interessem, não permaneça neles por aparência ou constrangimento.
Não dê consistência à agressividade do outro, nem mesmo à sua. Se precisar de alguém para bater, compre um saco de boxe e desligue o celular.
Jorge Forbes é psicanalista e médico psiquiatra. Preside o Instituto da Psicanálise Lacaniana (Ipla). É autor de inúmeros artigos e livros, tendo recebido o Prêmio Jabuti. Criou e apresenta o TerraDois, na TV Cultura, que ganhou o prêmio APCA de melhor programa da televisão brasileira em 2017. Gosta de estar na grande praça virtual do Twitter, mas no dia a dia usa mais o Instagram, plataforma na qual compartilha fotos de obras de arte, cenas curiosas de viagens e sua visão profissional sobre o cotidiano.