A crítica de João Apolinário e um relevante registro do teatro paulistano
Um jeito de escrever direto, sem meias palavras, tão enfático e explícito que era capaz de ser compreendido pelo leitor minimamente letrado. Assim podiam ser definidos os textos do crítico teatral João Apolinário Teixeira Pinto (1924-1988) publicados na Última Hora. Jornalista e poeta português, ele viveu em São Paulo entre dezembro de 1963 e abril […]
Um jeito de escrever direto, sem meias palavras, tão enfático e explícito que era capaz de ser compreendido pelo leitor minimamente letrado. Assim podiam ser definidos os textos do crítico teatral João Apolinário Teixeira Pinto (1924-1988) publicados na Última Hora. Jornalista e poeta português, ele viveu em São Paulo entre dezembro de 1963 e abril de 1975. O livro A Crítica de João Apolinário – Memória do Teatro Paulista de 1964 a 1971 reúne 332 ensaios e 329 imagens. Dividida em dois volumes, a obra faz um relevante registro do que foi visto nos palcos paulistanos nesse período inicial da ditadura militar e também da carreira de nomes célebres como Paulo Autran, Maria Della Costa, José Celso Martinez Corrêa, Fernanda Montenegro e Gianfrancesco Guarnieri. O lançamento está marcado para a quarta (15), às 20h, no Tuca, em Perdizes. E que seja redescoberto um estilo de crítica que também passa pela revolução social, cultural e política.
Entrevista:
Maria Luiza Teixeira Vasconcelos, historiadora, viúva do jornalista e organizadora de A Crítica de João Apolinário – Memória do Teatro Paulista de 1964 a 1971.
Por que é tão importante trazer à tona os textos de João Apolinário?
Apolinário escrevia de uma forma singular, de um jeito muito próprio. Sempre foi um homem extremamente culto e jamais usou uma linguagem acadêmica. Ele se valia de noções de método e de sua bagagem filosófica para explicitar ideias em relação aos espetáculos. E isso levava qualquer leitor a entendê-lo.
Qual era o método dele para tornar a leitura tão acessível?
A linguagem era muito próxima do coloquial. Assim como na vida, Apolinário era muito enfático como crítico. Por isso, o leitor jamais ficava em dúvida se ele gostou ou não de um espetáculo. Apolinário se apoiava em uma tese e dava a antítese, que representava a ideia do encenador do espetáculo. Para fechar o artigo, trazia uma síntese, que é a interpretação do crítico. O Apolinário não analisava o texto escolhido pelo grupo, analisava a encenação proposta para aquele texto.
Apolinário chegou ao Brasil fugindo da ditadura portuguesa. O golpe militar de 1964 veio três meses depois. Isso deve ter causado um forte abalo, não?
A vida dele foi muito irônica e de uma perversidade tremenda. O mais terrível é sua chegada ao Brasil em dezembro de 1963 com o sonho de respirar ares de liberdade pela primeira vez. Afinal, ele nasceu em 1924 já sob uma ditadura. Teve pouco mais de três meses para desfrutar disso por aqui. Mas por outro lado essa bagagem cultural aliada à vivência política foi um grande diferencial como jornalista.
O estilo dele era diferente do de Décio de Almeida Prado e Sábato Magaldi, dois dos nossos maiores críticos, mas de uma formação mais elitista, não?
Sem dúvida, era um contraste. Os textos de Décio de Almeida Prado e Sábato Magaldi conversavam diretamente com um leitor de tradições teatrais, de elite. Apolinário costumava dizer aos seus leitores: “você faz parte da mesma elite que eu faço, mas eu falo com uma linguagem que todos podem entender”. Ele queria tentar levar também um outro público ao teatro.
Você o acompanhava na rotina de ver peças de teatro?
Apolinário começou a fazer parte da minha vida como crítico em 1967. Antes já lia algumas coisas no jornal, claro, mas tinha outra percepção. Eu o acompanhava ao teatro sempre que podia. Só faltava nas duas noites em que dava aulas. Nas demais, eu me adequava a sua agenda. Se havia cinco peças na semana, lá estava eu também. Foi uma experiência muito interessante e proveitosa como professora de História. E acredito que para meus alunos também.