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O lucrativo mercado do sexo na cidade

As histórias surpreendentes e as estratégias dos empresários do ramo erótico na capital, um setor que dribla a crise e espera crescer 8,5% em 2015

Por Ana Carolina Soares
Atualizado em 1 jun 2017, 16h38 - Publicado em 5 set 2015, 02h56

No sofá mais vistoso de um espaço de eventos em Pinheiros, Gabriela Natalia Silva, de 24 anos, senta-se pelo menos uma vez por semana e fala com calma a uma plateia de doze mulheres, na maioria quarentonas animadas. A jovem dá palestras sobre sexo com ares de quem tem muita quilometragem no assunto. Apesar de ter se formado em letras, pela Universidade Federal de São Carlos, em 2012, nunca atuou na área. Desde a adolescência até alguns meses atrás, trabalhou como prostituta. Lola Benvenutti era seu nome de guerra (ela cobrava em média 400 reais pela hora do encontro).

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No começo de 2015, ganhou uma aliança de noivado do milionário americano Gerald Blake Lee, cofundador da Azul Linhas Aéreas, e trocou o ofício mais antigo do mundo pelo mestrado em educação sexual na Universidade Estadual Paulista. Em agosto do ano passado, lançou uma autobiografia, O Prazer É Todo Nosso, que teve aproximadamente 20 000 exemplares vendidos. Essa trajetória instiga as aprendizes.Na turma da ex-garota de programa, por exemplo, todas as participantes querem truques para chamar a atenção do marido, manter o namorado, e algumas buscam orientação para descobrir o caminho do próprio orgasmo. “A gente precisa se amar primeiro, não adianta virar uma gueixa só para prender um cara na cama”, aconselha Lola.

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A mestra se mantém sentada, com as pernas cruzadas e à mostra por uma fenda insinuante da saia, e mal se mexe durante todo o curso. Diz que o segredo de um bom strip-tease é a “artista” pôr uma de suas músicas prediletas (“A gente precisa ficar à vontade, não se encanar com a plateia”). O ponto alto ocorre nos quarenta minutos finais, quando abre um hard case prateado com uns 10 quilos de acessórios (tem até vibrador com design de joia banhado a ouro, cotado em 54 000 reais). A palestra dura quase três horas. Em média, ela faz sete dessas por mês em diversas casas de eventos em São Paulo e em outros estados (por sigilo, a maio­ria dos endereços é divulgada somente aos inscritos). Lola recebe de 2 000 a 4 000 reais por evento.

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Há também os alunos particulares — são quinze, em boa parte casais —, que desembolsam mais ou menos 500 reais por hora. Em um bom mês, ela consegue 30 000 reais com sua consultoria. “É um pouco mais do que eu ganhava com minha antiga profissão”, diz.A virada de Lola espelha um negócio em alta na cidade: o mercado do prazer. Em 2015, num período de recessão na economia, prevê-se que o consumo de loções excitantes, géis com sabor, lingeries sensuais e demais artigos da linha movimente 345 milhões de reais na Grande São Paulo, segundo dados da Associação Brasileira das Empresas do Mercado Erótico e Sensual (Abeme). Somando o faturamento estimado dos motéis (162 milhões de reais) e dos fabricantes de preservativos (29 milhões de reais), o “comércio do desejo” salta para 536 milhões de reais.

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A título de comparação, é um pouco mais que a receita anual da CBF, dona de outra paixão nacional, o futebol. A cifra de 536 milhões de reais não parece grande coisa perto do que é amea­lhado por setores mais tradicionais, como o comércio varejista, com uma projeção de 99 bilhões de reais nestes doze meses de crise, de acordo com dados preliminares da Associação Comercial de São Paulo. Mas, enquanto esse ramo chora uma quase estagnação de 0,54% em 2015, os empresários de artigos sensuais festejam um crescimento de 8,5% no mesmo período. “Em tempos difíceis, as pessoas buscam diversão em casa”, explica Paula Aguiar, presidente da Abeme. “Sai mais em conta.”O mercado nacional do setor atingirá em 2015 a cifra recorde de mais de 1 bilhão de reais em receita (estão contabilizados aqui apenas os negócios legalizados).

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A capital e a região metropolitana respondem por 20% desse movimento. Alguns nichos ficam acima da média. Mais da metade dos sites de e-com­mer­ce, blogs e páginas de sexo, por exemplo, opera daqui. “Acredito que a crise tenha feito várias marcas apostar no segmento digital”, diz Jaqueline Barbosa, 26, ex-tra­du­to­ra. Depois de largar sua carreira, em 2010, ela abriu, ao lado do marido, Emerson Viegas, 32, ex-publicitário, um canal no YouTube sobre relacionamentos e sexualidade, o Casal sem Vergonha. “Éramos conselheiros do relacionamento dos amigos e vimos nisso uma oportunidade de negócio”, conta Jaqueline. Deu certo. Com mais de 5 milhões de leitores por mês, hoje o site fatura 3 milhões de reais a cada ano com anúncios e ações publicitárias.Além de crescer em São Paulo, o mercado do sexo começou a perder um pouco o ar de clandestinidade.

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A primeira boate de suingue na capital, a Marrakesh, surgida há dezoito anos em Moema, funcionou nos primeiros tempos no esquema propaganda boca a boca. Atualmente, convive com oito casas do gênero, boa parte delas fincada no mesmo bairro da Zona Sul. Nos últimos tempos, virou balada alternativa de jovens casais e tem até matinê para os compromissados que desejam frequentar os espaços dando como desculpa em casa a happy hour com amigos. Outro show erótico tradicional na metrópole, o Clube das Mulheres, existe há mais de duas décadas, tendo entre as principais freguesas as noivas em despedida de solteira. No ano passado, ganhou um concorrente, o The Secret’s Club, que a partir desta quinta (10) funcionará em uma casa em Santana.As sex shops também começaram a sair da penumbra. Na Avenida Ipiranga com a Avenida São João fica o endereço do gênero mais antigo do país, a Darme, aberta em 1984. Hoje, tem a companhia de mais de 2 000 estabelecimentos do tipo na cidade.

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Os produtos mais procurados, os cosméticos, custam em média 16 reais. Em Moema e nos Jardins estão as butiques especializadas mais luxuosas do país, além de lojas de lingerie que também oferecem artigos íntimos. Existe até uma especializada em evangélicos no município de Jandira, na Grande São Paulo. Ex-bancário e ex-dona de casa, o casal João Ribeiro e Lídia surpreendeu sua família há cinco anos, quando deixou a crise econômica em Lisboa e inaugurou a Secret Toys. Ambos também atuam como consultores de casais (heterossexuais) em toda a região. “Está na Bíblia: cônjuges unidos pela bênção de Deus devem fazer sexo”, prega João. Apesar disso, os dirigentes de sua igreja pedem a eles que não divulguem a denominação. “Aprovam nossa atividade, mas não querem o nome vinculado a nós”, diz o empresário.

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Apesar da restrição, eles devem faturar 4 milhões de reais em 2015 e projetam um crescimento de 15%. A diferença do acervo da Secret Toys para o de uma loja tradicional é pequena: não há produtos para sexo anal e a paleta de cores aposta no branco e no azul (o clássico nas lojas é o vermelho vibrante). “Atualmente, os evangélicos representam 30% dos consumidores de sex shop”, afirma Paula Aguiar, da Abeme. Tamanha a demanda, a Intt, fabricante de cosméticos sediada no Morumbi, elaborou uma linha voltada especialmente aos fiéis. Chama-se In Heaven (no céu, em inglês) e tem como logotipo uma pomba, um símbolo santo. “Essas mercadorias são um dos nossos carros-chefe”, conta Alessandra Seitz, dona da marca. Ela vai apresentar esses e outros lançamentos na primeira edição da Íntimi Expo, a nova feira do segmento na cidade.

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A mostra acontece entre 25 e 27 de setembro no Anhembi, com uma expectativa de negócios estimada em 17 milhões de reais. A cifra é semelhante à contabilizada pela Erotika Fair, realizada na capital desde 1997, que fatura em torno de 18 milhões de reais por ano. “A crise passou longe daqui”, comemora Susi Guedes, idealizadora da Íntimi Expo.Quem também possui motivos para comemorar é Daniel Passos, de 34 anos. Hoje, ele comanda a maior empresa de e-com­mer­ce do setor no país, a Loja do Prazer, com 46 000 produtos vendidos por mês e faturamento ava­lia­do em 16 milhões de reais neste ano. Em 1999, largou o salário de 5 000 reais de gerente de e-com­mer­ce em uma seguradora e abriu a sex shop virtual. Na época, vivia na casa dos pais, no Jabaquara, e fazia da edícula do sobrado o estoque de sua startup. Eles acharam estranho quando chegaram as primeiras caixas: bonecas infláveis, algemas, máscaras, próteses… Meses depois, a mãe, a dona de casa Suely Saladino, notou que não havia nenhum pecado nisso e se ofereceu para cuidar do dinheiro.

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Até hoje, aos 62 anos, é a diretora financeira da companhia. O e-commerce vingou, migrou para um prédio de três andares, 1 000 metros quadrados cada um, no Jabaquara e se tornou um dos principais do ramo também na América do Sul. “Aos poucos, o público percebe que se trata de um consumo saudável. Somos um nicho ainda bem pequeno e temos muito a desenvolver”, avalia Passos. Em cada dez paulistanos, três costumam ir às compras de produtos ou buscar terapias para apimentar a relação ou ajudar na satisfação pessoal, segundo estimativas do mercado. Parece pouco, principalmente em comparação com cidades como Tóquio (oito em cada dez pessoas) e Nova York (em uma proporção de seis por dez). “Há muito espaço para evoluir”, entende Evaldo Shiroma, idea­li­za­dor da Erotika Fair.

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Ele planeja construir um parque de diversões temático, o ErotikaLand, em parceria com os empresários Paulo Meirelles e Mauro Morata, sócios da Soft Love, fábrica de cosméticos e próteses. Com 80 milhões de reais de investimento, a área de aproximadamente 150 000 metros quadrados deverá ter uma piscina de nudismo, museu de arte sen­sual, cinema erótico e até um castelo fantasma misturando terror e libertinagem. O grupo programa inaugurar a empreitada em 2017 em uma cidade do interior, a uma hora e meia de São Paulo (as opções em estudo estão na região de Piracicaba). “Queremos atrair todo o público no Brasil e na América Latina”, afirma Shiroma, já sonhando com os lucros da sua Disneylândia erótica. 

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