‘Vestido de Noiva’ volta aos palcos pelas mãos de Eric Lenate
O encenador também vive um vampiro ao lado de Cléo De Páris em ‘Nosferatu’
Formado no CPT de Antunes Filho, Eric Lenate, 31 anos, despontou na direção em 2008 com O Céu Cinco Minutos Antes da Tempestade, e desde então seu trabalho como encenador vem chamando a atenção, em espetáculos como Amor de Mãe – Parte 13 e Rabbit. Agora, o paulista de Guarulhos, dá um novo e ousado passo na sua carreira com a estreia de Vestido de Noiva, um divisor de águas do teatro brasileiro. A temporada segue até dezembro no Teatro do Núcleo Experimental, na Barra Funda.
Levado ao palco em 1943 por Ziembinski, o texto de Nelson Rodrigues (1912-1980), que em dezembro completa setenta anos, é uma montagem fragmentada, na qual os três planos pelos quais transitava a personagem Alaíde (vivida por Evangelina Guinle) – alucinação, realidade e memória – eram apresentados com cenário e iluminação inovadores. Setenta anos depois, é a vez de Lenate reinterpretar a obra com uma encenação que fecha o ciclo de comemorações do centenário de nascimento do dramaturgo carioca.
“Transformamos os planos da montagem original em dimensões que se interpenetram, se confundem”, explica o encenador, que lança mão de projeções e vídeos (assinados por Larte Késsimos, também presente na encenação), para narrar o acidente da protagonista (Gabriela Fontana) pouco após o matrimônio e o encontro com a misteriosa Madame Clessy (vivida por Lavínia Pannunzio), de forma contemporânea, “ainda que ortodoxa”, ressalta. Diferente da versão livre, recentemente encenada pelo Grupo XIX de Teatro, em colaboração com o dramaturgo Alexandre Dal Farra, a montagem de Lenate segue à risca a dramaturgia de Rodrigues.
“Não mudamos uma vírgula do original, com exceção da ordem de uma cena ou outra, para favorecer o ritmo. Nelson não dá trégua, tem um estilo de escrever quase cinematográfico, cheio de cortes secos e transições. O diretor que lide com isso”, brinca Lenate, que se sente desafiado pelo projeto. “Cheguei a pensar que era uma obra datada, mas me enganei completamente. O texto é uma criança de seis anos de idade que dá piruetas e nos prega peças. Aceitei o convite de dirigir a peça com as mãos tremendo”, afirma o diretor, que já havia enfrentado o dramaturgo com uma montagem de Valsa Nº 6 no ano passado.
Entre um e outro ensaio de Vestido de Noiva, o diretor volta à função de ator ao lado de Cléo De Páris em Nosferatu, em cartaz no Sesc Consolação desde quinta (19). Apesar do nome fazer referência ao clássico vampiro do filme de Murnau, Lenate explica que interpreta um outro tipo de vampiro. “É uma entidade que suga e consome as energias alheias. Estamos fugindo dos estereótipos cinematográficos, mas ainda é um personagem que representa o mal e a monstruosidade”, observa. A peça, uma costura de textos escritos por Cléo e publicados em seu blog, é dirigida por Fábio Mazzoni, que optou por iluminar o palco apenas com a luz de velas.
Mergulhado nos dois projetos, Lenate não arranja tempo para pensar em trabalhos futuros – o que fez, inclusive, fez com que se afastasse do Núcleo de Artes Cênicas do Centro de Cultura Judaica, recentemente criado por Lee Taylor. “São dois trabalhos muito sensíveis, que exigem muita dedicação e deixam marcas. É como se eu estivesse voltando a fazer teatro do zero.”