‘Caboclo foi o melhor presidente da CBF para o futebol feminino’, afirma Formiga

No entanto, jogadora da seleção e do São Paulo diz ser contra situações de assédio das quais dirigente afastado é acusado

Por Sérgio Quintella Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 27 Maio 2024, 19h58 - Publicado em 2 jul 2021, 06h00
A imagem mostra Formiga, com uniforme da seleção brasileira, em um fundo azul. Ela olha para cima.
Formiga, em preparação para Tóquio: foco e fuga das redes sociais (Naomi Baker FIFA/Divulgação)
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Prestes a disputar sua sétima Olimpíada, a volante Miraildes Maciel Mota, a Formiga, 43, retornou há duas semanas ao time feminino do São Paulo, seu segundo clube na carreira, depois de quatro anos no Paris Saint-Germain, da França. Diz que espera jogar no estádio do Morumbi, não em campos menores, como ocorre na maioria das disputas do futebol feminino no Brasil, e afirma que os antecessores de Rogério Caboclo na presidência da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) não permitiam que as jogadoras utilizassem a academia e a sauna da concentração na Granja Comary, em Teresópolis. “Só podíamos usar os campos e os dormitórios. O melhor era sempre reservado para os homens.”

Qual a diferença entre o futebol feminino no Brasil e na França, sua última casa?

Na Europa, em geral, a estrutura é muito melhor que a daqui. Lá, tudo funciona, tem disciplina, horário. A federação francesa está ajudando muito nossa categoria, pois tem ex-jogadoras lá dentro. No Brasil, precisamos disso também, temos de ter ex- atletas qualificadas e experientes no comando das decisões. A ex-jogadora sabe por onde ir, mas nossos dirigentes preferem homens que não sabem o caminho.

Nos clubes do Brasil, mesmo entre os grandes, a estrutura do feminino é até hoje inferior na comparação com o masculino.

Estamos longe do masculino. As pessoas só enxergam o masculino, mas temos de virar o jogo. O futebol feminino poderia estar muito maior do que está hoje. Para recebermos mais visibilidade, temos de ganhar títulos com a seleção. Não é isso o que vocês queriam? Olha a medalha aqui.

Quando as mulheres vão jogar campeonatos em estádios grandes, de primeira linha, não em centros de treinamento?

Essa é mais uma barreira que temos de quebrar. Os presidentes dos clubes deveriam ser os primeiros a reforçar isso e dar a oportunidade de jogarmos nos principais palcos. Temos de quebrar esse preconceito também. Quando o clube aceita o futebol feminino, tem de falar que as meninas têm de jogar nos estádios, mas não é o que geralmente ocorre. Espero que no São Paulo seja realmente diferente.

A diretoria do São Paulo prometeu que vocês jogarão no Morumbi?

Falou, sim. Quando a pandemia passar, os torcedores vão ao Morumbi e verão o futebol feminino. Em 1997 jogamos com a torcida nos vendo lá. Um dos objetivos do São Paulo é mudar a mentalidade atual.

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E quando as mulheres vão fazer os jogos principais e os homens, os de abertura?

Desejamos que isso aconteça um dia. Temos de continuar sonhando. Aos poucos vamos quebrando barreiras, buscando nosso espaço. Mas não temos de forçar nem dar murro em ponta de faca.

Como estão os preparativos da seleção para a Olimpíada? A pandemia prejudicou de que forma o time?

Prejudicou porque não pudemos nos reunir nas datas (específicas estabelecidas pela Fifa). A Pia (Sundhage, treinadora sueca da seleção brasileira) pedia para que a gente se cuidasse, mas agora é aproveitar o tempo que falta. Trinta dias de treino serão muito pouco, mas é o que temos.

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Na última Olimpíada da carreira, o seu papel mais importante será dentro ou fora de campo?

Dentro e fora, tanto eu quanto a Marta podemos ajudar o elenco. Pena que não teremos a Cris (Cristiane, que não foi convocada). A Olimpíada é algo fora da realidade das meninas, é importante que elas mantenham o foco, não saiam. Há muitas coisas tentadoras lá.

“O Caboclo foi o melhor presidente para o futebol feminino. Antes não tinha nem material. Mas infelizmente aconteceu isso (denúncias de assédio)”

Como o quê?

A circulação na vila, por exemplo. Com a pandemia isso é mais complicado. Tem atleta que vê alguém famoso e fica admirada. Temos de tomar cuidado com a exposição, principalmente com as redes sociais.

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Elas não poderão tirar fotos na Vila Olímpica?

Podem, claro. Somos seres humanos. As meninas gostam de tênis, de basquete. Mas muita gente pode atacá-las pelas redes sociais e elas podem perder o foco.

Por que a Cristiane (atacante de 36 anos) não foi convocada? Ela não está em condições de jogar em alto nível?

Com certeza está, pois se cuidou bastante. Tudo o que foi pedido ela fez. São coisas que não conseguimos entender. Não temos acesso aos critérios técnicos. Vamos buscar a medalha por ela também.

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Como a senhora recebeu as denúncias de assédio contra o presidente afastado da CBF, Rogério Caboclo?

Sou totalmente contra assédio, seja de quem for. Poderia ser meu irmão. Jamais iria aceitar. Mas é justo falar que ele foi um presidente que entrou e ajudou o futebol feminino. Se as coisas agora estão acontecendo, foi com o aval dele, mas infelizmente aconteceu isso. Espero que o próximo presidente venha com o mesmo carinho que ele teve com o futebol feminino e não tire o que vem dando certo.

De que forma o Caboclo atuou em prol da seleção feminina?

Antes dele não tínhamos material, não tínhamos contato com o marketing da CBF. Se precisávamos falar sobre dinheiro ou direitos de imagem, não conseguíamos falar diretamente. Com ele tudo mudou. Os antecessores do Caboclo não cumprimentavam nem o técnico. No passado, na época do Ricardo Teixeira (até 2012), não podíamos nem usar a academia e a sauna da Granja Comary. Só podíamos usar o campo e os dormitórios. Com certeza o Caboclo foi o melhor presidente para o futebol feminino.

O manifesto contra assédios sexual e moral que as jogadoras da seleção publicaram há algumas semanas foi visto por alguns como pouco contundente.

Para mim foi mais do que suficiente. Deixamos nosso recado e influenciamos outras mulheres a se pronunciar contra qualquer tipo de assédio. Não tínhamos de fazer declarações de três ou quatro páginas. Poucas palavras bastam.

*Colaborou César Costa

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Publicado em VEJA São Paulo de 07 de julho de 2021, edição nº 2745

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