Odilon Wagner e o prazer de dirigir “A Última Sessão”, com Laura Cardoso, Etty Fraser, Nívea Maria e grande elenco
Lá no tempo do onça, quando o que interessava na ficha técnica de um espetáculo era o nome da grande estrela, na maioria das vezes o próprio dono da companhia, costumava-se anunciar assim: em breve, uma nova atração, protagonizada por Fulano de Tal e grande elenco. O resto dos atores ficava lá no cartaz – […]
Lá no tempo do onça, quando o que interessava na ficha técnica de um espetáculo era o nome da grande estrela, na maioria das vezes o próprio dono da companhia, costumava-se anunciar assim: em breve, uma nova atração, protagonizada por Fulano de Tal e grande elenco. O resto dos atores ficava lá no cartaz – e, muitas vezes, no palco – meio escondido, tudo calculado para que só o Fulano de Tal chamasse a atenção. Com o tempo, os elencos foram diminuindo de tamanho, os eternos Fulanos preferiram testar a vaidade em outros veículos e, hoje, se torna surpreendente e raro ver um espetáculo que reúna dez atores, por exemplo.
Esse é o caso da comédia dramática A Última Sessão, escrita e dirigida por Odilon Wagner, que estreia no Teatro Shopping Frei Caneca. Laura Cardoso, Nívea Maria, Etty Fraser, Sônia Guedes, Sylvio Zilber, Miriam Mehler, Gésio Amadeu, Gabriela Rabelo, Yunes Chami e Marlene Collé formam um excepcional grande elenco. Repletos de experiência e talento, eles interpretam um grupo de velhos amigos que se encontra semanalmente para um almoço. Durante a refeição, esses personagens, que têm entre 75 e 85 anos, revivem o passado, acertam dívidas pendentes e – acreditem – também projetam um futuro. “A gente fez as contas, e juntos somamos mais de 570 anos só de carreira artística”, brinca Odilon Wagner, de 59 anos. “Imagina se a gente incluir no cálculo a idade de cada um de nós?”
Etty Fraser e a inspiração
“Eu sempre escrevi uma coisa ou outra. Muitas vezes, engavetava ou jogava no lixo mesmo. Morria de vergonha de mostrar para os outros, achava que não tinha nível para montar. Mas com o tempo a gente vai perdendo a timidez, não é? Família Muda-se foi a minha primeira peça encenada, entre 2006 e 2007. A Etty Fraser dava um show no elenco. Na reta final dessa temporada, eu pensei em escrever um texto protagonizado por atores maduros, um pouco inspirado no que a Etty fazia ali. Só que veio uma e outra novela. Precisei deixar um pouco de lado a ideia. Em 2010, eu comecei a escrever e fiz várias versões até finalizar no ano passado.”
O prazer do diretor
“Ah, não podia abrir mão de ser o diretor da montagem. O prazer de realizar um espetáculo como esse é muito maior do que tê-lo escrito. A gente fez as contas e juntos somamos mais de 570 anos só de carreira artística. Imagina se a gente incluir nesse cálculo a idade de cada um de nós? É um encontro que não queria ficar de fora.”
Um “não” para a peça de velhinhos
“Quando tive a ideia de escrever A Última Sessão, veio junto uma preocupação. Qual o melhor jeito de retratar a maturidade? Um cara de 60 anos hoje não é um idoso. Esse conceito mudou muito nas últimas décadas. As pessoas chegam aos 70 e 80 anos com uma vitalidade incrível. Esse elenco é uma amostra disso. Todos estão cheio de energia e com muita capacidade de trabalho. E como a gente vai valorizar a sabedoria dessa gente? Na cultura ocidental, a idade é um peso negativo. Eu não queria fazer uma peça sobre doença, sobre morte, sobre a reta final da vida. Minha ideia era contar uma história viva, de esperança, de gente com novas perspectivas, quem sabe até uma história de amor.”
O peso da idade
“Não existem mais histórias para atores de 50 anos. Falo de teatro, televisão e cinema. É muito difícil encontrar um bom papel para um ator que tenha passado dessa idade. E mesmo as tramas que são escritas para casais de 30 anos, por exemplo, são imaturas. Tudo é muito direcionado ao jovem. Eu já vi vários colegas entrar na maturidade e perceber que as propostas de trabalho desapareceram, principalmente na televisão. E gente muito boa, que já foi protagonista, cai em depressão porque deixa de ser escalada para as novelas. Pensei, então, nessa peça como uma grande homenagem aos trabalhadores da interpretação.”
Histórias sem fim
“O ponto em comum desse elenco é a disciplina. Uma coisa impressionante de ver e rara nas novas gerações. Nossa equipe técnica e de produção é toda muito jovem. Fiz questão disso até para estabelecer um contraponto. E todos ficam impressionados. O ensaio estava marcado para as 15h. Dava 14h30 no relógio e os atores já estavam sentados com o texto na mão, prontos para trabalhar. A Etty Fraser é um azougue, a rainha das histórias. Volta e meia, ela traz à tona uma lembrança dos tempos em que pertenceu ao Teatro Oficina. Imagina, Etty trabalhando com o Zé Celso? O que não deve ter sido… Quem também conta histórias impressionantes é a Miriam Mehler. Ela foi dona do Teatro Paiol, aqui em São Paulo, trabalhou muito com o Antunes Filho, conheceu o Nelson Rodrigues. A Laura Cardoso tem uma inteligência impressionante. É o tipo de atriz que só acrescenta ao diretor, que sugere coisas o tempo inteiro. O Sylvio Zilber fundou a Escola Macunaíma e formou muita gente. A Sônia Guedes é outra grande atriz, que já participou de momentos históricos do nosso teatro. A Nívea Maria eu já conhecia melhor da televisão e é muito bom reencontrá-la no teatro. Acho injusto citar o nome de um ou de outro. É muito bom ouvi-los contando as próprias histórias. Eu só agradeço a oportunidade dessa experiência, de trabalhar com essas pessoas.”