“Parasocial” vira a palavra do ano e anuncia futuro de relações sintéticas
Uma nova topografia da intimidade
Esse ano, o Cambridge Dictionary surpreendeu ao eleger “parasocial” como palavra do ano e a escolha revela os meandros de nosso tempo. O termo, antes escondido em artigos acadêmicos, agora ocupa conversas de bar, timelines e até sessões de terapia. Afinal, “parasocial” descreve algo que todos estamos vivendo: essa intimidade unilateral que sentimos por celebridades, influenciadores, personagens… e agora, por inteligências artificiais, “entidades sintéticas” que, nunca encontraremos na vida real, mas que, ainda assim, parecem nos conhecer.
O dicionário registrou um aumento nas buscas após o youtuber IShowSpeed bloquear uma fã obcecada, chamada por ele de sua “parassocial número 1”. Outro pico surgiu quando Taylor Swift anunciou o noivado com Travis Kelce. Mas o conceito nasceu em 1956, quando Donald Horton e Richard Wohl perceberam que espectadores começavam a se sentir “próximos” de apresentadores de TV, uma intimidade ilusória, porém inofensiva. Hoje, o cenário é outro: a tecnologia não só transmite, mas responde, conversa, aconselha e lembra de você. O fenômeno agora se expande para chatbots e personalidades criadas digitalmente.
É aqui que a palavra do ano encontra uma tendência que desponta como uma força social e perigosa: as relações sintéticas. Se antes o parasocial se limitava a uma admiração distante por celebridades, agora ele se transforma em vínculo com agentes artificiais projetados para simular proximidade emocional. Chatbots terapêuticos, namorados virtuais, influenciadores digitais gerados por IA e assistentes conversacionais personalizados estão moldando uma nova topografia da intimidade e, em muitos casos, substituindo relações humanas por interações programadas para agradar.
O movimento ganhou contornos dramáticos em casos como o do adolescente americano Adam Raine, de 16 anos, que, em 2023, desenvolveu uma relação emocional intensa com um chatbot de IA e acabou tirando a própria vida. Conversava horas por dia com a plataforma, encontrando ali um tipo de companhia que lhe parecia mais acolhedora do que as relações humanas ao seu redor. Sua última pergunta para o bot “você vai sentir minha falta se eu desaparecer?”, nunca encontrou o limite moral que apenas um ser humano poderia estabelecer. O algoritmo, otimista e literal, não compreendeu o risco. A tragédia ilustra o ponto central: máquinas podem simular empatia, mas não são de fato empáticas ou éticas.
A explosão das relações sintéticas tem números assustadores. Segundo o Pew Research Center, 41% dos jovens americanos entre 18 e 24 anos já usaram IA para suporte emocional; aplicativos como Replika, Woebot e Character.ai somam mais de 100 milhões de usuários globais; e 1 em cada 5 usuários de IA conversacional recorre à tecnologia para falar de sentimentos. Para a OMS, a tendência é tão rápida que políticas públicas e regulações ainda não acompanham os riscos.
Estamos vivendo um deslocamento das relações humanas para vínculos que oferecem conforto instantâneo, intimidade sob demanda e zero fricção. Se, por um lado, essas tecnologias podem ampliar acesso à saúde mental e oferecer companhia para pessoas em sofrimento ou isolamento, por outro, podem distorcer a percepção de reciprocidade e substituir o complexo, e necessário trabalho emocional dos relacionamentos humanos pela suavidade tecnológica de respostas perfeitas.
O novo e preocupante fenômeno nos obriga a olhar para o que estamos cultivando: vínculos moldados por algoritmos. E aqui a reflexão mais urgente não é se vamos ou não nos relacionar com inteligências artificiais, isso já está acontecendo, mas como faremos isso sem perder a capacidade de estar com o outro, o real. Afinal como nos lembra Tristan Harrys, do Center for Humane Technology, ex-Google, “A próxima disputa de poder não será por atenção, mas por afeto”.
Por mais avançadas que sejam, máquinas não substituem o encontro humano, imperfeito, complexo, cheio de conflitos e absolutamente insubstituível.Então me pergunto: não estaria na hora de deixarmos o paradigma do Homo Sapiens, o humano que sabe, para inaugurarmos o paradigma do Homo Sentient, o humano que sente? Porque, no fim, não é a nossa capacidade de raciocinar que está ameaçada, é a nossa capacidade de sentir.
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