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Projeto anunciado por João Doria pode dobrar a poluição na Raia

Substituição do muro que separa o espaço da Marginal Pinheiros por uma grade também elevará em mais de 30% a poluição sonora no local, aponta medição

Por Sérgio Luz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 17 Maio 2017, 14h57 - Publicado em 17 Maio 2017, 12h41

A proposta de substituição do muro de concreto que separa a Raia Olímpica da Marginal Pinheiros por um gradil vem gerando polêmica. Ela faz parte de um pacote de melhorias no local anunciado recentemente pela USP, com apoio da prefeitura paulistana. “Vamos estabelecer uma nova fronteira visual com a Marginal Pinheiros”, discursou João Doria ao anunciar a parceria como mais uma etapa de seu programa “Cidade Linda”. Segundo os críticos do projeto, a queda do muro vai deixar o lugar muito mais exposto à fuligem do trânsito e à poluição sonora da via expressa, entre outros problemas. No início da semana, o remador Michel Neumark, em nome da comunidade de esportistas que frequentam o espaço, denunciou junto ao Ministério Público do Estado de São Paulo a falta de qualquer estudo ambiental prévio antes do início da obra, previsto para ocorrer ainda este mês (a meta é terminar tudo até agosto). O caso será analisado pela Promotoria de Habitação e Urbanismo do MP. Entre os dias 15 e 16, um grupo de especialistas do Departamento de Ciências Atmosféricas da USP, chefiada pela professora Maria de Fátima Andrade e atuando de forma independente, resolveu fazer o que a direção da universidade deveria ter feito. Ou seja: checar se as queixas relacionadas ao projeto têm procedência.

Os resultados foram preocupantes. Segundo o trabalho, sem o muro atual, o nível de poluição pode dobrar dentro da Raia. Com ajuda de um monitor de material particulado, o grupo de especialistas realizou seis medições em horários variados entre os dias 15 e 16.  “Boa parte das emissões de gases dos escapamentos não entram hoje na Raia graças à proteção de concreto”,  explica Maria de Fátima. Segundo ela, a retirada da barreira impactaria atletas e outros usuários do local. “Dessa forma recomenda-se que ela não seja eliminada, pois está atuando como um redutor do impacto do trânsito da Marginal Pinheiros na qualidade do ar na área da Raia Olímpica da USP”, conclui a especialista.

O poder público municipal, que fez bastante barulho no anúncio do projeto, agora empurra a responsabilidade do problema para a USP, segundo nota encaminhada à VEJA SÃO PAULO pela assessoria de imprensa de João Doria: “A prefeitura defende o projeto e apoia a integração urbanística entre a USP e a cidade. As questões relativas a detalhes da proposta devem ser encaminhadas à universidade, responsável por sua elaboração e execução”. A direção da USP, por sua vez, não quis comentar o assunto.

João Doria e Vahan Hagopian, vice-reitor da USP: prefeitura diz que a responsabilidade é da universidade (Divulgação/Veja SP)

O aumento da poluição sonora no local é outra questão que preocupa os frequentadores. A pedido de VEJA SÃO PAULO, a empresa especializada Instrutherm avaliou o tamanho do problema na terça, 16, por volta das 16h. Munido de um decibelímetro, o engenheiro Cristiano Molica realizou medições dentro e fora da Raia, usando dois pontos de referência: a cabeceira (próxima à entrada da Avenida Politécnica) e um ponto intermediário do circuito utilizado pelos remadores. Enquanto à margem das águas da Raia foram registrados 65 decibéis, o aparelho mediu 85 decibéis na Marginal. O limite considerado suportável para ambientes ao ar livre é de 55 decibéis. “O muro ajuda a barrar um pouco do barulho dos carros”, afirma Molica.  A barreira de concreto possui de 3 metros de altura e espessura de aproximadamente 10 centímetros.

As mudanças anunciadas por Doria incluem ainda alterações no paisagismo do espaço, nova iluminação da área e a construção de uma pista de corrida na área que separa a Raia Olímpica da Marginal. Tudo isso irá custar mais de 2 milhões de reais, montante bancado por um grupo de empresas. A Prevent Senior, companhia de planos de saúde, por exemplo, será a responsável pela substituição do muro pelo gradil, o ponto mais polêmico da iniciativa. Procurada por VEJA SÃO PAULO para comentar os estudos que indicam aumento de poluição ambiental e sonora na Raia, a empresa não se manifestou até o fechamento desta reportagem. 

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Regata no Tietê: poluição inviabilizou o esporte por lá no início da década de 70 (Acervo Clube de Regatas Tietê / Reprodução de Leonardo Carneiro/Veja SP)

Inaugurada em 1973, a Raia surgiu como alternativa ao remo na cidade depois que a poluição do Tietê inviabilizou a prática da modalidade no rio. Ela tem 2 200 metros de extensão e 100 metros de largura. Atualmente, cerca de 1 000 adeptos do esporte utilizam o espaço, divididos entre seis clubes: Cepeusp, Pinheiros, Corinthians, Paulistano, Bandeirante e Paineiras. Apesar de estar a poucos metros do Rio Pinheiros, a Raia conseguiu resistir à poluição dos carros. A boa qualidade da água do local, atestada por duas medições anuais, permite a proliferação de peixes, que atraem aves em busca de alimento, como patos, garças e andorinhas. O circuito possui ainda uma rica cobertura vegetal, com destaque para árvores nativas do país, a exemplo de pau-brasil e quaresmeira. A ideia interessante de tornar esse belo conjunto mais visível e acessível aos paulistanos pode ter o efeito colateral de destruir o que ficou preservado ao longo de mais de quatro décadas. “Somos a favor de uma maior integração da Raia à cidade, mas isso não pode ser feito sem que o poder público tome as devidas precauções para preservar o ambiente e a saúde dos frequentadores do local”, afirma Michel Neumark. Os esportistas sugerem que o muro seja preservado ou substituído por uma proteção de vidro, em vez do gradil do projeto original. “Além de remadores, temos atletas paraolímpicos treinando no local, crianças com deficiência física e mental que praticam nos barcos e pacientes com câncer que vêm fazer tratamento físico. Todos vão sofrer com o aumento da poluição”, conclui Neumark. 

 

 

 

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