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PM descumpriu ‘manual antidistúrbio’ em ato contra aumento de tarifas

Entre as recomendações não cumpridas estão o esvaziamento de ruas apenas quando há rotas de fuga e o aviso prévio, com megafones

Por Estadão Conteúdo
Atualizado em 5 dez 2016, 11h43 - Publicado em 14 jan 2016, 09h36

Durante a dispersão do ato do Movimento Passe Livre (MPL) na terça-feira (12), a Polícia Militar não seguiu orientações do Manual de Controle de Distúrbios Civis da corporação. Entre as recomendações não cumpridas estão o esvaziamento de ruas apenas quando há rotas de fuga e o aviso prévio, com megafones, antes do enfrentamento. Encurralar manifestantes é ainda uma violação de direitos humanos para a Organização das Nações Unidas (ONU). A ação da PM foi iniciada após impasse sobre a definição do trajeto da passeata.

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A Secretaria da Segurança Pública informou, em nota, que “alguns manifestantes e grupos infiltrados não respeitam o texto constitucional, que exige a prévia comunicação”. A pasta afirmou que “agirá absolutamente dentro da legalidade”. “Não é possível transformar democracia em anarquia, vandalismo e banditismo.” A reportagem procurou o tenente-coronel André Luiz Oliveira, que comandou a operação, mas não obteve resposta.

O controle de distúrbios civis (CDC), segundo o manual, consiste em ação para esvaziar uma área. “Deve-se ter em mente que o objetivo principal de uma tropa de CDC é a dispersão da multidão, não detenção ou confinamento”, diz o texto.

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Para não encurralar, a PM deve garantir rota de fuga. “O conhecimento prévio do local do distúrbio é de suma importância para permitir o deslocamento por vias de acesso adequadas de modo a assegurar vias de fuga.”

Na praça do Ciclista, na Avenida Paulista, havia cordões de isolamento na rua Haddock Lobo e no acesso à Avenida Rebouças. A única fuga possível, pela Rua da Consolação, era de onde as bombas eram lançadas.

O manual estabelece que, antes do uso da força, seja dada uma “ordem de dispersão” aos manifestantes, “por meio de amplificadores de som, alto-falantes das viaturas ou usando megafones”. As bombas foram lançadas sem o procedimento.

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O texto afirma ainda que reuniões pacíficas, “mesmo com a possibilidade de uma transformação devido a diversos fatores, como por exemplo o exaltamento, não devem ser acompanhadas preventivamente no local da ocorrência pela tropa especializada em CDC”.

As equipes que iniciaram a dispersão do ato estavam presentes no local antes mesmo da maioria dos manifestantes, que começaram a lotar a Paulista após as 17 horas.

A ação da PM também contraria a Normativa e Prática de Direitos Humanos para a Polícia, da ONU. O texto afirma que, “quando for necessário dispersar uma multidão, deixe sempre um corredor claro e evidente para escapar”. A recomendação foi elaborada em 2003 pelo Alto Comissariado para Direitos Humanos e tem como meta criar um padrão que as forças policiais possam seguir em todo o mundo.

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Medidas graduais são recomendadas e a ONU insiste que essa tática precisa ser “planificada”. “Serão aplicados meios não violentos antes de se recorrer à força”, diz. “A força apenas se utilizará para fins lícitos de aplicação da lei”, aponta. “Evite táticas desnecessariamente provocadoras.”

Uma vez que força seja necessária, porém, a ONU deixa claro que há limites e padrões de conduta. “A força será proporcional aos objetivos lícitos”, indica. “Tudo será feito para limitar os danos e as lesões. Todas as pessoas feridas ou traumatizadas serão imediatamente atendidas.”

Reações

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Consultor em Segurança e ex-comandante do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate), Diógenes Lucca defende a ação da PM na dispersão de anteontem. “O manual é a regra geral e uma norma de conduta. Mas, dentro do quadro de hoje, de impunidade com os baderneiros, é perfeitamente adequado a PM mudar [as orientações]”, afirma.

Na perspectiva do Direito, o constitucionalista Ives Gandra Martins afirma que a operação foi legal. “Inconstitucional é uma manifestação que prejudica a vida de um cidadão. O que a polícia fez foi proteger os patrimônios públicos e privados e orientar a manifestação, o que me parece absolutamente constitucional”, diz. “Se a PM não fizesse isso, seria omissa. Os cassetetes só foram usados quando tentaram furar o bloqueio.”

A professora de Direito Constitucional da Faculdade Getúlio Vargas (FGV) Eloísa Machado discorda de Martins e afirma que a PM não deve cercar a manifestação.

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“O papel da polícia, por mais difícil que seja achar o equilíbrio, é proteger a manifestação e manter a integridade do patrimônio e das pessoas”, diz. “Ao cercar um protesto, impedir que ele avance, a corporação frustra um direito garantido.”

Para Renata Neder, assessora de Direitos Humanos da Anistia Internacional, a ação da PM “violou claramente o direito à manifestação”. Ela diz que não houve falta de preparo da PM. “É uma repressão pensada e planejada. Claramente há uma orientação para de não deixar o ato acontecer.”

 

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