A amiga olhava o copo de chope, uma cara de que tudo no mundo era impossível.
– O que é que você tem?
Um suspiro e:
– Nada.
– É o cara?
Como resposta, um gesto de mãos, ombros e rosto significando: o que eu posso fazer?
– Quer que eu mate ele?
– Mata mesmo? Tem coragem?
– Ô se tenho. É só mandar.
– Tá mandado.
– Tiro?
– Forca. Bem devagarinho.
– É um homem morto.
Riram, um pouco enjoados da brincadeira. Depois, ela:
– Você gosta de mim?
– Gosto, claro.
– Tou falando gostar mesmo. Entendeu?
– Ó que perigo. Olha pra você. Já imaginou? Você, eu, nós dois, ó o perigo.
Ele parecia um jogador de xadrez jogando com as pretas. Seus movimentos eram sempre uma resposta. Aguardou calado o próximo lance.
– Eu sou uma chata, fala a verdade.
– Você não é chata. É atrapalhada, mas não é chata.
– Não tou me aguentando. As coisas vão ficando difíceis, vai tudo dando errado, dá uma preguiça de tocar o resto…
– Olha, vou te dizer uma coisa. Se você não tem como alcançar a fruta que quer, não fica pulando debaixo da árvore pra pegar. Dá muito na vista. As pessoas vão acabar rindo de você. Disfarça e sai numa boa.
– Falar é fácil.
– E vai ver a fruta nem vai agradar. Parece boa, mas do outro lado tá bichada.
– Ah, não vem com essa. Cruel, cara! Não esperava essa de você. Ele não é gay.
– E eu tou falando que é? Falei nada.
Ela bebeu um gole do chope, fez cara de quem não gostou. O jogador de xadrez ficou à espera de outro lance. Ela:
– Eu às vezes fico pensando…
– O quê?
– Que você gosta de mim.
– Bobagem.
– Gosta não?
– Não.
– Então tá. Pede mais um chope pra mim? O meu ficou horrível, amargo. Esquentou.
– O meu também.
Ele ergueu o braço acenando para o garçom, levantou o copo vazio e fez “dois” com os dedos. O garçom fez de lá o sinal de positivo. Enquanto esperavam, ela ficou olhando para as mãos dele brincando com as quatro bolachas de chope.
– Não tinha reparado. Você tem mãos bonitas.
O jogador sorriu envaidecido. Também achava. Ela o encarou.
– Sabe o que descobri há uns dias e é isso que tá me enchendo o saco?
– Diz.
– Eu acho que te amo, te amei ou vou te amar. Uma coisa assim.
– Também acho.
– Por que você é tão insuportável às vezes?
Deram-se as mãos por cima da mesa.