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Designer Gregorio Kramer morre em São Paulo

Referência em estamparia, até Madonna tinha itens dele na decoração; para homenageá-lo, republicamos capa de 2006

Por Redação VEJA São Paulo Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 23 out 2019, 19h25 - Publicado em 23 out 2019, 13h26

O designer argentino radicado no Brasil Gregorio Kramer morreu aos 79 anos nesta quarta-feira (23), em São Paulo. Um dos nomes mais importantes do design voltado para decoração, fundou, com seu companheiro há mais de 50 anos, Attilio Baschera, a Larmod Tecidos e a AGain. Mestre da estamparia, também era conhecido pelo gosto refinado e pelas festas.

Para homenageá-lo, Vejinha republica a matéria de capa feita com o casal em 2006. Leia a íntegra:

Attilio e Gregorio Kramer (Veja SP/Veja SP)

 

Você pode até não saber quem são Attilio Baschera e Gregorio Kramer. Mas Madonna sabe. Foi na loja da dupla, a AGain, em Higienópolis, que o arquiteto irlandês David Collins comprou almofadas, vasos, potes com estampas de abacaxi e louças (quase tudo azul) para decorar a casa de campo da pop star. Gastou 10 000 reais. “Ele entrou aqui dizendo que ia escolher peças para ela e achei que fosse piada”, diz Baschera. “Só acreditei quando a própria Madonna passou um torpedo para o celular de Collins dizendo que era para comprar tudo.” A história pitoresca é apenas mais uma na longa e bem-sucedida trajetória dos designers, que remonta à década de 60. Fundadores da Larmod, estamparia e loja de tecidos para decoração vendida em 1998 porque o casal decidiu tirar um período sabático, foram os pioneiros no Brasil no mercado de moda para casa. “Hoje todo mundo fala em decoração e existem lojas aos montes”, diz Baschera. “Naquela época, design de tecidos era exclusividade da indústria fashion.”

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Modernos e bons de papo, foram alçados a queridinhos da sociedade paulistana e a Larmod, então na Rua Bahia, virou uma espécie de point diurno da badalação. “A gente passava lá para um cafezinho, encontrava as pessoas e ia ficando”, lembra o arquiteto Sig Bergamin. “Foi um sucesso fulminante. Não existia nada no Brasil com tanto estilo e bom gosto”, conta a consultora de moda Costanza Pascolato. Animados (adoram dançar e contar piadas), recebem até hoje cerca de sessenta convites por mês, para os mais variados eventos. “De casamentos a lançamento de máquina de lavar”, brinca Baschera. Em quinze deles, em média, desfilam os sorrisos e as elogiadas gravatas — possuem mais de 400 e Baschera, que aos 73 anos é símbolo de elegância, costuma combiná-las com lenços e meias coloridas. “Eles têm o dom de mudar uma festa”, diz a socialite Patsy Scarpa. “A chegada deles, sempre sorridentes e simpáticos, já é um acontecimento.” Se não podem comparecer a um evento, enviam cartões e, no caso dos amigos mais próximos, flores. E-mail, só se o convite tiver vindo assim.

Quando não saem, recebem amigos no apartamento de três quartos onde vivem, em Higienópolis, a poucas quadras da AGain. Moram os dois, mais o cãozinho Taiwan, da raça lhasa apso. Sofisticado e clean (“nós detestamos essa ostentação dos novos-ricos”, diz Kramer, 66 anos), o apartamento é decorado com obras de arte, sobretudo desenhos, de Diego Rivera, Di Cavalcanti, Botero… As paredes nas cores creme e marrom-escuro abrigam mais de 3 000 livros. Velas e abajures completam o clima chique. Atualmente, o casal gosta de receber na cozinha, onde serve massas e risotos preparados por Baschera, apesar da sala montada para doze pessoas. Tudo para dar um ar mais intimista à recepção. Eles têm ainda mais dois apartamentos, um em Buenos Aires e o outro em Punta del Este.

No campo profissional, as funções são bem definidas. O paulistano de origem italiana Baschera, que tem formação em artes plásticas pela Escola Superior de Belas Artes Porta Pinciana, em Roma — onde foi contemporâneo do estilista Valentino —, cria estampas e padronagens para os tecidos e desenha móveis e louças. O argentino de origem judaica Kramer, bioquímico formado pela Universidade de Buenos Aires, cuida de colorir os desenhos, administrar os negócios e organizar tudo. Cuidadoso, embala as peças individualmente em saquinhos plásticos e agrupa-as por tonalidade em caixas plásticas. O depósito da AGain, na Barra Funda, mais parece uma loja, tão arrumadas estão as mercadorias. Em casa, Kramer também é o organizado da dupla. Foi sua a idéia de guardar as camisas dobradas, também embaladas nos tais saquinhos e divididas por cor. Apesar do convívio intenso — são praticamente 24 horas por dia, há 38 anos —, a relação é pacífica e eles juram que nunca brigaram. A maior divergência é no futebol: Baschera é palmeirense e Kramer, são-paulino. Durante a Copa do Mundo, o argentino fica dividido entre a seleção de lá e a nossa, com vantagem para o Brasil. “Fico torcendo para a Argentina sair logo, assim acaba a minha dúvida”, diz, com seu forte sotaque portenho.

Assumidos e carinhosos (porém discretos e sem trejeitos), conheceram-se em uma época em que a homossexualidade não era encarada com a naturalidade de hoje e manifestações públicas como a Parada Gay deste sábado seriam impensáveis. “Até hoje não entendo como fomos tão bem aceitos nem por que não houve escândalo ou fofocas”, afirma Baschera. “Acho que é porque sempre respeitamos os limites das pessoas. Naquela época, quem dava muita bandeira não era convidado para nada.” Foi o acaso que os uniu. Em 1968, ambos participaram de um concurso de desenho para tecido da Feira Internacional da Indústria Têxtil (Fenit). Kramer levou o terceiro lugar e Baschera, que na ocasião era diretor de arte da Editora Abril, ficou com o primeiro prêmio.

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Attilio Baschera e Gregório Kramer, designers. (Mario Rodrigues/Veja SP)

Bon-vivants, eles costumam freqüentar excelentes restaurantes, concertos e teatros. As viagens, no entanto, são a grande paixão da dupla. Vão à Argentina pelo menos cinco vezes por ano e não perdem o festival de verão de Aix-en-Provence, na França, um dos maiores eventos de arte lírica do mundo. É das viagens que Baschera tira idéias para muitas de suas criações. Atualmente, ele trabalha em toiles de jouy (estampa típica da França, que tradicionalmente mostra cenas bucólicas) com motivos tropicais. As inspirações são as cidades de Trancoso e Ouro Preto. Adora bambus, bananeiras e, claro, os abacaxis que encantaram o arquiteto de Madonna. Sua produção é quase artesanal. Baschera desenha a mão com a ajuda de um assistente (ele não sabe nem ligar um computador), e a estampa é feita com técnica de silk screen, também sem uso de máquinas computadorizadas. Hoje em dia, a loja de Higienópolis exibe mais de 500 padronagens de tecidos, que custam entre 87 e 400 reais o metro, além de móveis e objetos exclusivos, entre 6.000 (um sofá) e 24 reais (uma xícara).

O casal é o antiexemplo da maturidade acomodada. Depois das longas férias que tiraram após o fechamento da Larmod, resolveram, há dois anos, voltar a trabalhar. Foi quando abriram a AGain. O incentivo não foi financeiro. “Cansei de ficar sem fazer nada”, diz Baschera. Não bastassem o trabalho, as festas, a vida cultural intensa, a administração da loja e das três casas, os dois ainda fazem ginástica regularmente em uma academia (personal trainer, segundo eles, também é ostentação de novo-rico). “Vai demorar uns dez anos para que eu comece a me sentir velho”, brinca Baschera, repleto de razão.

De olho nos detalhes

Dez truques de Attilio Baschera para deixar a casa mais elegante

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• Caso não tenha muitos quadros, agrupe-os em uma única parede. O mesmo vale para objetos e esculturas. “É mais interessante do que espalhar obras pela casa inteira.”

• Não misture objetos e livros na mesma estante. “Essa coisa de três livros e um vaso depois mais quatro livros e uma esculturinha só serve para poluir o ambiente.”

• Evite estampas grandes e cores muito fortes em sofás. Elas são mais indicadas para poltronas e almofadas soltas.

• “Paredes totalmente brancas deixam a casa com cara de hospital.” Misture um pouco de bege na tinta para obter o chamado branco quebrado.

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• A luz de uma casa não pode vir do teto, ou o ambiente perde o aconchego. Invista em abajures, arandelas e spots. No inverno, velas. Além disso, prefira lâmpadas de cor quente. “Lâmpada fluorescente, só na cozinha, no escritório e na área de serviço. E olhe lá.”

• Prefira flores brancas, como orquídeas e lírios (estes servem também para perfumar a casa), a arranjos coloridos. “Van Gogh que me desculpe, mas acho girassol dentro de casa muito brega. Só fica bonito no campo.”

• Louças brancas são mais práticas, pois combinam com quaisquer toalhas e guardanapos. Se quiser um modelo mais colorido, dê preferência a detalhes nas bordas. Assim, a cor da louça não se mistura à da comida.

• Evite travesseiros bordados. “As pessoas acham que é chique, mas não há nada mais deselegante do que acordar com a cara marcada.”

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• Perfume (pouco) a casa. Pot-pourris (aqueles potinhos com folhas secas) e aromatizadores (com parcimônia) deixam o ambiente mais agradável. Para casa de homens, os cheiros sugeridos são cedro e lavanda. “Casais ou mulheres solteiras podem usar uma fragrância mais doce.”

• Não encha a pia do banheiro de potes. “Creme misturado com escova de dentes, perfume e xampu não dá.” Guarde parte dos produtos no armário para deixar o banheiro mais agradável. Outra dica: mantenha ali um revisteiro e alguns livros.

* Perfil feito por Nana Caetano e publicado originalmente em 21 de junho de 2006, na capa de VEJA SÃO PAULO

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