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Por Mário Viana
Atualizado em 22 jun 2018, 17h54 - Publicado em 22 jun 2018, 13h49

Cada cidade tem um perfume especial, que nos devolve a ela, mesmo anos depois da última visita. E é uma situação estritamente personalizada. Uma pessoa não tem a mesma memória olfativa de outra, ainda que elas tenham viajado juntas e em paz.

Para mim, Lisboa terá sempre o cheiro de castanhas assadas na brasa. E, de preferência, com a temperatura outonal quase chegando ao inverno. Já Paris ressurge a cada vez que sinto o perfume de pão dourando no forno. Passar diante das boulangeries francesas na hora em que sai a fornada de baguetes e croissants é acreditar que o paraíso não apenas existe, como fica exatamente ali.

Ouro Preto recende a lenha acesa e telhados antigos. É um perfume de coisa antiga, de muita história ocorrida dentro dos casarões centenários. Salvador, é claro, tem seus maus cheiros, mas o que fica na lembrança é o aroma de dendê, pimenta e maresia, tudo junto — só o azeite que frita acarajés não basta para nos devolver à Bahia, tem de ser o combo todo.

São Paulo, infelizmente, entra na lista por outra porta. Uma caminhada no centro, num dia qualquer, obriga nossas narinas a sentir um desagradável cheiro de xixi. É isso. A cidade que quer reativar seu núcleo histórico, com ruas como a 15 de novembro, decorada com as mais belas portas de ferro, espalha um apavorante odor de banheiro público sujo.

Você mergulha nos trágicos trinados das óperas apresentadas no Teatro Municipal, mas quando sai à tona, na Praça Ramos de Azevedo, é devolvido à mais inconveniente realidade. Na Sala São Paulo, então…. Permanecer algumas horas desfrutando o mais belo espaço de concertos da cidade não nos livra dos episódios dantescos de degradação humana e urbanística — incluindo o odor gerado pela miséria.

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Alguns dirão que exalar odor de urina não é exclusividade paulistana. Verdade. Olinda vira um mictório a céu aberto — mas só durante o Carnaval. Nos outros dias, em geral, a cidade tem aroma de tapioca feita na hora. São Paulo ignora datas festivas e espalha amônia pelos ares em qualquer época do ano.

É claro que a coisa piora nos grandes eventos. Quem aproveitou a Virada Cultural ou a Parada Gay sabe muito bem. Os mais experientes já desenvolvem a técnica de tapar o nariz quando os banheiros químicos surgem no horizonte. Dá até pena dos novatos, que vão de peito e narinas abertos até sentir o impacto.

Uma rápida visita a um desses cubículos desperta questões quase filosóficas. Ou temos os moradores mais porcalhões do planeta, os únicos capazes de se aliviar como quem pula corda, ou os banheiros químicos já saem sujos dos depósitos, talvez para adiantar o expediente. Quem sabe o “químico” do nome se refira à sensação de que vamos nos desintegrar em partículas ao usar um troço daqueles.

O ideal seria que a população fosse mais limpinha e os administradores da cidade caminhassem de verdade pelas ruas. Ao utilizarem apenas carro oficial e helicóptero nos deslocamentos, fica difícil entender que os paulistanos merecem um ar mais perfumado. Que tal aroma de pizza quentinha? Ou de pastel de feira crocante? Bem melhor, pensa.

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