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Artigo: o fracasso dos tribunais de contas

Marcos Lisboa é economista e presidente do Insper

Por Marcos Lisboa
Atualizado em 15 fev 2019, 18h12 - Publicado em 15 fev 2019, 06h00

Cabe reconhecer que a imensa maioria dos tribunais de contas fracassou. Diversos estados não conseguem nem mesmo pagar em dia o salário dos seus servidores, sinal de colapso. Muito antes, deixa-se de gastar com a manutenção da infraestrutura e as obrigações comezinhas do poder público, como saúde e segurança. Alguns tribunais foram coniventes com interpretações criativas sobre a contabilidade dos gastos públicos, o que permitiu o crescimento das despesas com pessoal na última década.

Como agravante, há o fato de que eles não alertaram para a crise previsível das contas públicas em razão das despesas crescentes com a aposentadoria dos servidores. Para quem é do ramo, havia muitos anos era óbvio que estados e municípios teriam dificuldades crescentes para pagar suas despesas rotineiras.

Pelo visto, muitos tribunais de contas não são do ramo, apesar de custarem muito ao contribuinte. No caso da cidade de São Paulo, o Tribunal de Contas do Município (TCMSP) chega a custar 290 milhões de reais por ano, sendo 243 milhões de reais referentes aos gastos com pessoal. O orçamento do Parque Ibirapuera, por sua vez, é de 17 milhões de reais por ano, enquanto a Biblioteca Mário de Andrade, a maior da cidade, custa 10 milhões de reais.

O orçamento da cidade de São Paulo é de cerca de 60 bilhões de reais por ano, valor semelhante ao que desembolsam as maiores empresas não financeiras do Brasil. Pois bem, essas empresas gastam com auditorias menos de 30 milhões de reais por ano, 10% do que a cidade de São Paulo despende com o TCMSP. Mesmo os grandes bancos, sujeitos a uma regulação extremamente complexa que resulta em auditorias bastante técnicas para avaliar os diversos riscos do negócio, gastam apenas 20% do que custa o TCMSP. Com a agravante de que, em caso de bobagem, as empresas privadas quebram e seus funcionários perdem o emprego.

“Alguns tribunais foram coniventes com interpretações criativas sobre a contabilidade dos gastos públicos, o que permitiu o crescimento das despesas com pessoal na última década”

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O país assiste assustado à interdição de viadutos em São Paulo por falta de manutenção há muitos anos. Além disso, a análise das contas da cidade indica que, pelo envelhecimento dos servidores e com as regras atuais, o gasto com servidores aposentados levará a capital a dificuldades crescentes nos próximos anos.

Como se deve evitar o preconceito, seria precipitado atribuir o desastre das contas públicas à complacência dos tribunais de contas. É verdade que muitos estados e cidades, como São Paulo, enfrentam graves dificuldades, mas, dando-se o benefício da dúvida, talvez os tribunais tenham apenas sido incrivelmente caros e incompetentes.

Muitos entes subnacionais quebraram ou vão quebrar nos próximos anos, porém os servidores públicos, ao contrário dos trabalhadores privados, não podem ser demitidos e ainda demandam que seus salários sejam corrigidos pela inflação.

Recessões acontecem, o país fica mais pobre e trabalhadores perdem renda e emprego. A regra só não vale para os servidores públicos. Que tal passar a tratar os servidores públicos da mesma forma que os trabalhadores do setor privado? Quando a economia vai bem, a sua renda aumenta. Quando vai mal, a sua renda cai.

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Fica a pergunta: por que não acabar com os tribunais de contas e substituí-los por auditorias privadas, contratadas por licitação? A boa notícia é que não há como o serviço piorar, além de custar bem menos. Com os quase 300 milhões de reais que seriam economizados no caso da cidade de São Paulo, poderíamos melhorar a manutenção dos viadutos, das bibliotecas e dos parques públicos.

> Marcos Lisboa é economista e presidente do Insper

Publicado em VEJA SÃO PAULO de 20 de fevereiro de 2019, edição nº 2622.

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