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Por Arnaldo Cheixas
Terapeuta analítico-comportamental e mestre em Neurociências e Comportamento pela USP, Cheixas propõe usar a psicologia na abordagem de temas relevantes sobre a vida na metrópole.
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O que é virgem? A hora certa de falar sobre sexo com os filhos

Embora esteja presente em toda a História da humanidade, o sexo é um tema envolto em muitos tabus. O comportamento sexual poderia ser abordado com mais leveza no cotidiano mas, infelizmente, ele é relacionado frequentemente ao pecado, à ausência de amor e à depravação, parece algo sujo. Nesse emaranhado de valores morais e dos medos […]

Por VEJASP
Atualizado em 26 fev 2017, 18h24 - Publicado em 10 mar 2015, 20h52

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Embora esteja presente em toda a História da humanidade, o sexo é um tema envolto em muitos tabus. O comportamento sexual poderia ser abordado com mais leveza no cotidiano mas, infelizmente, ele é relacionado frequentemente ao pecado, à ausência de amor e à depravação, parece algo sujo. Nesse emaranhado de valores morais e dos medos deles decorrentes, a gente acaba por se atrapalhar no campo sexual e, embora isso traga sofrimento, o problema é muitas vezes ignorado. Se já é difícil dar conta da própria sexualidade, imagine-se ajudar uma criança/adolescente a desenvolver-se sexualmente de forma saudável.

Quando é o momento certo para tratar da questão com os filhos? A resposta, na verdade, é bem simples. A hora de conversar é a hora em que a criança perguntar. Isso não significa que os pais devem dar uma palestra sobre o tema no primeiro questionamento. Basta seguir o ritmo da criança. Para isso, é importante ter sensibilidade para entender a demanda que a criança está trazendo. Em outras palavras, é preciso saber ouvir.

Lembro-me do vídeo de uma campanha publicitária no qual uma mulher está cozinhando enquanto sua filhinha de uns 5 anos de idade está sentada à mesa. A garotinha, então, pergunta à mãe: “Mãe, o que é virgem?”. A mulher é, então, tomada de uma intensa ansiedade. Ela começa a responder gagejando, buscando em sua mente as melhores palavras para serem usadas na explicação, que acaba por ser prolixa. Depois de ouvir uma longa resposta da mãe cheia de cuidados para não chocá-la, a menininha, segurando uma lata de azeite nas mãos, complementa a pergunta: “E o que é extra-virgem?”.

De tão preocupada em não errar no dia em que a conversa chegasse, a mãe acabou não prestando atenção no que a filha realmente queria saber. Por sinal, nada tinha a ver com sexo. Esse conto é um bom exemplo de como os pais se atrapalham na hora de abordar o tema.

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Sabendo que a hora de conversar é o momento em que a criança pergunta, aí vem uma segunda questão, que é saber como abordar o tema. E aqui cabe uma observação importante. Se vocês, pais, não se sentem à vontade com a própria sexualidade, vocês não darão conta de oferecer aos seus filhos o suporte necessário para um saudável desenvolvimento sexual. Isso vale para qualquer aspecto da vida. Se você não cuida bem de sua vida financeira, você não conseguirá educar satisfatoriamente seus filhos. Se não se sente bem com sua profissão, tampouco. E assim por diante. Então, o medo de tratar de sexo com os filhos é um indicativo de que algo não está bem com você mesmo e/ou na interação do casal. Neste caso, o melhor a se fazer é buscar uma terapia individual e/ou uma terapia de casal para cuidar de suas próprias questões. Cuidar de si é uma das coisas mais maravilhosas que os pais podem fazer pelos filhos. Infelizmente muitos não se dão conta disso.

Outro detalhe importante. Os pais ensinam coisas sobre a vida aos filhos diariamente. É um processo constante que acontece desde a formação do sistema nervoso ainda na gestação e se prolonga ao longo do desenvolvimento. Assim, mesmo sem conversar explicitamente sobre determinado tema com os filhos, os pais estão oferecendo modelos de resposta a partir de seu próprio comportamento. Por exemplo, quando os pais emitem uma opinião sobre política na frente da criança, ela está aprendendo um referencial, um modelo de comportamento.

De modo geral as crianças consideram tudo o que vem dos pais como correto, porque não há ainda outros referenciais. Na adolescência, ao entrar em contato com pontos de vista diferentes, o adolescente inevitavelmente passa a comparar os novos conceitos adquiridos com aqueles aprendidos dos pais.

Com o sexo não é diferente. Se você, na frente dos filhos, atribui a uma artista na TV um adjetivo que remeta à sexualidade, eles estão aprendendo um referencial sobre sexo. Frases como “Esse aí não sei não… deve ser gay.” ou “Ninguém mexe com minha filha. Pra namorar com ela tem que passar no meu teste primeiro.” já estão fornecendo referenciais sobre sexo para os filhos que influenciarão fortemente o modo como esses filhos vão vivenciar a própria sexualidade no futuro (de forma miseravelmente ruim no caso dessas frases).

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Nesse sentido, vale a pena avaliar desde o início da vida da criança se vocês estão transmitindo a ela algum tipo de preconceito. Isso trará sofrimento a ela no futuro. Pode ser o mesmo sofrimento que você, mãe ou pai, vivencia hoje. Daí a importância de cuidar primeiro de si para poder oferecer aos filhos o melhor suporte possível.

Ainda sobre como tratar das questões sobre sexo (de onde vêm os bebês, pra que serve o pipi, por que os pais dormem na mesma cama etc.), uma última dica é evitar fantasias ditas como verdades. O problema das fantasias é que elas serão confrontadas com a realidade em algum momento. Um dia a criança descobre que não foi uma cegonha que a deu para os pais. Esse tipo de descoberta faz quebrar-se a confiança que a criança sempre depositou nos pais. O melhor é contar a verdade, apenas preocupando-se em adaptá-la para a linguagem infantil. Inspirem-se em exemplos equivalentes vindos de outros campos da vida. Por exemplo, se uma criança pergunta aos pais por que eles vão trabalhar, obviamente não se deve responder nada sobre as contas, os impostos e nem tampouco citar Karl Marx. Basta dizer que o trabalho é importante para que a família possa fazer tudo o que gosta quando os pais não estão trabalhando, ou dizer que precisam trabalhar para que a família possa continuar contando com o quintal bonito, para que a criança continue tendo roupas confortáveis, para que possam visitar a tia Cotinha em Minas e assim por diante.

No caso do sexo é a mesma coisa. Não é um bicho de sete cabeças. Mas, para isso, é importante desfazer-se dos tabus, abrir mão do olhar moralista e pacaminoso que se tem sobre o sexo. Sexo é vida, saúde, prazer e bem-estar. Quando os pais conseguem se concentrar nesses aspectos bacanas da sexualidade no cotidiano e especificamente nas conversas com os filhos, aqueles temas mais preocupantes relacionados à saúde e ao bem-estar acabam aparecendo espontaneamente na interação. Uma criança que tenha suas questões sobre sexo acolhidas com carinho e sem medo pelos pais confiará neles para compartilhar as angústias que experimentarão na adolescência e no início da idade adulta.

A hora é agora. E aí, pra você… o que é virgem?

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